0003 | II Série C - Número 009S | 08 de Junho de 2002
variadas razões estruturais, ligadas à explosão da litigiosidade, à complexidade das soluções legislativas e ao atraso na adequação dos mecanismos processuais às novas realidades culturais, sociais e económicas, o sistema de justiça padece de um bloqueio que tem retirado eficácia aos tribunais e perturbado o normal desempenho das suas funções.
O panorama no início de 2001 era idêntico ao dos anos anteriores: pendências acumuladas, causadoras de atrasos na marcha dos processos e no agendamento dos julgamentos e diligências, sem solução previsível no curto prazo; processos parados nos gabinetes dos juízes a aguardar decisão, sem resposta imediata previsível; carência de quadros, impeditiva da instalação de tribunais já criados na lei, da criação de novos tribunais e juízos e do aumento de lugares em tribunais mais congestionados.
A vulgarmente chamada "crise da justiça" é, sobretudo, uma crise de eficácia dos tribunais, resultante do grave desfasamento entre as pendências processuais e a capacidade do sistema resolver os casos que lhe são postos com qualidade e em tempo razoável. O contínuo aumento do número de processos não tem sido correspondido por um aumento equivalente da capacidade de resposta dos tribunais. É, pois, urgente adoptar medidas excepcionais que permitam elevar no imediato essa eficácia, essencial para criar as bases de estabilidade e descompressão que permitam implementar as medidas estruturais consideradas necessárias.
Importará avançar já para reformas com natureza estrutural que permitam reservar os tribunais para as questões mais importantes. Desjudicialização, diversificação, simplificação e informalidade, podem ser, sem beliscar o princípio constitucional da reserva de jurisdição dos tribunais, as referências-chave para as reformas do sistema de justiça. Terá, designadamente, efeitos muito importantes nesta área da simplificação de procedimentos, a curto prazo, a esperada aprovação da projectada reforma da acção executiva.
Há também que olhar atentamente para a intervenção do juiz no processo, cada vez mais espartilhada por actividades meramente burocráticas e procedimentais. Essa intervenção tem de ser recentrada na disponibilidade para a sua verdadeira função, que é julgar e decidir. A implementação generalizada de um sistema de assessoria técnica e de secretariado permitirá alcançar esse objectivo, com ganhos financeiros e de produtividade.
Mas estas reformas estruturais precisam de tempo e de estabilidade. Para que produzam os efeitos pretendidos será necessário, primeiro, dotar o sistema de uma base mínima de estabilidade e descompressão, que permita, pela redução significativa das pendências e dos atrasos, aumentar no curto prazo a disponibilidade dos tribunais para assimilarem as reformas e potenciarem as suas vantagens. Reputa-se, pois, como medida extraordinária essencial e absolutamente prioritária, o aumento imediato e significativo do número de juízes em funções nos tribunais judiciais.
Nos últimos 14 anos a média anual de juízes que cessou funções nos tribunais judiciais, por nomeação para os tribunais administrativos, jubilação ou reforma, processo disciplinar e falecimento, foi de 65. Nos últimos anos têm sido várias as reformas da orgânica judiciária, delas resultando, em muitos casos, aumentos de quadros. Porém, o ritmo de recrutamento e formação de juízes tem sido manifestamente insuficiente para preencher essas necessidades. Em resultado deste desajustamento, agrava-se todos os anos o fosso entre o número de juízes e as necessidades conjunturais do sistema de justiça. Só com a implementação de mecanismos especiais e transitórios de recrutamento e formação de juízes será possível dar resposta a esta necessidade.
O aumento do número de juízes em funções, contrariamente ao que, por vezes, se afirma, não pode ser conseguido à custa da diminuição do número de comissões de serviço, pois estas estão já reduzidas praticamente ao mínimo essencial. Das 197 comissões de serviço existentes no início do ano de 2001, 181 resultavam de imposição legal (Tribunal Constitucional, Supremo Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas, Tribunais Administrativos e Fiscais, Tribunais Tributários, Tribunais Militares, Conselho Superior da Magistratura e Centro de Estudos Judiciários) e apenas 16 tinham outra natureza (cargos de escolha e confiança governamental, designadamente). Assim se demonstra como é quase irrisório o número de juízes em comissões de serviço não essenciais e que, mesmo estas, na sua grande maioria, resultam de pedidos do Governo.
Por outro lado, considera-se inadequado e indesejável suprir a carência de juízes para preencherem lugares de quadro com o recurso à figura excepcional dos "juízes de nomeação temporária". Este instrumento de gestão, criado pela Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, não permite que tais juízes assumam a plenitude das funções jurisdicionais nem garante a estabilidade necessária à produtividade pretendida e ao preenchimento de lugares de quadro.
No início do ano de 2001, de acordo com um estudo realizado, existia já um deficit de 142 juízes em relação às necessidades nos tribunais judiciais. O grande desafio colocado ao Conselho Superior da Magistratura para esse ano foi o de optimizar ao máximo essa escassez de recursos humanos disponíveis para enfrentar as carências dos tribunais. Tarefa tanto mais complexa quanto, nesse ano, atendendo a que o termo do estágio do 17.º Curso de Formação do Centro de Estudos Judiciários fora antecipado de Setembro para Janeiro de 2001, não seria, como não foi, possível contar com a entrada de novos juízes em funções durante cerca de 19 meses, até Setembro de 2002.
Neste contexto, no que respeita à gestão de quadros, a situação no início do ano de 2001 era, em resumo, a seguinte: existiam 1415 lugares de quadro instalados, dos quais estavam preenchidos 1370 lugares; vagos, por causa das agregações e acumulações de comarcas e vacatura de lugares, existiam 45 lugares, seis nas relações e 39 nos tribunais de primeira instância; estavam em funções nos tribunais judiciais 1462 juízes, dos quais 1370 ocupavam lugares de quadro e 92 estavam em funções auxiliares, consideradas mais prioritárias do que os lugares de quadro vagos.
Depois do movimento ordinário de Junho de 2001, que produziu efeitos a partir de Setembro, a situação agravou-se. Sem entrada de novos juízes, o movimento judicial teve apenas como efeito a recolocação geográfica dos que já estavam em funções. Entendeu-se nesse momento dar preferência ao preenchimento dos lugares de quadro e reduzir ao mínimo possível o número de destacamentos de juízes auxiliares além do quadro. Mesmo assim, tendo sido reduzidos os destacamentos de auxiliares além do quadro