14 DE JULHO DE 1988 765
O Sr. Presidente: - Então faça as suas perguntas aos dois Srs. Deputados.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Começaria então pelo Sr. Deputado Rui Gomes da Silva para dizer o seguinte: da sua justificação, Sr. Deputado, resultou que a razão, porventura maior, estarei enganado porque nem sempre se ouve tudo, há lacunas no discurso ouvido que V. Exa. colmatará, mas ficou-me a ideia de que a principal justificação para a proposta de eliminação do artigo 80.8 pelo PSD residia na circunstância de este artigo 80.° no fundo constituir um excesso de verbalismo da Constituição. Isto é, havia aqui como que uma duplicação de princípios que estavam espalhados ao longo de outras normas, e isso seria para o PSD razão suficiente para o eliminar, para evitar esse verbalismo. É uma razão respeitável, porque a nossa Constituição tem excessos de verbalismo, todos sabemos, verbalismos muitos deles inúteis. Mas, Sr. Deputado, essa justificação deixa em claro aquela que nós apresentámos, não para a eliminação mas para a alteração do artigo 80.º, e já houve aqui quem se preocupasse com o problema da constitucionalidade da revisão constitucional, e eu suponho que bem. VV. Exas. têm nesta matéria da constitucionalidade uma experiência agora muito grande e pesada. Acho que efectivamente a deviam considerar.
Sr. Deputado, não lhe repugna, para além da repetição que porventura possa existir, este modelo económico que, como diz o Sr. Deputado José Magalhães, está aqui bem expresso nas várias alíneas do artigo 8O.º? Que é um modelo - o objectivo final desta Constituição - que em 1982 nos permitia congratularmo-nos com a circunstância de se compadecer com uma economia mista, mas que hoje não serve já o País, obrigando-nos a ir mais além. O modelo de caminho para o socialismo assente na apropriação dos principais meios de produção e solos não oferece nenhum comentário ao PSD? Esta era a questão que queria pôr ao Sr. Deputado Rui Silva.
Quanto ao Sr. Deputado António Vitorino, eu queria agradecer-lhe muito a sua referência e dizer-lhe que pela leitura da proposta do PS verifico que há também a preocupação de respeito pelos limites materiais do artigo 290.°, tal como nós ao redigirmos o n.º 2 do artigo 80.9 do nosso projecto. No entanto, há pequenas alterações nas alíneas c) e e) da vossa proposta que me parecem apontar, também elas, no sentido da introdução de pequenas alterações a esse modelo. VV. Exas. não falam de principais meios de produção e solos, eu congratulo-me com isso e congratulo-me com a circunstância de VV. Exas. considerarem que isso é efectivamente compatível com a dupla revisão. E depois, em vez de desenvolvimento da propriedade social, o PS fala em protecção do sector social da propriedade, e também aí me parece haver realmente uma preocupação de maior realismo em relação à economia que temos e não àquela economia que pretendíamos ter, que nunca chegámos a ter e que nunca foi verdadeiramente eficiente, a não ser nas palavras do Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, que quer fazer perguntas ao Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, tomei boa nota daquilo que me pareceu uma diferença de argumentação, mas gostaria de perceber rigorosamente se há uma diferença de finalidade da parte do PS em relação a algumas das soluções que propõe.
Antes disso registaria, naturalmente porque corroboro, a menção que foi feita à diferença de atitudes entre aqueles que em 1982 se louvaram de enormíssimos êxitos em relação ao desmantelamento da constituição económica e agora acham absolutamente magro e ínfimo tudo aquilo que então foi conseguido, em nosso entender bastante mal ou negativamente.
Não alterámos a nossa posição em matéria de constituição económica, como o Sr. Deputado António Vitorino não referiu mas podia ter referido (é normal, é um cotejo). Foram realmente reformulados em 1982 os princípios fundamentais da constituição económica, incluindo este artigo 80.º, foram alterados os artigos 81.º, alínea f). 82.º, n.º 2, 89.°, n.º 3, e 90.°, n.º 1, e foram retirados os artigos 96.8, 108.° e HO.8 Não é pouco, porque a isto havemos de somar as alterações em relação aos princípios e aquilo a que os Srs. Deputados entenderam então chamar a "desideologização" do texto constitucional, que levava o Sr. Deputado Luís Beiroco a dizer esta coisa pomposa: "alcançou-se o importantíssimo progresso que consiste na supressão da ideia do modelo económico de transição, de ora avante o modelo económico português é o que consta da Constituição e não mais"; suprimiu-se "aquela rápida caminhada para o socialismo colectivista (sic) e autogestionário (re sic) com que o texto de 76 nos queria levar", num salto, pop suponho eu, "do Atlântico para o Adriático"; logrou-se "expurgar da terminologia marxista" o texto constitucional que ficou "desideologizado", "dotado em muito pontos de uma redacção mais realista e maleável". O mesmo deputado dizia outras coisas que constam da p. 226 da Constituição da República Portuguesa, na edição da Assembleia da República. Mas, Srs. Deputados, ao que parece, isto vários anos depois não chega.
O Sr. Deputado António Vitorino evocou tudo isto, mas para se colocar, e era aí que eu queria chegar, numa posição de "equidistância". Entre "os que querem que tudo fique" e "os que querem que nada fique", eis que encontrávamos alguém que tem uma posição do meio da ponte e que seria (evoé!, e finalmente) o PS, com uma solução "equilibrada", que não substituirá um programa do Governo por outro programa do Governo, etc. Queria chegar precisamente à rigorosa aferição, e pedia ao Sr. Deputado que me ajudasse nesse ponto, do grau de equilíbrio atingido pelo PS, porque me parece que esse equilíbrio é um pouco desequilibrado. A ser um equilíbrio, é um equilíbrio que pende mais para um lado que para outro, pende mais para o lado da violação do artigo 290.° do que para o lado do seu acatamento. Era aí que eu gostava de chegar. Sei, Sr. Deputado António Vitorino, que não quer "agitar" qualquer bandeira ideológica, a não ser aquela mesma que agita dizendo que não agita coisa nenhuma. Tomei nota da expressão que utilizou quanto ao facto de o PSD seguir uma má via. Nós também achamos que a via do PSD é péssima, é uma via que ofende grosseiramente o artigo 290.° Tomei nota, com alguma inquietação, do facto de ter usado o presente para aludir a uma coisa que idealiza como futura, isto é, a possibilidade de a lei futura da revisão constitucional poder não observar os limites materiais de revisão. O Sr. Deputado disse: "a lei pode chegar ao Tribunal Constitucional". Eu esperava ouvi-lo dizer: "poderia chegar ao Tribunal Constitucional", porque a lei só pode chegar ao Tribunal Constitucional se o PS aceitar viabilizá-la.
O Sr. António Vitorino (PS): - Posso interromper V. Exa.?
Sou licenciado em Direito, não sou um gramático, é natural que a minha expressão às vezes possa não passar no