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760 II SÉRIE - NÚMERO 26-RC

Assunção Esteves, ao dizer que a obrigação de o Estado apoiar estava já prevista no n.° 2 do artigo 79.° V. Exa. invocou, contra esta posição, dois argumentos: um de carácter histórico, outro de carácter sistemático. O argumento de carácter sistemático refere-se ao que resulta do artigo relativo à juventude, onde se diz "apoiar directamente". Não me parece que este argumento seja decisivo; poderá significar tão-só que aí o apoio é mais forte, mais directo, mais óbvio, mas não que também no artigo 79.° haja a incumbência do apoio. Invocou também um argumento de carácter histórico. Seria capaz de o precisar? Devo dizer-lhe, com toda a honestidade, que isto é mesmo um pedido de esclarecimento, porque não disponho neste momento de materiais de carácter histórico em relação a este artigo. Qual o argumento de carácter histórico em que fundamenta esse seu entendimento das coisas?

Por outro lado, o Sr. Deputado José Magalhães, na linha de uma argumentação perfeitamente possível, lançou a ideia da continuidade da competência dos órgãos jurisdicionais do Estado para dirimir todos os conflitos que, em matérias relevantes se suscitem. Este princípio - diz V. Exa. - deve aplicar-se às associações desportivas. Falou também da matéria já prevista nalguns sindicatos. Penso, enfim, que devemos colocar a questão com toda a frontalidade: admite este princípio da continuidade em plenitude, designadamente sem qualquer referencia de carácter histórico concreta, em relação aos partidos políticos? É que já por várias vezes me tenho confrontado com o problema. Admite a possibilidade de recurso para os tribunais no sentido, não da jure dato, mas da modificação da Constituição? Admite que seria uma boa decisão do legislador constitucional consagrar essa possibilidade? Devo dizer que, por força dos meus deveres - e às vezes das minhas falias - de militante do PSD, já se me tem colocado o problema, ora como instrutor nomeado, ora como infractor à disciplina partidária. Já me confrontei com essa situação. O Sr. Deputado José Magalhães admite o princípio da continuidade com essa extensão?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação ao argumento decorrente do artigo 70.º, apenas pretendi não utilizar o argumento atómico, mas o argumento coadjuvante, para procurar situar uma distinção de redacção que me parece perfeitamente flagrante - não pretendi estabelecer o vigor máximo nem bater qualquer record de intangibilidade argumentativa.

Creio que realmente essa diferença resulta de uma certa preocupação - tal como V. Exa. na segunda parte da sua pergunta acabou por, de resto correctamente, referir. Há alguma distinção que, aliás, é flagrante, não vale a pena insistir excessivamente nisso, entre uma obrigação de apoiar organizações determinadas e uma obrigação de apoiar actividades determinadas. É evidente que o Estado estaria obrigado, sempre, a apoiar a prática de difusão da cultura física e do desporto - podia fazê-lo, teoricamente, através de uma actividade directa. Quem quer ter uma associação obtém-na; quem quer construir um ginásio paga-o; quem quer construir um ginásio bom paga-o caro; quanto ao resto, o Estado constrói os seus ginásios, públicos - quem quer ir ao ginásio público vai ao ginásio público, que é um bom ginásio; quem quer ir ao ginásio privado vai ao ginásio de que é capaz, em função das quotas que possa pagar. Não é obrigatório apoiar entidades privadas, não públicas, para promover bem a prática e a difusão da cultura física e do desporto. Como V. Exa. sabe, há sistemas em que o contributo das entidades privadas é praticamente nulo para a educação física e para o desporto e, no entanto, o vigor, a capacidade e os resultados dos desportistas respectivos são reconhecidos mundialmente - é um sistema possível.

Ora bem, não foi esse o sistema para o qual se foi, constitucionalmente - só que, na redacção do artigo 79.°, a importância, apesar de tudo, das organizações desportivas foi matizada. Por isso apelei para a génese do preceito e para alguma memória que o Sr. Deputado pudesse ter desse debate.

A diferença talvez esteja nisto: a preocupação, quanto ao apoio às organizações juvenis, foi expressa com algumas cautelas, para evitar alguma funcionalização. Creio que não há nenhuma razão para não se enterrar alguns desses receios e para não se estabelecer uma solução que hoje, inequivocamente, sem nenhum receio de dirigismos, sem nenhum receio de ver no apoio um veneno para as organizações desportivas, sem nenhum receio de publicização das associações desportivas, etc., permita - no caminho que, de resto, vem proposto pelo PS, no caso concreto - um "mais" em relação àquilo que o n.° 2 estabelece, porque é de um "mais" que inequivocamente se trata.

O argumento histórico vinha, sem cópia de pormenores, no sentido de considerar que não se deve recear minimamente que haja publicização pelo facto de haver apoio.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Não está em causa!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas terá estado, Sr. Deputado.

Creio que a intervenção do Sr. Deputado é o melhor sinal de que se perdeu essa memória histórica, logo perdeu-se essa prevenção, logo perdeu-se esse espírito de "estado de sítio" e logo estaríamos em condições de ver aprovada por largo consenso uma norma como esta que vem proposta. Se assim acontecesse, esta evocação, esta digressão pelo passado, teria valido a pena porque, claramente, esse passado está esquecido e ainda bem.

Quanto à questão que V. Exa. me coloca sobre se estaríamos disponíveis para considerar a continuidade ou a plenitude nos termos em que V. Exa. a situou, creio que é preciso distinguir-se, flagrantemente, entre as estruturas de inscrição obrigatória e as outras. Enquanto em relação a determinadas entidades, designadamente certas associações de cunho público ou que exercem poderes públicos, a inscrição é, na nossa lei, obrigatória; em relação a outras entidades, designadamente partidos políticos, a inscrição é libérrima e é acautelada constitucional e legalmente, como V. Exa. sabe, o que leva a que a questão possa considerar-se em termos diferentes, porque o cidadão tem meios de autodefesa e não pode ser constrangido na sua vontade, nem pode ser tolhido no exercício dos seus direitos, nomeadamente de opinião, de expressão, etc., a não ser na exacta medida em que o entenda. A autonomia e o direito de intervenção do cidadão estão acautelados constitucionalmcnte por diversos meios, não há absolutamente forma nenhuma de os tolher, a não ser que ele próprio entenda autotolher-se, auto-disciplinar-se - em certo sentido, essa é sempre uma autodisciplina, nunca pode ser uma disciplina imposta a partir do exterior. Portanto, aí se compreende que as regras legais e os poderes de entidades exteriores sofram compressão ou limitação.

Creio que é uma solução avisada; só com fortes argumentos explicitados e desenvolvidos se poderia conceber qualquer outra solução - V. Exa. não o fez, pela minha parte não o faria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.