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II SÉRIE-A — NÚMERO 106

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excecionalmente atípico, face aos anos anteriores.

Por sua vez, no que respeita à percentagem de casos de violação que são efetivamente denunciados às

autoridades, inexistem quaisquer dados oficiais para Portugal. Todavia, a nível europeu, a mais recente fonte

de inquérito realizado em 2014 revela que 86 % dos casos de violação não são denunciados4.

Como refere, a APAV, porque as situações de violação incidem sobre um núcleo tão delicado da intimidade

pessoal, o receio de uma descredibilização pelo sistema judicial, pelas estruturas de apoio e até pela própria

família, bem como a desvalorização social da violência sexual, frequentemente relacionada com a

culpabilização da própria vítima ou desresponsabilização parcial da pessoa agressora ou, ainda, pelo facto de

o crime ser praticado, na maioria das situações, no seio de uma relação de intimidade ou proximidade familiar

justificam a renitência da vítima em denunciar um crime sexual5.

Por outro lado, conforme demonstrado no estudo divulgado pelo Eurobarómetro da Comissão Europeia em

2016, consolidou-se que cerca de 29 % dos portugueses, quando inquiridos sobre os fatores que propiciam a

prática de tais crimes, considerou que tais condutas, por diversas vezes, poderiam surgir com maior

probabilidade quando as vítimas se encontram sob o efeito de álcool ou substâncias psicotrópicas e, ou,

quando adotam um estilo provocador ou se encontram desacompanhadas nas saídas noturnas6.

Assim, não obstante os esforços que vêm sendo empenhados no que tange à igualdade entre homens e

mulheres, sempre se dirão persistentes as necessidades de evolução em tais campos, considerando as ainda

claras deficiências do sistema.

Urge, por todo o exposto, conferir uma integral relevância e estruturação aos mecanismos de proteção das

vítimas do crime de violação e, bem assim, de dissuasão da respetiva prática.

Assim, assumindo-se como meios de garantia da aplicação efetiva da lei a promoção do aumento das

denúncias do crime de violação, propõe o Grupo Parlamentar do Chega alteração à natureza do crime de

violação previsto no artigo 164.º do Código Penal, assumindo antes uma natureza pública, não carecendo,

portanto, de queixa para a prossecução do procedimento.

De facto, ilustra a APAV, a configuração de uma natureza pública ao crime de violação consubstanciaria,

em larga escala, uma relevante diminuição das cifras negras associadas ao tipo incriminador em escrutínio,

porquanto a respetiva participação enquanto necessário impulso processual não dependeria apenas da vítima.

De igual modo, sublinhe-se, tal conduziria a um maior número de casos reportados aos órgãos de polícia

criminal, o que, por sua vez, importaria um reforço aos meios de prevenção e sensibilização, reduzindo a

ocorrência futura de muitos crimes desta natureza.

De facto, ademais do reforço ao nível da prevenção geral, também a alteração da natureza do crime de

violação acarretaria consequências em sede de prevenção especial, uma vez que, não ficando exclusivamente

nas mãos da vítima o impulso processual necessário à investigação e eventual acusação e condenação da

pessoa agressora, mais facilmente se alcançaria junto desta a almejada dissuasão da prática de novos

crimes7.

Acresce que a impunidade de diversos agentes que praticam o tipo incriminador alvo de escrutínio, bem

como a inexistência de qualquer proteção e, ou, compensação à vítima de tal conduta, ademais de esvaziar

em absoluto a intenção do legislador no que respeita à proteção do bem jurídico liberdade e autodeterminação

sexual determinam, de facto, a necessidade de atribuir ao crime de violação uma natureza pública e não já,

como atualmente vigora, dependente de queixa da vítima, muitas vezes subordinada aos efeitos psicológicos

de tais condutas contra si praticadas.

A atribuição de natureza pública ao crime de violação pretende dar cumprimento ao disposto no artigo 27.º

da Convenção de Istambul8, ratificada pelo Estado português, em vigor desde 1 de agosto de 2014, que refere

que «As Partes deverão adotar as medidas que se revelem necessárias para encorajar qualquer pessoa que

testemunhe a prática de atos de violência abrangidos pelo âmbito de aplicação da presente Convenção, ou

que tenha motivos razoáveis para crer que tal ato possa ser praticado ou que seja de prever a prática de

novos atos de violência, a comunicá-los às organizações ou autoridades competentes».

Propõe, por todo o exposto, o Grupo Parlamentar do Chega, uma alteração ao artigo 164.º do Código

4 fra-2014-vaw-survey-main-results-apr14_en.pdf (europa.eu). 5 posicao_APAV_natureza_crime_violacao_mar_2021.pdf. 6 ebs_465_brief_en_equality.docx (globalwps.org). 7 posicao_APAV_natureza_crime_violacao_mar_2021.pdf. 8 Convenção de Istambul entra em vigor dia 1 de agosto de 2014 – CIG.