14 DE JULHO DE 1988 761
O Sr. Vera Jardim (PS): - Penso que poderemos, a propósito do problema do recurso, dar como assente que algum consenso existe nas várias bancadas - quanto mais não seja, um consenso na dúvida. Portanto, a minha "proposta" - se assim se pode chamar, até porque agora também tenho dúvidas quanto à colocação deste artigo - é: o próprio debate nos chamou a atenção para o facto de não ser próprio apenas das associações desportivas; poderá ser, numa versão que é a minha, para as associações de inscrição obrigatória; poderá ser, numa versão mais restritiva, talvez a do Sr. Presidente, deputado Almeida Santos, para as associações no estatuto das quais a possibilidade de recurso esteja já inserta. Isto só no sentido de fazer esta chamada de atenção, ou proposta: que guardássemos pro memoriam...
O Sr. Presidente: - Ou a conciliação desses dois valores: inscrição obrigatória ou, desde que não seja esse o caso, esteja previsto.
O Sr. Vera Jardim (PS): - Exacto, que guardássemos pro memoriam esta matéria, mas com este sentido, que também queria dar a esta intervenção, de que talvez não fosse este o local próprio para a inserir, mas então que estivesse mais situado no direito de associação, em geral, e não só nas associações desportivas.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A sugestão deixada pelo Sr. Deputado Vera Jardim parece realmente de ponderar cuidadosamente, é bastante fecunda, designadamente quanto à questão dos contornos e à da inserção sistemática. Aliás, há outras propostas de aperfeiçoamento da Constituição, em relação ao regime de liberdade de associação - esta seria, seguramente, uma proposta com relevo que, como se viu, dá resposta a situações para as quais é realmente necessário alterar este quadro de dúvidas e de interrogações, de que esta acta é uma expressão, quanto a mim, bastante evidente.
O Sr. Presidente: - Entraríamos agora na parte II, relativa à organização económica, onde nos aguardam algumas dificuldades, isto é: no artigo 80.°, para o qual o CDS propõe uma profunda alteração da actual redacção, substituindo os princípios que se encontram consagrados pela ideia de "um sistema de cooperação, fundado nos direitos do consumidor, na propriedade privada dos meios de produção, na liberdade de iniciativa económica privada e na solidariedade social, orientado no sentido da promoção da justiça e do bem-estar para todos os portugueses"; no novo n.º 2 procura, de algum modo, respeitar os limites materiais das alíneas f) e g) do artigo 290.°, embora esse respeito apareça subordinado ao não prejuízo do disposto no n.° 1.
O PS, na alínea b), em vez de "sectores público, privado e cooperativo", de acordo com a proposta que faz relativa ao artigo 89.Q, refere o sector social; quanto à alínea c), elimina a referência aos "principais meios", propondo apenas "apropriação colectiva de meios de produção e solos"; introduz uma ideia "de acordo com o interesse público", que já estaria implícita mas passaria a estar expressa; na alínea e) substitúi-se a ideia de "desenvolvimento da propriedade social" pela de "protecção do sector social da propriedade". Julgamos nós que, assim fazendo, de todo o modo respeitamos os limites materiais do artigo 290.°, que estão em causa. No caso da alínea c), com uma interpretação a que chamamos evolutiva ou actualista, dado que, se tivéssemos de interpretar a actual alínea c) no sentido do que se pretende - isto é, a apropriação impositiva dos principais meios de produção e só desses -, teríamos de reconhecer que, desde a publicação da Constituição ainda não foi colectivizado um só dos principais meios de produção. Parece-nos que, assim sendo, estamos autorizados, sem violação do limite material em causa, a eliminar a palavra "dos principais", reforçando a natureza potestativa do direito e reduzindo a sua natureza impositiva. Também quanto ao "sector social da propriedade", parece-nos que a ideia da protecção não equivale, obviamente, à ideia de desenvolvimento. Mas dá protecção a esse limite material.
Quanto ao PSD, propõe a pura e simples eliminação deste artigo, em termos que porventura justificará.
O projecto do PRD suprime a alínea e), relativa ao desenvolvimento da propriedade social - na medida em que a elimina sem a substituir, viola um limite material da revisão, no nosso entender, na alínea f) substitui a ideia de "intervenção democrática dos trabalhadores" pela ideia mais soft de "participação democrática dos trabalhadores".
Está à justificação a proposta do CDS, depois estará a do PSD e a do PRD se entretanto vier alguém para proceder a esta justificação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Diria que a proposta do CDS se enquadra num propósito que conviria delinear desde já; inclui a alteração do artigo 80.º, mas inclui também modificações mais vastas na própria parte n, respeitante à organização económica. No título I, dos princípios gerais, além da modificação dos artigos 80.°, 81.° e 82.°, o CDS propõe a eliminação de todo o título II, sobre a estrutura da propriedade e dos meios de produção; propõe a eliminação dos artigos 93.° a 95.° do título III, respeitante ao Plano, propõe a eliminação do título IV, sobre a política agrícola e a reforma agrária; propõe a eliminação de um artigo no título V, sobre sistema financeiro e local, e propõe a eliminação do título VI, sobre comércio e protecção do consumidor, sendo certo que a matéria da protecção do consumidor já a deslocou para a parte I, dos direitos fundamentais.
O Sr. Presidente: - Presumindo: 20 artigos em 30.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É, realmente, de alio a baixo, Sr. Presidente. De facto, assumimos essa intenção do nosso projecto, obviamente.
É neste contexto, portanto, que se insere a alteração que propomos no artigo 80.° e que, mantendo uma constituição económica no texto constitucional, visa no entanto alterar o modelo da nossa organização económica em relação àquele que consta do texto actual. Essa alteração, o modelo que propomos em substituição do actual, não é um modelo liberal, em sentido puro - o que melhor se traduziria na pura e simples eliminação desta parte n da Constituição, o que acontece, aliás, em vários textos actualmente em vigor noutros países; não é um modelo socialista ou socializante, como entendemos que é o modelo actual do artigo 80.° e de toda a parte n; não é um modelo dirigista da economia, como o que encontrava tradução na velha Constituição da República de Weimar, na nossa Constituição de 1933 e noutros textos constitucionais. É, em nosso entender, a tradução normativa da economia real portuguesa, pelo menos da sua parte mais substancial, em termos de repercussão na própria sociedade, traduzida no volume de emprego gerado e também nos respectivos resultados; é um sistema que visa traduzir a ideia da economia social de mercado; é um sistema de cooperação assente no reco-