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5 DE JUNHO DE 2019

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Quando confrontados com esta decisão, os principais intervenientes no processo de preparação do

Decreto-Lei n.º 240/2004 argumentaram que os próprios mecanismos de mercado são um desincentivo à

declaração de disponibilidades acima das reais e que portanto não era necessário incluir estes testes no

diploma, como argumenta Ricardo Ferreira, assessor do Ministério da Economia de então:

«Foi considerado que os incentivos que o mercado dava para os agentes estarem disponíveis eram mais

do que suficientes. Se eu disser que estou disponível, o Valorágua pode dizer-me que vou ter de produzir; se

eu não produzir, é uma chatice. Portanto, os produtores não tinham incentivo nenhum em andar a falsear

declarações, porque o problema era exatamente esse; era dizer que ‘os produtores vão falsear’»

(audição Ricardo Ferreira)

Também João Manso Neto, que conduziu o processo do lado da EDP não tem dúvidas que um mecanismo

de verificação de disponibilidade era totalmente desnecessário, já que o mercado fazia esse papel:

«A EDP não podia declarar em mercado o que não estava disponível. Porquê? Porque se declarasse em

mercado e depois fosse chamada incorria em penalidades. Aliás, se formos ver a história, é claríssimo que a

EDP, em muitas circunstâncias, não esteve disponível, declarou a indisponibilidade e por isso pagou.»

(audição João Manso Neto)

Dispondo de um quase monopólio da produção hídrica, a margem de manobra da EDP na gestão da oferta

é muito grande. No seu depoimento, o ex-Secretário de Estado Jorge Seguro Sanches, não reconhece a

impossibilidade de manipulação alegada por João Manso Neto.

«Está provado que as centrais hídricas do Douro estavam em obras e aumentavam a disponibilidade e que

a central hidroelétrica de Setúbal, tinha peças desmanteladas e aumentava aquilo que declarava na

disponibilidade. (…) Não havia nem forma contratual nem forma legal de haver a sua consideração».

Jorge Seguro Sanches acrescenta como argumento jurídico que:

«No momento em que os CAE cessaram, o direito dos seus titulares limitava-se à disponibilidade

contratada. Não obstante estar previsto nos CAE um mecanismo para pagar disponibilidade acrescida e

penalizar a disponibilidade inferior, a verdade é que esses mecanismos para funcionarem careciam da

verificação de um facto que se afastava da normalidade contratada.

Tal significa que as duas situações anormais – disponibilidade superior ou inferior – não podem ser

consideradas no cálculo de uma indemnização [o CMEC], pois não existe qualquer direito constituído.

Dito por outras palavras: se o Estado tivesse optado por pagar de imediato a indemnização em vez de criar

os CMEC, o cálculo do montante indemnizatório teria, necessariamente, que cingir-se à disponibilidade

contratada e garantida».

(audição Jorge Seguro Sanches)

Pode concluir-se que:

1. Os governos envolvidos no processo de preparação e aprovação do Decreto-Lei n.º 240/2004

consideraram que a participação em mercado era suficiente para que as centrais declarassem a sua

disponibilidade real, descartando assim os testes de disponibilidade;

2. Não foram considerados os vários alertas da ERSE e da REN sobre a abolição deste mecanismo e

sobre os possíveis impactos no valor dos CMEC a pagar aos produtores, quantificados mais tarde pela ERSE

em 285 M€.

3. Não existe suporte legal para a remuneração de disponibilidade superior à contratada, tal como define a

ERSE no cálculo do ajustamento final homologado pelo governo em 2018.