O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

208 II SÉRIE - NÚMERO 8-RC

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, sobre a questão da técnica jurídica diria que, no meu entendimento, não há obstáculo, em termos de regimento da Comissão, a que se procure uma outra fórmula de abordagem do problema da pena maior. É que sempre se deveria entender que se trata de uma solução técnico-jurídica para responder a um problema que está clara e inequivocamente enunciado nos projectos de revisão apresentados pelos partidos políticos.

Seja como for, receio que esse exercício, que poderia ser interessante sob o ponto de vista intelectual, se transforme verdadeiramente na teia de Penélope, porque sempre que chegássemos ao fim teríamos de recomeçar. O elemento mais elucidativo sobre este pressentimento que tenho é dado por aquilo, que o Sr. Deputado José Magalhães já citou, que diz respeito aos trabalhos preparatórios da lei que definiu a equiparação da pena maior.

Na realidade, já na primeira revisão constitucional o debate dos artigos 27.° e seguintes girou em torno desta preocupação, saudável, mas improfícua, de tentar em sede constitucional corrigir anacronismos de uma política criminal que, por responsabilidade de todos nós, tem sido ela própria, por definição, profundamente anacrónica e marcada significativamente por soluções avulsas. Creio que, se quisermos encarar a resolução destas questões numa óptica de Catão, correctiva daquilo que é no nosso íntimo a incoerência ou a incongruência das soluções de política criminal, nunca conseguiremos encontrar nenhuma solução para os artigos 27,° e seguintes da Constituição. Talvez fosse preferível encararmos estes artigos numa perspectiva mais realista e pragmática e chegarmos à conclusão de que não adianta verdadeiramente tratar destas matérias na base de uma desconfiança congénita em relação ao legislador comum.

É óbvio que a definição de pena maior pelos limites mínimos e máximos das penas, como qualquer definição que tenha por critério a dosimetria das penas, seja ela apenas a do limite máximo, terá sempre subjacente uma larga margem de manobra do legislador comum e a possibilidade de se incluírem ou excluírem dos casos de prisão preventiva fora de flagrante delito, através da livre manifestação de vontade desse legislador comum, crimes que subjectivamente poderíamos considerar como extremamente censuráveis sob o ponto de vista jurídico-criminal. Contudo, a verdade é que, se nos dedicarmos à comparação das dosimetrias das penas do Código Penal, chegaremos à conclusão de que não é fácil descortinar no actual Código Penal um único critério norteador da atribuição da dosimetria das penas, até porque há vários critérios sobreponíveis. E, perante algumas situações concretas, a nossa consciência ética levanta-se brandando aos céus e considerando que o furto doméstico é penalizado de uma forma que não se justifica face a outros crimes que subjectivamente consideraríamos susceptíveis de uma punição mais rigorosa. É um caminho que, em meu entendimento, não tem solução. Não quero dissuadir quem queira ir por ele, mas preferiria não enveredar por esse terreno.

Creio que a lógica do actual sistema constitucional é, apesar de tudo, compreensível. Tratou-se de não maniatar o legislador comum da possibilidade de perante novas realidades criminosas ou criminogéneas poder adoptar livremente penas que facultem o recurso à prisão preventiva, sem a necessidade de termos de recorrer a revisões constitucionais perante novas realidades criminosas que se justificariam ser contempladas com a situação de prisão preventiva fora de flagrante delito. Qual é, portanto, o critério de aproximação que proponho? Proponho que, tal como disse o Sr. Deputado José Magalhães, possamos meditar sobre o elenco das dosimetrias das penas constantes do Código Penal, o que, aliás, é um exercício interessante e muito elucidativo, mas que nos preocupemos sobretudo com a construção de um artigo que seja o pressuposto de uma política criminal mais coerente. E, salvo melhor opinião, penso que a aproximação que o projecto do PS propõe da definição de limite mínimo e limite máximo concede ao legislador comum um quid - pequeno, claro, mas um quid - de orientação da própria adopção de medidas de política criminal em sede de legislação ordinária. Como disse o Sr. Deputado José Magalhães, a mera referência ao limite máximo vai deixar de fora alguns casos que, uma vez feita a leitura do quadro da dosimetria das penas hoje em dia aplicável no Código Penal, nos parecem não dever ficar de fora da aplicação deste regime.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - O Sr. Deputado José Magalhães disse também que podia ser o contrário.

O Sr. António Vitorino (PS): - Que ficavam em excesso, mas de fora da aplicação...

O Sr. Costa Andrade (PSD): - O Sr. Deputado disse que o uso dos dois critérios vai deixar de fora crimes cujo limite mínimo é mínimo mesmo e cujo limite máximo é extremamente grande, o que me parece inteiramente correcto.

O Sr. António Vitorino (PS): - Exacto, era isso o que queria dizer, mas não me exprimi correctamente.

O problema reside exactamente em o facto de se utilizarem os dois limites ser mais restritivo e, portanto, permitir que neste tipo de conceito caiba um núcleo de crimes mais coerentemente admissíveis como passíveis de prisão preventiva. Era isso o que queria exprimir. Não sei se fui claro, mas era essa a ideia que desejava transmitir e foi isso o que, aliás, presidiu à elaboração da lei sobre a equiparação a pena maior, que também tinha esta versão originária. Na versão que foi entregue pelo governo do bloco central também só se definia a equiparação a pena maior pelo limite máximo, tendo sido o debate parlamentar que permitiu introduzir o limite mínimo.

Nesse sentido, pretenderia defender a manutenção da fórmula que consta do projecto do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Quero apenas dizer que quem defende a opinião que perfilho tem desconfiança em relação ao legislador ordinário nesta matéria. É só isto o que queria dizer.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.