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30 DE MARÇO DE 1988 87

Servi-me deste exemplo apenas para dizer que, neste domínio especial da língua, esta interpretação do n.° 2 tem de ser hábil. É a chamada protecção de origem, que foi há pouco referida pelo Sr. Deputado Almeida Santos. É o caso, por exemplo, de alguém que domine mal o português por ter vindo de um país de expressão oficial portuguesa. Há aí um propósito de protecção contra qualquer tentativa discriminatória.

Já não é admissível entender que, pela simples circunstância daquilo que está aqui consignado, alguém possa arrogar-se de, ignorando por completo a língua portuguesa, ter os mesmos direitos que aquele que fala o português quanto a matérias em que é exigível falar a nossa língua.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Concordo consigo em relação a esse ponto, Sr. Presidente.

Uma outra questão é a que se prende com o facto de se referir "beneficiado" e não apenas "privilegiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever".

De início também se me afigurou que literariamente ficaria mais enxuto dizer como o CDS propõe. Porem, depois de reflectir, afigura-se-me que pode haver o entendimento de que certos benefícios, mesmo em sede de direitos, liberdades e garantias, não são privilégios. Por essa razão, sou a favor da conservação do texto tal como ele está.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Da expressão "língua", Sr. Deputado?

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Não, Sr. Deputado, refiro-me a privilégios e benefícios.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, queria alertar para um dos riscos que pode comportar a eliminação do inciso "língua".

Na realidade, há quem entenda que um dos critérios atributivos da cidadania deveria estar relacionado com o critério da língua. Há mesmo quem entenda que o facto de não se dominar a língua deveria, em certas situações limite, decorrentes da liquidação do império colonial, permitir a retirada da nacionalidade portuguesa a alguns cidadãos que hoje a têm, mas que não dominam a língua portuguesa.

Creio que a eliminação do inciso "língua" deste artigo 13.º seria uma legitimação dessas interpretações, que me parecem atentatórias da tradição histórico-portuguesa e das próprias soluções jurídicas concretas encontradas nestes últimos doze anos de experiência descolonizadora.

Acresce ainda que a preocupação deste artigo não se aplica apenas a estrangeiros, mas também, segundo penso, aos portugueses emigrantes das segunda e terceira gerações, que tem dupla nacionalidade, isto é, aos emigrantes em outros países que, não perdendo a nacionalidade portuguesa, adquiriram outras nacionalidades e que não dominam a língua portuguesa, mas que nem por isso deixaram de ser portugueses e que em relação ao Estado Português não podem nem devem ser prejudicados pelo facto de não dominarem a língua portuguesa.

Creio que a eliminação do inciso comportaria riscos que, pensamos, não seria necessário correr.

O Sr. Presidente: - Há pouco referi que o princípio da igualdade não é de uma aplicação cega, isto é, que quando haja justificações para a desigualdade se impõe que as pessoas sejam tratadas desigualmente. É preciso é que existam essas justificações. E é essa a razão que, quando para um determinado posto é fundamental que se domine o português, leva a tratar desigualmente uma pessoa que não sabe falar a nossa língua.

Não se pode permitir, por exemplo, que, com base nesta ideia da "instrução" do n.º 2, um analfabeto possa vir a desempenhar a profissão de médico. Isto significa que o n.° 2 tem de ser devidamente interpretado, não se podendo deixar de ter isso em consideração.

Por outro lado, não podemos também ignorar que a eliminação de algumas destas expressões pode historicamente ter um determinado significado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais do orador.)... Que são lei interna. Penso que só lá falta a cor dos olhos. Aquela lista é tão extensa que está lá tudo, incluindo a língua. Vamos tirá-la? Penso que isso seria, pura e simplesmente, inútil. Continuaria a estar, como se expressamente lá estivesse.

Além do mais, é um acto inútil.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de me pronunciar em relação à conexão que foi estabelecida entre a possível relevância desta eliminação e algumas soluções legalmente encaráveis quanto à questão da cidadania.

Tendo em conta o conteúdo da Constituição em matéria de cidadania - e, que me lembre, há nesta sede uma proposta de alteração do CDS -, não me parece que ela tenha a ver com aquilo que o Sr. Deputado António Vitorino aqui configurou em termos bastante abertos, isto é, não específicos. Dado o conteúdo da Constituição, designadamente aquilo que decorre do artigo 4.°, "são cidadãos portugueses todos aqueles que como tal sejam considerados pela lei ou por convenção internacional". Nada mais se diz. Hoje em dia sabe-se, pois, que a lei diz o que diz quanto à aquisição e à perda da cidadania e que também dá um certo valor, que é, a certa altura, a relatividade, ao domínio da língua portuguesa. Não nos parece e que da reflexão sobre o artigo 13.º se possa extrair o que quer que seja no sentido apontado pelo Sr. Deputado António Vitorino.

Em todo o caso, e por todas as razões aduzidas, mantenho as considerações feitas quanto à não bondade de que cortemos a "língua". Agora, a orientação da "língua" no sentido de alguns argumentos e que não me parece ler espessura e sustentáculo bastante.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostaria de afirmar a minha convicção de que retirar daqui o termo "língua" é entrarmos por um terreno um pouco escorregadio. Não podem estar aqui previstas todas as situações.

Penso que se deve manter o termo "língua", que deve ser entendido não só como tal mas também como nível e tipo de linguagem. Isto porque penso que nenhum cidadão pode ser prejudicado em razão do tipo de linguagem que usa