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22 DE ABRIL DE 1988 205

a pretender defender e alicerçar a minha tese numa certa tradição portuguesa, a que a própria Constituição de 1933 não fugiu até à última revisão que sofreu.

A não ser assim, apenas tivemos dúvidas - e trata-se de um problema relativamente ao qual ainda mantenho algumas dúvidas - quanto ao facto de adoptarmos uma redacção do tipo da proposta pelo PSD ou pelo PRD, visto ser óbvio que hoje teríamos de afastar do nosso horizonte o conceito de pena maior, desde logo pela razão evidente de ele ter deixado de fazer parte do Código Penal. Por outro lado, e se essa razão não existisse, diria que o conceito de pena maior é um conceito ao arrepio das modernas tendências da criminologia e das ciências criminais, visto que "pena maior" (como era conhecido) significava uma pena em que a pessoa seu objecto não tem capacidade de se ressocializar, etc., contrariamente à pena correccional, que era uma pena imposta no sentido de corrigir essa mesma pessoa. O conceito de pena maior era - digamos - um conceito infamante. Teríamos, portanto, de qualquer modo, de o tirar, não fora o caso de a nossa reforma penal ter abandonado esse conceito.

Restava-me a dúvida, que ainda hoje mantenho, de irmos ou não para uma solução como a nossa, que é a de manter um limite máximo, sabido como é que hoje nas penas de prisão até seis meses - é a tendência recebida no nosso Código Penal - não há prisão por multa. Temi que, dado que hoje, na nossa penalogia, as diferenças entre a pena mínima e a pena máxima são muito grandes, pudesse existir alguma pena de prisão de seis meses a quatro anos ou menos de três meses a quatro anos. A hipótese que configurámos na alínea a) é - devo desde já confessar - um pouco abstrusa; é talvez um medo irracional, mas também uma dúvida que mantenho. Não faço dela um ponto de honra e poderei até subscrever qualquer das outras duas propostas, fazendo corresponder à pena maior a pena de prisão superior a três anos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Sr. Deputado Vera Jardim, estou de acordo com a sua doutrina em relação à primeira parte da sua exposição. Qual é a dificuldade de acolher o seu ponto de vista?

O Sr. Vera Jardim (PS): - Defendi o meu ponto de vista e mantenho-o, mas gostaria de ouvir os outros Srs. Deputados criticar ou não este limite mínimo e este limite máximo.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Referia-me à parte inicial relativa à fidelidade à tradição constitucional portuguesa.

O Sr. Vera Jardim (PS): - A dificuldade que se aponta é a de elencar os crimes. Entendo que não haveria dificuldade nisso. Como disse, tais crimes vinham elencados na Constituição de 1911 e continuaram elencados, até certa altura, na Constituição de 1933. E sempre fiquei com a pedra no sapato quanto à razão pela qual a partir da Constituição de 1976 se acabou e se rompeu esta tradição, que é, efectivamente, a tradição que mais defende os direitos das pessoas. Sobre isso não podemos ter qualquer dúvida.

Vi há pouco o Sr. Deputado Costa Andrade a acenar afirmativamente com a cabeça, pelo que espero ter sido claro a demonstrar a sua concordância com aquilo que acabei de dizer e talvez não com a solução, por outras razões.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - É efectivamente verdade que a solução da tese que o Sr. Deputado defende seria indubitavelmente a melhor. E confesso que não sei por que é que se mudou.

Quando comecei a entrar nestas coisas já tínhamos este lastro de rotina histórica e a ideia de pena maior. Não sei por que é que se terá mudado, mas talvez isso tenha acontecido por várias razões, inclusivamente devido à ideia de que com a transposição do Estado liberal - "liberal" no sentido de não intervencionista na economia - para o Estado moderno os códigos penais estavam em permanente fase de enchimento. Anteriormente era extramamente fácil trabalhar o direito penal, que foi durante séculos relativamente estável. O número de crimes foi durante muito tempo, pelo menos a partir do iluminismo, relativamente estável.

O Sr. Vera Jardim (PS): - As penas são ainda menos estáveis.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Exacto, eram os crimes contra a economia, os crimes contra a saúde, os crimes contra o ambiente e os crimes contra não sei o quê. Essa técnica de elencagem, que era - e penso que nisto ninguém estará em desacordo - a técnica mais rigorosa e mais correcta, deve ter-se tornado tecnicamente impossível. Já herdámos isso em 1976 e mantivemo-nos na linha do que vinha na Constituição de 1933 modificada.

Neste momento, o problema que se coloca é o de se substituir a expressão "pena maior" por uma equivalente na actual dosimetria penal. Parece-me - e também tenho algumas dúvidas, pois estas coisas são muito de "mais ou menos", não havendo coisas absolutas - que a fórmula correcta deve ser aquela que o PSD utiliza, aliás à semelhança do que faz o PRD. Isto porque, em toda a estrutura penal, a gravidade e a classificação dos crimes são sempre feitas pela pena máxima. É por aí que as coisas se aferem, até porque no novo sistema que temos as penas mínimas são sempre relativamente reduzidas, a fim de se dar ao juiz outras possibilidades. Actualmente o que manda é a pena máxima.

O Sr. António Vitorino (PS): - A lei que integra o conceito de pena maior define actualmente...

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Actualmente não há pena maior.

O Sr. António Vitorino (PS): - A lei feita pela Assembleia da República, que manda fazer a equiparação a pena maior, não a define apenas pelo máximo, mas sim pelo máximo e pelo mínimo.