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II SÉRIE-B — NÚMERO 14

2 — O ensino deve contribuir para superação de desigualdades económicas, sociais e culturais, habilitar os cidadãos a participar democraticamente numa sociedade livre e promover a compreensão mútua, a

tolerância e o espírito de solidariedade.

3 — Na realização da política de ensino, incumbe ao Estado:

a) Assegurar o ensino básico, universal, obrigatório e gratuito;

b) Criar um sistema público de educação pré--escolar;

c) Garantir a educação permanente e eliminar o analfabetismo;

d) Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística;

e) Estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino;

f) Inserir as escolas nas comunidades que servem e estabelecer a interligação do ensino e das actividades económicas, sociais e culturais;

g) Promover e apoiar o ensino especial para deficientes;

h) Assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da língua portuguesa e o acesso à cultura portuguesa.

4 — É proibido, nos termos da lei, o trabalho de menores em idade escolar.

4.1 — A Lei n.° 20/92 face à Lei n." 33/87:

Não se encontra, na documentação compulsada, qualquer referência à participação das AÃEE na elaboração da Lei n.° 20/92.

Ora, a Lei n.° 20/92 claramente se inscreve, pela sua natureza e conteúdo, no tipo de normas em que aquela participação é, nos termos da Lei n.° 33/87, indiscutivelmente exigível.

A ser assim, a Lei n.° 20/92 padece, atenta a Lei n.° 33/87, de manifesta ilegalidade formal.

4.2 —A Lei n.° 20/92 face à Lei n.° 108/88:

A Lei n.° 108/88 estabelece os termos em que a autonomia das universidades é definida.

Aí se consagra não só que ao Estado cabe garantir às universidades as verbas necessárias ao seu funcionamento como se lhes confere a capacidade de gerarem receitas próprias.

A Lei n.° 20/92 é uma iniciativa do Estado, que não conflitua, em st, parece, com a consagrada autonomia das universidades.

Com efeito, a capacidade de obter receitas próprias não se configura como uma espécie de competência exclusiva das universidades.

Nada exclui, portanto, que o poder tutelar concorra no mesmo sentido.

Por outro lado, não é claro que o Estado, na sua responsabilidade de garantir as verbas necessárias ao funcionamento das instituições universitárias, possa socorrer-se apenas do seu orçamento.

Nessa medida, não se vislumbra que a Lei n.° 20/92 não seja inteiramente conforme à Lei n.° 108/88.

Todavia, quando o n.° 3 do seu artigo 1.° determina prioridades na afectação das verbas provenientes do

pagamento das propinas, nomeadamente cometendo-as a uma política de acção social, parece colidir com o disposto quer no n.° 2 do artigo 8." quer na alínea g) do n.° 1 do

artigo 20,°, ambos da Lei da At/íonomia Universitária..

4.3 — A Lei n.° 20/92 face à Constituição da República Portuguesa:

A constitucionalidade desta lei foi, seguramente, o aspecto mais controverso e delicado da sua apreciação.

São múltiplos os preceitos constitucionais, como se viu, que, directa ou indirectamente, concorrem para a análise, ponderação e definição dos moldes em que o Estado está obrigado a garantir a todos os cidadãos o acesso a todos os graus de ensino.

Reconhece-se a diversidade de posições sobre a matéria e não se ignora que o próprio Tribunal Constitucional veio já, no essencial, declarar a Lei n.° 20/92 conforme à CRP.

Não se desconhecem também as opiniões publicamente assumidas, algumas vezes não sem paixão, pelas mais diversas personalidades e entidades, quantas de incontestado gabarito técnico, político e intelectual.

5 — Constitucionalidade da Lei n.° 20/92, 14 de Agosto:

a) No domínio dos princípios:

Já vimos que Portugal é uma República constitucionalmente empenhada na construção de uma sociedade.livre e que se constitui no dever de respeitar e garantir a efectivação dos direitos e liberdades fundamentais, sem beliscar os princípios a que se subordina.

E que lhe incumbe promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo, bem como a concretização dos direitos económicos, sociais e culturais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais.

Serão a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais factores da qualidade de vida e do bem-estar do povo, viabilizáveis sem a maior qualificação possível dos cidadãos?

Aceite-se, ou não, evidente a resposta negativa à questão formulada, resulta inequívoco que o Estado, face aos princípios que são seu próprio fundamento no quadro constitucional vigente, não pode eximir-se, sobretudo se deliberadamente, a proporcionar o ensino, sem limite de grau, a todo e qualquer cidadão que o pretenda e para ele se mostre capaz.

Colide, neste domínio, a Lei n.° 20/92 com a CRP?

Nega a lei em causa qualquer dos princípios a que o Estado se encontra constitucionalmente vinculado?

De forma directa, parece bem que não.

b) No domínio dos direitos: b.\) O seu exercício:

Acontecerá que a Lei n.° 20/92, ao estabelecer o pagamento de propinas e taxas de inscrição, entra em colisão com o direito à liberdade, simplesmente (artigo 27.°, n.° 1, da CRP), ou mesmo com a liberdade de aprender e ensinar (artigo 43.°, n.° 1, da CRP)?

Na medida em que estão previstos mecanismos de isenção para os economicamente menos dotados, ainda aqui se considera que a Constituição não enjeita a Lei das Propinas.

E que dizer sobre a sua conformidade com a alínea a) do n.° 1 do artigo 70° da CRP, que estabelece especial protecção aos jovens na efectivação dos seus direitos, em particular no âmbito do ensino?

Ao condicionar a isenção de pagamento de propinas ao «rendimento familiar», em especial no seu artigo 2.°, estará a Lei n.° 20/92 em sintonia com a Constituição?

Não estaremos perante mais uma tributação do rendimento?