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17 DE JANEIRO DE 2025

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PROJETO DE LEI N.º 445/XVI/1.ª

PROCEDE À REGULAMENTAÇÃO DO ESTATUTO DO APÁTRIDA (ALTERA A LEI N.º 37/81, DE 3 DE

OUTUBRO, QUE APROVA A LEI DA NACIONALIDADE, O DECRETO-LEI N.º 237-A/2006, DE 14 DE

DEZEMBRO, QUE APROVA O REGULAMENTO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA, E A LEI N.º

23/2007, DE 4 DE JULHO, QUE APROVA O REGIME JURÍDICO DE ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E

AFASTAMENTO DE ESTRANGEIROS DO TERRITÓRIO NACIONAL)

Exposição de motivos

A justiça social, a solidariedade internacional e defesa dos direitos humanos são princípios basilares de um

Estado de direito democrático e encontram respaldo na Constituição da República Portuguesa. Uma das

dimensões em que tais princípios operam é na necessidade de regulamentação do estatuto de apátrida em

Portugal, no seguimento, aliás, de um compromisso internacional assumido pelo Estado português. Esta

iniciativa visa dar resposta a uma problemática que afeta milhões de pessoas em todo o mundo e que tem

implicações graves na garantia dos direitos fundamentais e da dignidade humana.

A apatridia, definida pela Convenção de 1954 sobre o Estatuto dos Apátridas, da ONU, como a condição da

pessoa que não é reconhecida como nacional de nenhum Estado, foi introduzida na legislação portuguesa

através da Lei n.º 41/2023, de 10 de agosto, que veio complementar o ordenamento jurídico nacional. O artigo

15.º da Constituição da República Portuguesa já consagra um regime de equiparação entre os direitos dos

apátridas e dos estrangeiros, garantindo-lhes direitos fundamentais como o direito à proteção da integridade

física, à saúde e à educação. No entanto, a legislação portuguesa ainda carece de um quadro regulatório

específico para a implementação eficaz do estatuto de apátrida, incluindo um procedimento claro para a sua

determinação e a sua integração nos sistemas de proteção social e jurídica.

A Lei n.º 41/2023 previa que, no prazo de 90 dias após a sua entrada em vigor, a Assembleia da República

deveria aprovar um Estatuto do Apátrida e que o Governo deveria estabelecer, através de portaria, um modelo

de título de viagem para os apátridas. No entanto, devido à dissolução da Assembleia da República e à demissão

do Governo, com o Decreto do Presidente da República n.º 112-A/2023 e o Decreto n.º 12-A/2024, os prazos

legais previstos para a implementação da legislação foram ultrapassados. Esta situação deixa em aberto um

conjunto de questões fundamentais e impede a criação de um sistema eficaz de reconhecimento e proteção dos

direitos dos apátridas.

A apatridia é uma questão reconhecida a nível internacional, sendo uma violação grave dos direitos humanos.

Em 2014, a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) lançou a campanha #IBelong, com o

objetivo de erradicar a apatridia até 2024. Esta campanha, à qual Portugal se associou, estabelece um conjunto

de ações cruciais para resolver o problema, incluindo a concessão de estatuto de proteção a migrantes

apátridas, a melhoria da documentação de nacionalidade, e a adesão à Convenção de 1954 sobre o Estatuto

dos Apátridas. No final de 2023, o ACNUR estimou que 4,4 milhões de pessoas eram apátridas, embora este

número seja consideravelmente maior, uma vez que muitos apátridas não são contabilizados nas estatísticas

nacionais. A apatridia afeta principalmente mulheres e minorias étnicas, que muitas vezes são despojadas do

direito à nacionalidade devido a normas discriminatórias nas legislações nacionais.

Portugal, ao assinar a Convenção de 1954 e ao participar no Fórum Global sobre Refugiados em 2019,

assumiu o compromisso de implementar as ações da campanha #IBelong, incluindo a criação de um

procedimento para a determinação do estatuto de apátrida. Contudo, até o momento, o País não concretizou as

medidas necessárias para estabelecer este procedimento de forma clara e eficiente, deixando milhões de

pessoas em situação de vulnerabilidade e exclusão social.

A falta de um procedimento claro para a determinação do estatuto de apátrida em Portugal continua a deixar

muitas pessoas em situação de vulnerabilidade, impedindo-as de aceder a direitos essenciais, como a

nacionalidade, a educação, a saúde e o direito ao trabalho.

O Bloco de Esquerda propõe, assim, a regulamentação há muito em falta deste procedimento, garantindo

que todos os apátridas sejam identificados, que o seu estatuto seja formalmente reconhecido e que possam

aceder a um conjunto de direitos fundamentais, em consonância com as recomendações internacionais.

Além disso, a criação de um modelo de título de viagem, que permita aos apátridas a mobilidade e o acesso

a serviços consulares, também deve ser uma prioridade, para que essas pessoas possam viver com a dignidade