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5 DE MAIO DE 1988 235

O Sr. José Magalhães (PCP): - Se adoptarmos uma noç3o da expressão "compreensível" tão lata como aquela que aqui é proposta, então o Sr. Presidente Rui Machete não terá razão, porque não haverá, nesse caso, que temer minimamente que o rigor traga problemas àquilo a que chamou "o normal funcionamento do processo penal", isto é, que o rigor seja um escolho.

Fico sempre impressionado com esse tipo de argumento, que, de resto, procede de matrizes predominantemente situadas do ponto de vista da Administração Pública, o que não é de estranhar da parte do Sr. Presidente Rui Machete, que não é, em si mesmo, um pecado, porque a ideia de que o rigor em matéria processual penal é um escolho e uma dificuldade e os polícias, em particular, precisam de pouco rigor para poderem ser muito eficazes e um dos aspectos que mais ferozmente contrastam com a necessidade de construção de um Estado democrático em que a polícia, justiça e liberdade se articulem harmoniosamente, como é o caso do nosso ordenamento constitucional. Parece-me, portanto, que o argumento e injusto.

No entanto, tenho ainda uma pergunta a colocar ao Sr. Presidente Rui Machete relativa à terceira componente da sua intervenção, que para mim e um pouco misteriosa. O Sr. Presidente considerou o problema apaixonante e interessante, mas depois foi extremamente pudico em toda a problemática das outras formas de detenção que não as próprias do processo penal e, quanto ao estatuto das ditas cujas e relativamente à necessidade eventual de providenciar na sede própria, não especificou qual fosse essa sede. Creio que esse é um aspecto que terá de ser discutido na tal outra sede própria ou talvez noutra reunião, mas não gostaria de o deixar em branco. É que passou muito rapidamente à nossa frente e penso que merecerá um gesto de atenção e interesse.

O Sr. Presidente: - É muito provável, Sr. Deputado José Magalhães, que tenha sido o meu pendor administrativista que me tenha levado a pensar existirem outras formas que podem também pôr em perigo os direitos fundamentais, formas essas que não se situam no âmbito do processo penal geral. Por exemplo, para não ir mais longe, estava a pensar nas sanções disciplinares de carácter militar. Mas há outras.

Agora, queria aproveitar a oportunidade para lhe dizer que engeito totalmente a sua observação, no que diz respeito a esse pendor administrativista conduzir a uma diminuição dos requisitos do Estado de direito. Porque aquilo em que eu estava a pensar, meu caro Sr. Deputado José Magalhães, era um pouco diferente e o exemplo que tinha em mente era mais o do mundo anglo-saxónico do que os dos sistemas administrativos continentais europeus. Eu estava a pensar que tem havido abusos altamente significativos em matéria de processo penal, com gravíssimos prejuízos para o Estado de direito - e estou a pensar nos Estados Unidos da América -, designadamente porque as organizações criminosas têm vindo a apetrechar-se com conselhos jurídicos que lhe são extramente úteis para, de uma maneira mais eficaz, perpetrar determinados crimes, com gravíssimo dano para a colectividade e para as pessoas que são atingidas, e que essa circunstância redunda da equiparação, que muitas vezes pode fazer-se, entre o formalismo e o rigor.

Há problemas ralacionados com essa equiparação que levam a que a mínima quebra de uma regra formal traduzida em menor compreensão por parte do destinatário que é cautelado por essas regulamentações - neste caso as pessoas detidas -, ou seja, da mínima compreensão clara sobre a qual a sua situação, quais os seus direitos, pois, eventualmente, se não se disseram certas palavras sacramentais, se não se fixar uma determinada diligencia que, repito, não tem nada de essencial, e se aplicar o rigor como equivalente a formalismo, pode servir para anular esses actos ou esses procedimentos.

Parecer-me-ia que, nesse caso, prestaríamos um mau serviço e é nesse sentido que penso que, dentro daquele equilíbrio que há pouco referi, ou seja, o de, por um lado, não encharcarmos a Constituição - que deve ser enxuta - com uma série de disposições regulamentares que lhe retiram dignidade e o de, por outro lado, atendermos à sua função pedagógica e à circunstância de estes preceitos terem uma aplicação directa, o que pode acontecer mesmo nos casos em que, por eventuais razões técnicas, não esteja no âmbito do Código de Processo Penal a disciplina dessas matérias, é útil haver uma preservação do que é o núcleo fundamental, no sentido de este dever ser salvaguardado no que diz respeito a este tipo de direitos.

Nesse sentido, Sr. Deputado, não subscrevo nenhuma das suas interpretações, que considero deteriorarem, pelo menos, o meu pensamento, embora V. Exa. o faça, evidentemente, não com intuitos mal-intencionados ou malévolos. Penso que não é de subscrever a proposta do PCP nesse capítulo por essas razões e admito que, pelo contrário e no que diz respeito a uma informação compreensiva, esta não terá esse efeito negativo.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Quero esclarecer que, evidentemente, esteve muito longe de nós qualquer intenção de deteriorar o pensamento do Sr. Presidente nesta matéria.

Pelo contrário, congratulo-me com o facto de termos contribuído para estimular uma clarificação que poderá não ser irrelevante, mas que, sobretudo, esperamos seja operativa, se, como tudo indica, vier a ser seguida a solução para que acabou de apontar. Também nós, Sr. Presidente, estamos naturalmente preocupados com o aproveitamento que certas forças e organizações possam fazer de determinados conceitos que, designadamente, constam do nosso Código de Processo Penal, tal como está em vigor, e de certos mecanismos nele instituídos, ou seja, estamos preocupados com um bom conhecimento e, seguramente, um bom aproveitamento futuro desses mesmos conceitos por parte dos conselheiros jurídicos dessas organizações. Naturalmente, não é essa a preocupação que nos move aqui e estamos inteiramente de acordo quanto à necessidade de uma solução simultaneamente precisa e não formalista no sentido pérfido, o que, seguramente, também não nos será atribuído.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu só queria clarificar um ponto que me parece não dispiciendo: e que a matriz administrativa que nos foi imputada, pelos vistos, também é comungada pelo Sr. Deputado José Magalhães.

Mas, Srs. Deputados, para me manter fiel à promessa que me foi arrancada em matéria futebolística, já não teremos possibilidades de entrar na discussão do artigo 28.º

O Sr. António Vitorino (PS): - (Por não ler falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)

O Sr. Presidente: - Isso era muito importante, até porque hoje dedicamos o nosso tempo ao CDS. Com muito prazer, é claro!