1 DE JULHO DE 1988 643
O Sr. Presidente: - Manifestaram a intenção de fazer perguntas os Srs. Deputados Raul Castro, José Manuel Mendes e Maria da Assunção Esteves.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (ID): - A pergunta que quero colocar não diz respeito propriamente ao conteúdo das várias propostas - podemos, aliás, adiantar desde já que têm a nossa concordância de uma forma genérica -, mas sim a deslocação do artigo 110.° da parte da Consumição donde actualmente consta para esta outra parte. E a nossa dúvida - era essa a pergunta que queria formular ao Sr. Deputado Vera Jardim - é a seguinte: a norma está efectivamente localizada na parte da organização económica, mas no título vi, que diz respeito ao "comércio e protecção do consumidor; naturalmente que, tirando daí a norma relativa à protecção do consumidor, fica somente o artigo 109.° ("Comercio"), mas a verdade é que a protecção do consumidor tem ligação estreita com a matéria do comércio. É essa a nossa dúvida. Como o Si. Deputado, quanto a esta parte, não desenvolveu a respectiva justificação, gostaria que desse um esclarecimento sobre tal matéria.
O Sr. Presidente: - Presumo que o Sr. Deputado Vera Jardim deseja responder no fim.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Vou um pouco na sequência da questão acabada de colocar pelo Sr. Deputado Raul Castro.
Nós sabemos que, já hoje, a Constituição, no artigo 110.°, institui os consumidores em titulares de direitos constitucionais, opta por uma inserção sistemática que procura conter aquilo em que as normas pertinentes revestem características de direitos fundamentais com o que tem mais directa ligação com os direitos económicos, desta miscigenação buscando uma contemplação mais global do próprio universo da problemática em apreço. O Partido Socialista recupera para a área dos direitos fundamentais, e na parte que temos vindo a debater, o que eslava prescrito lá mais adiante, eliminando, no local próprio da sistematização ainda vigente, o que agora repropõe, em alguns aspectos modernizando, ressisismatizando e sobretudo inovando, como particularmente acontece com a acção popular nesta matéria, pelo que gostaria que o Sr. Deputado Vera Jardim, um to quanto possível tornasse clara, para além desta evidente constatação, qual a vantagem que vê, do seu pomo de vista, na reinserção ensejada deste elenco de preceitos; porquê, ao cabo e ao resto, tirá-lo de onde estava e incluí-lo aqui, uma vez que, suponho, em relação às questões de natureza material, foi já sobejamente explícito.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Pretendia confessar, de certo modo. algum agrado que esta inovação proposta pelo PS nos vem aqui merecer na revisão constitucional. Queria só referir algumas questões, que não são bem perguntas, são apenas apreensões que nos ficam mais da redacção do que do sentido e da inserção sistemática deste preceito. Por exemplo, no n.º I: por que é que se insere "bem como à reparação de danos"? A reparação de danos e a necessidade de uma indemnização não decorre já dos termos gerais de direito? Como é que se concretiza esta ideia da "segurança e dos seus interesses económicos"?
Por outro lado, quanto ao n.º 4: não está já a lei ordinária sobre direitos dos consumidores a consagrar formas de acção com tipos de legitimidade especiais que salvaguardem os direitos dos consumidores? São apenas pequenas questões.
Portanto, as questões seriam sobretudo estas: porque falar de novo aqui da reparação de danos? Porque inserir um n.° 4? Entenderá o PS que tem de haver uma salvaguarda constitucional daquilo que a lei ordinária já não tem dúvidas em consagrar? E as outras fórmulas, cuja explicitação gostava de ver mais desenvolvida. De resto, achamos um artigo oportuno.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim, para, neste quadro de simpatia, fornecer as explicações que entender.
O Sr. Vera Jardim (PS): - Em primeiro lugar, quanto à inserção do preceito - foi aquele que motivou até mais intervenções -, o exemplo de que uma inserção mais correcta e a nossa e a própria intervenção de alguns dos Srs. Deputados. Quer dizer: o problema dos direitos dos consumidores não se põe em relação propriamente a tipos de organização económica ou a sectores de organização económica, designadamente não se põe apenas em relação ao comércio. Porquê em relação ao comércio? Também se põe em relação à indústria, também se põe em relação à agricultura. Há hoje problemas jurídicos, como seja a responsabilidade do produtor, que estão, naturalmente, intimamente ligados à protecção do consumidor, e que não têm a ver directamente com o comercio. É evidente que o consumidor aparece sempre no términos de um circuito económico, no qual alguma distribuição tem de haver. Mas parece-nos incorrecta, precisamente, a sistemática de hoje, que é situar os direitos dos consumidores - que têm muito mais a ver com os direitos dos trabalhadores, com os direitos à Segurança Social, ele, que são direitos mais ou menos extensivos a toda uma classe, ou até todos nós, que é o caso dos consumidores - inseridos em matéria de organização económica. Digamos que o que interessa aqui é afirmar o direito dos consumidores face à produção, ao comércio, etc., e não propriamente colocá-los nos grandes princípios da organização económica. Eles estão acima disso ou, pelo menos, ao lado disso, e não inseridos numa sistemática de organização económica. Portanto, penso que aqui não será necessário explicar muito mais. É uma opção que fizemos, que julgamos correcta, que não afectará, digamos, o fundo, e obviamente que transpusemos para este artigo uma boa parte daquilo que vem dito no actual artigo 110.°, apenas com os melhoramentos que enunciei: o n.º 4 e inserção no n.° 1 de alguma coisa mais.
Em relação aos outros problemas que foram postos, sobretudo pela Sra. Deputada Assunção Esteves, é evidente que encontramos aqui sempre a velha problemática com que nos debatemos, quase desde o princípio, de saber se devoremos ou não constitucionalizar determinadas matérias. Nós entendemos que, em matéria de consumidores, para construirmos um preceito completo, deveríamos aqui introduzir algumas coisas que, tem razão, estão, por um lado, garantidas na lei ordinária e, por outro, se poderiam extrair do próprio contexto em que aparecem, até afirmadas como direitos, e que, portanto, o Estado está também obrigado, obviamente, a alguma espécie do prestação, mesmo que ela seja muito genérica. Em todo o caso, este problema do apoio do Estado parece-me não ser tão indiferente como isso, visto que isto põe em causa o direito a prestações positivas da parte do Estado a favor dos consumidores e das