O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

16 DE MAIO DE 1991

105

D — O caso concreto do requerimento apresentado

O requerimento foi subscrito por 50 deputados, como o determina o n.° 2 do artigo 253.° do Regimento (corresponde a um quinto dos deputados em efectividade de funções), explicita os seus fundamentos e define o seu objecto — n.° 2 do artigo 252.° do Regimento.

Formalmente, o requerimento em análise preencheu os requisitos regimentais e invocou as disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, ainda que as não tivesse referido expressamente. Mas elas são facilmente intuídas. Trata-se do já citado n.° 4 do artigo 181.° da Constituição da República Portuguesa e dos n.os 2 e 3 do artigo 253.° do Regimento.

Em razão das dúvidas que apontamos e das questões que o exercício daquele direito levanta, analisemos os dois elementos essenciais e necessários do requerimento para a constituição da correspondente comissão:

o) Os fundamentos; b) O objecto.

a) Quanto aos fundamentos. — Esta componente do requerimento desdobra-se por três alíneas:

A primeira aduz razões políticas e alega factos que respeitam ao processo de desenvolvimento dos trabalhos da comissão de inquérito que está em funções, criticando comportamentos que nela refere. Sem cuidar da bondade daquelas razões nem da justeza destes comportamentos, entendemos que o que vem alegado não constitui fundamento para o exercício do direito pretendido. As comissões de inquérito não podem ter como fundamento, segundo pensamos, a apreciação e valoração das decisões e comportamentos que se verificam durante a actividade de outra comissão de inquérito;

As outras duas alíneas referem e anunciam «novos factos que são relevantes para a apreciação política das matérias e das responsabilidades a apurar neste inquérito». Estas duas alíneas poderiam ter interesse como fundamento para a constituição «de uma nova comissão eventual de inquérito a actos administrativos na área do Ministério da Saúde». Porém, a alegação de novos factos, só por si, não justifica a criação de uma nova comissão se eles podem ser subsumi-dos no objecto da comissão de inquérito já existente, visto que ele se define pela apreciação dos actos administrativos «na área do Ministério da Saúde», como expressamente refere o artigo 1.° do regimento daquela comissão.

b) Quanto ao objecto. — Este elemento, fundamental para a criação de uma comissão de inquérito, suscita-nos, no requerimento em análise, algumas dúvidas e fortes reservas.

Pensamos que nele se confunde o conceito de objecto da comissão com as diligências a realizar para o seu esclarecimento e apreciação.

O artigo 252.° do Regimento refere que «os inquéritos parlamentares têm por objecto o cumprimento da Constituição e das leis e a apreciação dos actos do Governo e da Administração».

Assim sendo, os meios a utilizar e as diligências a efectuar para se apreciar o referido objecto não fazem parte dele, antes são vias a prosseguir depois de o mesmo fixado.

Deste modo não se compreende, salvo melhor opinião, que do objecto enunciado no requerimento faça parte o desejo de «apreciar toda a documentação já recebida ou requerida pela comissão eventual de inquérito a actos administrativos na área do Ministério da Saúde».

Além disso, é de supor, muito legitimamente, que esta comissão os tenha apreciado ou os venha a apreciar, pelo que, sendo a sua actividade instrumental do Plenário, seria insólito e estranho que este viesse a confrontar-se com possíveis apreciações contraditórias.

Pensamos que não é aceitável propiciar tal situação por poder conduzir a juízos menos ajustados à seriedade e dignidade do trabalho das comissões.

Aceitar-se como objecto o que vem apontado seria, desde logo, reconhecer-se que a comissão eventual de inquérito, detentora da documentação em causa, a não apreciou como deve e lhe compete. Além disso, se esta componente do citado objecto fosse entendida como razão para justificar a constituição de uma nova comissão, cairíamos no erro grave de repetir, inutilmente, comportamentos e deliberação que já foram legitimamente tomados e apreciados. Uma segunda apreciação seria uma censura implícita ao trabalho da primeira comissão.

Sabemos que hoje os parlamentos são muito mais um conjunto de grupos parlamentares do que de deputados.

São os grupos parlamentares que designam os deputados que integram as comissões. Por tal motivo, para a nova comissão poderão ser designados os mesmos que integram a primeira. Assim sendo, não compreendemos como seria possível conseguir na segunda o que na primeira se não obteve.

Por outro lado, e partindo do conceito definido na disposição legal citada, não se concebe que a inquirição ou audição de pessoas possa fazer parte do seu objecto.

Se assim fosse, estaríamos confrontados com uma gravíssima consequência que seria a do «abuso do poder»: realizar um inquérito não para prosseguir o objecto regimentalmente definido (artigo 252.° do Regimento) e legalmente fixado no artigo 1.° da Lei n.° 43/77, mas para ouvir pessoas.

Seria uma grave desconformidade entre o que se pretende e o que legalmente está fixado. Por isso, pensamos que não será de aceitar o que vem referido no n.° 2 da parte III do requerimento em causa por não ser passível de integrar o conceito de objecto que a lei e o Regimento definem.

Um outro aspecto, que julgamos menos consentâneo com o conceito de objecto é o que vem referido no n.° 3 daquela parte III. Na verdade, em obediência ao princípio da «separação de poderes», entendemos que a sua aceitação poderia constituir grave ingerência na esfera do poder judicial.

A apreciação dos «dados disponíveis na acusação deduzida pelo Ministério Público contra o engenheiro Costa Freire e outros» deve ser da competência exclusiva dos tribunais, sob risco de grave ingerência na esfera de competência de outro poder soberano.

E essa ingerência poderia ganhar uma maior acuidade quando é certo que se trata de processo em curso. Esta seria uma razão acrescida para não aceitar esta pretensão como integrando o conceito do objecto da nova comissão.

Por último, e com referência ao n.° 4 daquela citada parte jji do requerimento em causa, somos a concluir