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25 DE JUNHO DE 1993

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A escalada para a direcção

Mas, até agora, o que tem sido mais difícil de explicar, e que de facto não tem explicação, é a pistola que o nosso agente transporta e leva para as reuniões da direcção da AEFDL, «mas só quando ele não tem tempo de ir a casa e vem directamente do trabalho», explicou Rui Freitas. É que, segundo Ladeiro Monteiro, director dos SIS, António Mesquita não tem de andar sempre armado, só em casos especiais. Embora tenha direito ao uso e porte de arma.

António Mesquita, que para que conste não tem nome de código, tem perto de 30 anos e, (irando os dois anos que já chumbou, tem sido sempre um estudante como qualquer outro matriculado à noite na Faculdade de Direito. Amigos não tem muitos, embora se conte entre eles Gil Garcia, que é daqueles que não perdem uma manifestação ou invasão da Reitoria. Mesquita entrou para a universidade em 1988, mas só há ués anos é que decidiu aderir à lista O, que domina a direcção da AEFDL bá aproximadamente cinco anos. E assim, amo toda a gente faz, o dirigente associativo chegou um belo dia a um reunião e pediu para entrar na dita lista Nem foi preciso mais nada, já eslava lá dentro e para ficar. A partir daí as coisas não pararam de correr bem, e só o tempo disponível é que passou a ser menos. A participação na AE, durante os primeiros tempos, não foi muita, até porque, segundo fontes próximas de António Mesquita, «ele foi sempre uma pessoa apagada e nunca se evidenciou». Mas mesmo assim esteve encarregue do departamento dos estudantes estrangeiros. No qual não fez absolutamente nada, e onde ficou pouco tempo. Até que, em Dezembro passado, a propósito da remodelação na direcção, mostrou interesse pela tesouraria

E, assim, subiu de cargo e passou a vice-presidente responsável pela área financeira, que lhe deu a curto prazo a garantia de que aquela AE não podia passar sem ele. É que, embora presentemente o presidente da direcção seja outro, o sentimento em relação a António Mesquita é o mesmo. Pois são todos da opinião de que é muito difícil arranjar alguém para o substituir naquela área, que ele manobra tão bem e onde mostra ser de absoluta confiança. Que é quanto basta. Pois, segundo Rui Freitas, o lacto de ter como vice--presidente alguém dos SIS não o incomoda muito, porque, «vendo bem, como é que consigo arranjar outra pessoa na qual eu tenha confiança para lhe entregar as contas? Pelo menos, com o António eu ponha as minhas mãos no fogo, e isso é que me interessa.»

O submundo das propinas

Mal chegou à AE, o nosso agente secreto não deu hipóteses a que fosse levantado qualquer tipo de suspeitas em relação a ele. E cortou logo o mal pela raiz. Primeiro tratou de explicar que trabalhava, e por isso não tinha muito tempo livre para se dedicar a 100 % à Associação. Ninguém estranhou. Depois resolveu dizer que era funcionário do Ministério da Administração Interna, o que até é verdade. Nada de mais. E, a seguir, como estava a entrar em força o movimento antipropinas e como já mais de uma pessoa tinha visto a pistola do Mesquita, que, não se sabe bem porquê, não se preocupava em escondê-la havia necessidade de arranjar uma boa desculpa, ou então as desconfianças voltavam. Vai daí, toca de dizer a alguns que trabalhava para a «DINFO e para as brigadas antiterroristas». Orà o amigo Mesquita passou a herói e os estudantes não tinham mais nada a temer. Pois terroristas ali não havia e, quanto à DINFO, dedica-se à espionagem militar. Estava assim explicada a pistola e qualquer outra coisa que fosse de estranhar.

Súbitos interesses

E, assim, embora o técnico-adjunto operacional dos SIS seja membro da direcção da AEFDL há três anos, só este ano é que começou a aparecer mais nas reuniões e a querer saber tudo sobre algumas, bem específicas, actividades associativas. Participar activamente nalgum reunião nunca panlcinou, sempre foi um modelo de discrição, com as antenas todas viradas para a contestação às propinas. De tal maneira que até fez questão em ir para o movimento antipropinas, no qual estava sempre ao corrente dos acontecimentos e perfeitamente ittformado.

No entanto, sempre que era preciso fazer barulho, do género pintar o gabinete do reitor, insultar o Ministro, o Primeiro-Ministro, o Govemo em geral e a Reitoria em particular, ou até dar uma opinião sobre a próxima manifestação ou sobre a matéria das reuniões, o Mesquita não abria a boca. E o mesmo se passava no que dizia respeito às guerras internas da direcção. Quando há poucas semanas a lista O se partiu ao meio e estoirou uma confusão a respeito das contas o agente Mesquita pôs-se a milhas. Disse que ia para Coimbra «fazer um trabalho», mas veio a saber--se que estava em casa e só voltou quando a tempestade amainou.

Secretos mas não tanto

Apesar de tudo, e de os SIS serem supostamente secretos, pelo menos os seus agentes —cuja profissão é fazer com que ninguém descubra qual é —, se os estudantes da AE da qual António Manuel Figueiredo Mesquita faz parte quisessem mesmo saber onde é que ele trabalhava bastava telefonar. É que nos SIS não há qualquer controlo, basta perguntar se o Sr. Mesquita está e o efeito é mesmo que telefonar para um escritório qualquer se está, chamam, se não, dizem quando chega. Nem mais.

No entanto, segundo Ladeiro Monteiro, António Mesquita é um agente cheio de qualidades, é «muito bom, muito inteligente e com um grande espírito de liderança». Quanto à sua função, «trabalha na área do terrorismo». Mais especificamente, anda na rua, observa e recolhe informações. O que não deixa de ser suspeito, nem que seja por ser certo que os SIS já entraram em acção durante as manifestações contra a PGA e mais recentemente contra as propinas, fora as manifestações de pescadores e agricultores —é que o objectivo destes Serviços era identificar os que mais perturbam e os principais agitadores. Pois a função de um técnico dos SIS é, conforme dita a lei, «produzir informações destinadas a garantir a segurança interna e necessária a prevenir a sabotagem, o terrorismo, a espionagem e a prática de actos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir o Estado de direito constitucionalmente estabelecido». Ora, ao que parece, alguns deste indícios já foram detectados nos estudantes, que não fazem mais nada se não berrar, mostrar o rabo ao ministro e gritar «não pagamos», mas que nem se importam se alguém tirar informações sobre eles bem nas suas barbas.

Inês Teotónio Pereira.

(In O InJr/mdtnií. de 18 de Junho de 1993.)

Serviços secretos têm vigiado sindicatos e estudantes •

Os Serviços de mformações de Segurança (SIS) têm estado a proceder a operações de vigilância sobre os movimentos sociais portugueses e a enviar relatórios sobre a matéria para o Govemo — soube o Expresso de fonte oficiosa

Entre os sectores que os SIS têm estado a observar, contam-se os que estiveram na origem da actual vaga de greves (particularmente os sindicatos dos transportes), assim como os movimentos estudantis organizados com base nos protestos contra a PGA. Também a comunidade