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614 II SÉRIE - NÚMERO 21-RC

caso de falência também não? A expressão "adequada protecção" é prudente. Mas gostaria de ver a expressão "garantias civis e penais do pagamento" concretizada, sob pena de justificar alguns receios.

Colocadas estas questões, que não constituem ainda uma tomada de posição, dou a palavra à Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Muitas das afirmações que pretendia aqui deixar foram já feitas, pelo que correrei o risco de alguma repetição. No entanto, gostaria de colocar algumas questões ao Sr. Deputado José Magalhães.

A estatuição contida no n.° 1 deste preceito, ou seja, a de que "a duração do trabalho será progressivamente reduzida", das duas uma: ou é uma disposição de carácter preceptivo, caso em que existirão todas as inconveniências já referidas pelo Sr. Deputado Almeida Santos, ou é uma disposição programática que aponta para um certo modelo de relações de trabalho, e mesmo de sociedade ideal e que, quando li pela primeira vez, me fez de certo modo lembrar os escritos dos socialistas utópicos.

É óbvio que, por uma questão de evolução das condições de trabalho e de dignificação do homem, a duração de trabalho terá de ser progressivamente reduzida. A questão que se coloca consiste em saber se este princípio deve ser inserido na Constituição e, a sê-lo, se com uma perspectiva programática ou preceptiva, e, neste caso, qual o seu sentido e alcance.

Quanto ao n.° 2, o problema da impenhorabilidade do salário está, de certo modo, já previsto no Código de Processo Civil relativamente aos "bens relativamente impenhoráveis", quando o artigo 823.°, na alínea e) - o Sr. Deputado, com certeza, tem isso em conta - já refere que são relativamente impenhoráveis bens que digam respeito a "salários de quaisquer empregados ou trabalhadores". É óbvio que aqui se pretende uma "isenção" maior, mas é óbvio que esta isenção deixa totalmente impenhorável o salário mínimo, o que pode criar distorções no tratamento igual da responsabilidade por dívidas, entre os que recebem o salário mínimo e os que, excedendo-o, andam muito próximo dele.

Relativamente ao n.° 3, ou seja, à expressão "são pagos com preferência a quaisquer outros", pergunto: que "outros" são estes? São os créditos comuns? São os créditos garantidos por garantias reais? São os privilégios imobiliários? Isto é, estes créditos ultrapassam mesmo os créditos privilegiados que digam respeito ao Estado, ou a outros entes públicos, e que atendam à qualidade especial destes sujeitos? Como é que se vai, no fundo, alterar esta lógica se estes "quaisquer outros" são todos?

Isso obrigaria a uma profunda alteração ao nível do direito civil, a uma revolução a esse mesmo nível, se quiser!

Finalmente, bem mais grave parece-me a formulação do n.° 4 do artigo 60.°-A. Quando se fala em "garantias penais" é isto, de facto, a consagração constitucional da prisão por dívidas? É óbvio que há aqui uma referência e uma remissão para a lei, é óbvio que esta lei poderia não existir, e é óbvio que existem garantias da mediação da lei, bem como toda a razoabilidade dos critérios de decisão que estão na sua base. Mas o que é verdade é que há aqui um apontamento constitucional que repugna. Isto é consagrar a prisão por dívidas? Isto é voltar atrás.

Relativamente às garantias civis parece-me que a Constituição não adianta mais. Nós sabemos que o Código Civil tem já todos os mecanismos sancionatórios pelo não cumprimento dos contratos e parece-me que eles têm já plena suficiência para resolver os problemas do atraso de pagamento. Era exactamente todo este conjunto de questões que queria pôr ao Sr. Deputado. Faltou-me mencionar uma nota que é a referência ao artigo 737.° do Código Civil, alínea b), em que já figuram também os créditos salariais como privilégio relativo, visto que gozam de privilégio mobiliário geral.

Isto chega ao PCP? Ou, de facto, o privilégio mobiliário geral vai transformar-se e ultrapassar toda a lógica de coordenação entre os vários critérios privilegiados possíveis?

Era, de facto, este conjunto de questões que eu lhe queria pôr.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação às questões atinentes aos limites da duração do trabalho; é sabido, Srs. Deputados, que os esforços feitos para se atingir uma norma razoável podem sempre ser coroados de êxitos muito variáveis. Até podem ser francamente lamentáveis e não ter êxito nenhum, no caso de as propostas serem inteiramente mal redigidas, absolutamente incomportáveis, refundíveis a título nenhum e, portanto, imprestáveis. Não creio que seja o caso. E as perguntas que fizeram são susceptíveis de resposta, não devolvendo puramente a pergunta, mas procurando aprofundar o debate em torno do texto constitucional em vigor. Como os Srs. Deputados sabem, o artigo 60.°, n.° 2, já estabelece esta coisa "terrível" e verdadeiramente "preocupante" (pelo seu carácter "preceptivo" ou "programático", logo se verá!):

Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:

b) A fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho;

Ora bem, a fixação dos limites da duração do trabalho tem de ter já hoje um conteúdo constitucional mínimo. Os comentaristas vêm-lhe assinalando o seguinte conteúdo constitucional mínimo: por um lado, a ideia de que haja um requisito quanto ao carácter nacional (portanto deve haver uma duração que seja vinculativa, fixada pelo legislador, sem variações regionais - de contrário chegaríamos às 15 horas em Setúbal e às 12 horas em Trás-os-Montes ou às 8 horas ou a sol a sol alhures, ou vice-versa, naturalmente). Nenhuma dúvida também de que é ao Estado e só ao Estado que cabe essa fixação - as entidades patronais não hão-de poder ter a possibilidade de estabelecer, mesmo pactuadamente, alterações nessa esfera, pelo menos no sentido de alargamento. E, por outro lado, um princípio, de diferenciações, isto é, pode haver durações diferentes em função da natureza, do tipo de trabalho, designadamente do seu carácter mais penoso ou menos penoso, etc. Falta aqui, naturalmente, um referencial, um elemento, que é a questão da duração.