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26 DE MARÇO DE 2024

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de saúde; a guarda de animais domésticos sem qualquer abrigo; o transporte de animais em violação das

normas legalmente aplicáveis ou o abate de animais fora do matadouro (artigos R215-1 a R215-10).

O Código Penal italiano, em vigor por via do Regio Decreto 19 ottobre 1930, n.º 1398, desde de 2013, que

introduziu um Título IX-Bis denominado «Dos delitos contra o sentimento pelos animais» (Dei delitti contro il

sentimento per gli animali), punindo-se: o abate por crueldade ou sem necessidade de animais com pena de

prisão de quatro meses a dois anos (cfr. artigo 544-bis); os maus-tratos, a tortura e a sujeição a trabalhos

esforçados ou insuportáveis a animais com pena de prisão de três a dezoito meses e pena de multa de 3000 €

a 15 000 € (cfr. artigo 544-ter); os espetáculos e as manifestações com sevícias ou tortura para o animal com

pena de prisão de quatro meses a dois anos e com pena de multa de 3000 € a 15 000 € (cfr. artigo 544-quater);

a proibição de realização de combates e de competições não autorizadas que possam colocar em perigo a

integridade física de animais com pena de prisão de um a três anos e pena de multa de 50 000 € a 160 000 €

podendo ser agravada em 1/3 em circunstâncias excecionais (cfr. artigo 544-quinquies).

No Reino Unido desde 1911 que vigora o Protection of Animals Act, que previa já uma pena máxima de 6

meses de trabalhos forçados com uma multa e que a crueldade contra animais é, atualmente crime, tendo as

penas sido agravadas para 5 anos desde 29 de junho de 2021, através do Animal Welfare (Sentencing and

Recognition of Sentience) Draft Bill.

Os avanços na proteção dos animais verificam-se também para além das fronteiras da União Europeia. Nos

Estados Unidos da América, apesar de todos os estados terem leis que criminalizam a crueldade animal, com o

«Preventing Animal Cruelty and Torture Act (PACT)» prevê-se que atos de crueldade contra «mamíferos não

humanos, pássaros, répteis ou anfíbios vivos» se subsumem a um crime federal.

Prevenir e punir tal crueldade foi considerado um imperativo de bem-estar animal e de saúde pública. Cada

vez mais é reconhecido que a crueldade animal é um crime grave e um precursor para outros crimes violentos.

Desde 2016, que o FBI alterou a categorização dos crimes contra animais, que passaram a ser tipificados como

«crimes contra a sociedade», a par dos crimes violentos contra pessoas, como os homicídios, acreditando que

dessa forma será mais fácil identificar os fatores de risco e atuar na prevenção da violência.

Em Portugal, apesar do estatuto jurídico e das inúmeras denúncias de maus-tratos e abandono que são

feitas, no que respeita à proteção penal dos animais, o nosso Código Penal não acompanhou ainda a evolução

feita no direito penal de outros países e o repto da sociedade civil que clama por esta alteração legislativa. Pior

ainda, assistimos, incompreensivelmente, a uma possibilidade de retrocesso.

Desde os tribunais de primeira instância aos tribunais superiores que existe o reconhecimento de que

independentemente da finalidade com que os animais são detidos, estes devem ser sujeitos a uma existência

digna10.

Pode ler-se no Acórdão da Relação do Porto, de 19 de fevereiro de 2015, referente ao Processo

1813/12.6TBPNF.P1 que «constitui um dado civilizacional adquirido nas sociedade europeias modernas o

respeito pelos direitos dos animais. A aceitação de que os animais são seres vivos carecidos de atenção,

cuidados e proteção do homem, e não coisas de que o homem possa dispor a seu bel-prazer, designadamente

sujeitando-os a maus tratos ou a atos cruéis, tem implícito o reconhecimento das vantagens da relação do

homem com os animais de companhia, tanto para o homem como para os animais, e subjacente a necessidade

de um mínimo de tutela jurídica dessa relação, de que são exemplo a punição criminal dos maus tratos a animais

e controle administrativo das condições em que esses animais são detidos11.»

Desta forma, entendemos que o processo de criminalização dos maus-tratos a animais, e agora não apenas

aos de companhia, dispõe de precisão e densidade suficientes para que potenciais autores do ilícito-típico

possam claramente compreender e antecipar o comportamento que se pretende punir, tornando-o, assim,

compatível com a exigência de lei certa, decorrente do n.º 1 do artigo 29.º da Constituição.

É nossa convicção que atualmente já existe no nosso país amplo consenso em torno das soluções jurídico-

criminais adotadas por outros ordenamentos jurídicos afins, como é o caso do país vizinho.

O exposto torna premente a necessidade de alteração das premissas legais no âmbito da tutela penal dos

animais, ditando a eliminação do atual critério funcionalista e subjetivo, dificultador da interpretação e da

aplicação das normas penais e até do fundamento constitucional destas, conforme tem sido alertado por ilustres

penalistas como a Prof.ª Doutora Teresa Quintela de Brito, já ouvida sobre esse assunto em sede de Comissão

10 O direito dos animais – Jornal Universitário do Porto (juponline.pt) 11 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (dgsi.pt)