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19 DE ABRIL DE 2024

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Assembleia da República num órgão conivente com um processo profundamente lesivo dos interesses

nacionais.

Uma ordem de questões prende-se com o valor da venda da empresa. O TdC demonstrou que a venda se realizou por 1127,1 milhões, quando o anúncio público foi de 3,08 mil milhões. E o Tribunal de Contas ainda

denuncia que foram oferecidos à Vinci os dividendos de 2012 no valor de 71,4 milhões de euros, quando em

2012 a empresa era pública. Há aqui três questões a apurar: a responsabilidade política de quem mentiu ao

povo português, a responsabilidade financeira da Vinci, que pode ter recebido um desconto ilegal, e a

responsabilidade criminal de quem ofereceu esse desconto.

Uma segunda ordem de questões prende-se com a avaliação prévia que era legalmente exigida, e que não

foi realizada. O TdC primeiro aponta que a avaliação intempestiva não substitui a avaliação prévia legalmente

exigida, depois constata que, entre a avaliação intempestiva realizada e a venda, o Governo alterou as

condições e o valor da ANA ao introduzir um conjunto de alterações nos contratos e na lei durante o próprio

processo de privatização. O Relatório evidenciou o desastroso negócio realizado, demonstrando que o

conjunto de dividendos que a multinacional retirará ao longo da concessão será superior a vinte mil milhões de

euros e que a divisão de receitas entre a multinacional e o Estado (incluindo nas receitas do Estado o preço de

venda e os valores a receber a partir de 10.º ano de concessão) será, na melhor das hipóteses, de 79% para a

multinacional e 21% para o Estado, um valor absolutamente fora do vulgar, para mais tratando-se de um

conjunto de infraestruturas já construídas.

Uma terceira ordem de questões levantadas pelo Tribunal de Contas está relacionada com a

promiscuidade entre a gestão da administração pública e privada, tanto na fase de privatização como na fase

de gestão privada. A primeira situação apontada pelo Tribunal de Contas é a nomeação da última

Administração da ANA, já depois de iniciado o processo de privatização, quando o lógico seria manter uma

administração com experiência e conhecimento durante esse processo. Um mês depois de nomeada essa

nova administração, a multinacional Vinci publicamente informa que irá contratar essa mesma administração

para assumir a gestão privada da empresa, o que viria a ser concretizado, um ano depois, com a manutenção

de todos os gestores «públicos» na gestão privada. Estes factos são depois agravados com as suas

implicações, nomeadamente a mudança de posição da ANA sobre a proposta global da Vinci, que passa de

«irrealista e irrealizável» para «a mais forte e a mais competitiva».

Por fim, coloca-se a questão da fidedignidade da documentação, expressamente levantada pelo Tribunal

de Contas, que por diversas vezes dá conta da sua perplexidade por várias inconformidades na documentação

entregue pela Parpública, que «revelam o risco material de deturpação de documentação processual» ou,

noutra expressão, o «risco material de falta de fidedignidade de documentação processual».

Este conjunto de questões levantadas pelo Tribunal de Contas na sua auditoria, e aqui apresentadas,

seriam suficientes para a realização imediata de uma comissão parlamentar de inquérito ao processo de

privatização da ANA. A dissolução do Parlamento pelo Presidente da República impediu a apresentação dessa

iniciativa, que se mantém tão atual como então.

Coloca-se ainda uma terceira e fundamental razão para a realização desta comissão de inquérito: a própria gestão privada, a forma como esta se tem desenvolvido, os prejuízos que tem trazido para o país e a necessidade de travar essa gestão, reverter a privatização e salvaguardar o interesse público. E as razões de queixa vão muito mais fundo que as já apontadas sobre o papel da multinacional na questão

do NAL. É preciso constatar a queda brutal do investimento com a privatização (menos de metade do

investimento realizado nos 10 primeiros anos de gestão privada face aos 10 últimos anos de gestão pública);

constatar a profunda degradação do aeroporto de Lisboa, transformado nestes 10 anos num dos piores da

Europa; constatar a própria degradação da qualidade do serviço noutros aeroportos nacionais. É necessário

apurar as condições concretas da «compra» das Lojas Francas à TAP, num processo de chantagem realizada

em prejuízo de uma empresa nacional. É necessário ainda avaliar a verdadeira dimensão do aumento global

de taxas praticada com a privatização e dos impactos desses aumentos na atividade económica em Portugal;

avaliar o impacto sobre os trabalhadores da ANA, a crescente precariedade e recurso à subcontratação, a

degradação salarial e de direitos, e o impacto destas políticas na vida dos trabalhadores e na resposta

operacional da empresa. Tudo isto sem esquecer, e exatamente tendo em conta, a importância do transporte

aéreo para a economia nacional.