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II SÉRIE-C — NÚMERO 12

in Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 78, 1979, pp. 109-110).

Idênticas considerações importa tecer quanto à actividade judicial. A aplicação jurídica envolve uma ponderação normativa, na qual ocorre sempre um momento normativamente constitutivo. A concretização há-de ser uma tarefa normativamente orientada e objectivamente fundamentada.

5.2 — O tratamento diverso de situações idênticas traduz, no caso vertente, um comportamento arbitrário que consubstancia uma violação do princípio da igualdade.

A diferenciação estabelece-se com base numa condição, meramente subjectiva — a etnia do arguido —, sendo destituída de fundamento objectivo e razoável.

É, pois, desrespeitada uma das cláusulas de não discriminação que o legislador constituinte expressamente instituiu (cf. artigo 13.°, n.° 2, da Constituição).

Considerando que os ciganos constituem uma raça no sentido constitucional, «por mais complexo que seja o conceito científico desta» (Parecer n.° 14/80, de 15 de Maio, da Comissão Constitucional, in Pareceres da Comissão Constitucional, xn, [80], 1982, p. 168), a utilização da expressão «raça cigana» implica a violação da proibição constitucional de discriminação fundada na raça.

Aquela utilização atenta contra a idêntica dignidade social de todos os cidadãos que, nos termos do artigo 13.°, n.° 1, da Constituição, é a base constitucional do princípio da igualdade (Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.a ed., revista, p. 126), sendo manifestamente impertinente.

Também a Declaração Universal dos Direitos do Homem,

a qual constitui parâmetro de interpretação das normas constitucionais relativas aos direitos fundamentais, proclama a idêntica dignidade de todos os seres humanos e a igualdade dos indivíduos perante a lei e proíbe as discriminações em função da raça (artigos 1.°, 2.° e 7.°).

Conclusões

De acordo com o exposto, e tendo em vista a atribuição constitucional de pugnar pela prevenção e reparação de injustiças (artigo 23.°, n.° 1, d'à Constituição), entende o provedor de Justiça fazer uso dos poderes que lhe são conferidos pelo seu Estatuto (Lei n.° 9/91, de 9 de Abril), no artigo 20.°, n.° 1, alínea, a), e, como tal, recomendar

1° A adopção pelo Conselho Superior da Magistratura das medidas necessárias ao apuramento da responsabilidade disciplinar, nos termos dos artigos 4.°, n.° 2, e 82.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais, aprovado pela Lei n.° 21/85, de 30 de Julho.

2.° A adopção pelo mesmo órgão de medidas que previnam a ocorrência de situações semelhantes à descrita, ou seja, a publicação de anúncios, bem como a afixação de editais ou a prática de outros actos da mesma natureza que, em face do respectivo teor, estabeleçam um tratamento diferenciado de um ou mais cidadãos com base em condições meramente subjectivas, violando o disposto no artigo 13.°, n.° 2, da Constituição e nos artigos 2.° e 7.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Solicito a V. Ex." que me iníorme do seguimento dado a

esta nvirAva recomendação. Com ós meus cumprimentos.

Lisboa, 23 de Maio de 1994. — O Provedor de Justiça, José Menéres Pimentel.

1X)CUMENT0N02

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Ex.mo Sr. Chefe do Gabinete de S. Ex." o Provedor de Justiça:

Tenho a honra de comunicar a V. Ex.8 que, relativamente ao assunto em epígrafe, o plenário do Conselho Superior da Magistratura, na sessão de 28 de Junho de 1994, tornou a deliberação do seguinte teor:

Deliberou-se, por unanimidade, não aceitar a recomendação n.° 93/94 da Provedoria de Justiça, relativa a um anúncio publicado no jornal Correio da Manhã, por ordem do M.mo Juiz do Tribunal de Comarcajle Aveiro, por se entender que o conteúdo do mesmo não traduz qualquer discriminação, mas elementos tendentes à identificação, que se enquadra na norma processual penal.

Com os melhores cumprimentos.

Lisboa, 8 de Julho de 1994. — O Juiz-Secretário, Pedro Gonsalves Mourão.

DOCUMENTO N.° 3

PROVEDORIA DE JUSTIÇA

A S. Ex.a o Conselheiro Presidente do Conselho Superior da Magistratura:

Assunto: Recomendação n.° 93/94, de 23 de Maio de 1994, relativa a anúncio publicado no jornal Correio da Manhã, para efeitos de notificação de arguido, que contém indicação da etnia do mesmo.

Em 23 de Maio próximo passado, dirigi a V. Ex.°, na qualidade de presidente do Conselho Superior da Magistratura, recomendação sobre o assunto supramencionado, onde se conclui pela violação do princípio da igualdade e se propõe que o Conselho Superior da Magistratura instaure as competentes medidas procedimentais disciplinares e adopte medidas preventivas da prática de actos de natureza idêntica ao da notificação em causa, que, em face do respectivo teor, estabeleçam um tratamento diferenciado de um ou mais cidadãos com base em condições meramente subjectivas.

Em ofício de 8 de Julho de 1994, o Conselho Superior da Magistratura esclarece que o plenário da secção deliberou, por unanimidade, não aceitar á recomendação n.° 93/94, por se entender que o conteúdo do anúncio que a motivou «não traduz qualquer discriminação, mas elementos tendentes à identificação, que se enquadra na norma processual penal».

Com o devido respeito, é meu entendimento que não procedem as razoes enunciadas.

Com efeito, e como observei já por ocasião da elaboração da recomendação em causa, é manifesto que a indicação da etnia é alheia ao escopo do acto de notificação, por nao constituir elemento necessário à identificação do arguido.

Aos argumentos oportunamente aduzidos acresce que o anúncio publicado tem por destinatário o próprio arguido