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960 II SÉRIE - NÚMERO 31-RC

sobretudo a ver com a questão do regime da propriedade da terra e, por via dela, dos poderes que são detidos. E devo dizer que, em relação a regime de concentração da propriedade da terra, não há na Europa similar em relação a Portugal e os únicos países onde há similitude situam-se exactamente na América Latina. O problema é o seguinte: uma coisa é o proprietário da terra ter e explorar 10 mil hectares, dos quais 3 mil de sobreiros, e o que isto tem de consequências quanto à minha concepção da terra e quanto à própria concepção de rentabilidade, de ocupação; outra coisa é, por exemplo, esses mesmos 10 mil hectares serem explorados por 100 ou 200 trabalhadores em regime cooperativo, com a produtividade dessa terra a ter de satisfazer as necessidades desse trabalhadores e não apenas da família que detém esse latifúndio. Isto tem implicações na utilização dos solos, na própria concepção da agricultura, da produção, da produtividade, completamente distintas.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Isso significa que a questão essencial não é a propriedade da terra em si, mas sim os objectivos que se pretendem realizar com essa propriedade nas suas diferentes formas.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Não, isso significa que o regime de propriedade é decisivo, não sendo necessariamente resolvido pela propriedade, se com isto se quiser dizer que nós, por exemplo, defendemos o regime da posse útil, e não necessariamente da propriedade, da terra. No entanto, no regime da propriedade privada da terra, o latifúndio tem uma classificação e um conceito precisos que não são apenas, no nosso entender, uma mera questão de maior ou menor aproveitamento, de melhor ou pior aproveitamento do recurso. Ultrapassa esse âmbito, sendo certo que, por regra, o próprio regime da propriedade latifundiária conduz ao subaproveitamento, o que não quer dizer que não possam existir excepções.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Não foi isso que aconteceu na reforma agrária, em que foram nacionalizadas empresas que não obedeciam a esses critérios.

O Sr. Presidente: - Quando entender oportuno, Sr. Deputado Rogério de Brito - não tem de ser hoje, pode ser amanhã -, há-de tentar esclarecer-me sobre o conceito de "posse útil". O defeito é seguramente meu, faço uma confusão mental diabólica, e por isso lhe peço que tenha a paciência de fazer esse esclarecimento.

Não tem de ser hoje, pode ser amanhã. Amanhã vamos continuar, pelo que lhe peço que me traga esse recado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Isto leva-nos à questão de haver casos de UCP's reproduzirem, salvo excepções, modelos e taras que já vinham do anterior. Neste ponto, apelaria ao sentido a que apelou, isto é, do conhecimento, e à interpretação científicas da realidade do País, da materialidade dos factos e da realidade social. Penso que, conhecendo nós a realidade sócio-cultural e económica do Alentejo, pretende que a reforma agrária, que tem à partida o objectivo muito claro de dar resposta a um imperativo de ordem fundamentalmente sócio-económica, possa a partir daí traduzir, materializar uma resposta ao nível da produção, da produtividade, da modernização, faz com que o latifúndio seja questionado por razões fundamentalmente de ordem sócio-económica.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Isso é uma explicação racional do sub-emprego da população alentejana.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Ao reproduzir modelos, diria que em termos científicos seria uma hipocrisia admitir, só porque se fez uma reforma agrariam, que aqueles que toda a vida tiveram como conhecimentos materiais a exploração extensiva da terra, a pobreza tecnológica da exploração, etc., só porque fazem uma alteração do regime da propriedade da terra, que é socialmente justa, se transformam em agrónomos, em técnicos de agricultura, ou adquirem formação técnica e profissional ou há possibilidade de posteriormente levar as necessárias reconversões, por via da vulgarização técnica, por via da disponibilidade de novos recursos àquela realidade que não se pode transformar...

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado, se há sítios do País em que houve uma direcção centralizada da agricultura, é no Alentejo, onde era possível conduzir uma política, e houve de facto esforços nesse sentido para o conjunto das UCP's. É completamente diferente porque está, no fundo, a remeter para os trabalhadores rurais a responsabilidade pela manutenção de um modelo económico que na realidade corresponde a uma opção política de fundo. Se há sítio onde era possível conduzir uma política de conjunto a partir de uma direcção centralizada utilizando estruturas existentes, de poder sindical, político, administrativo, era o Alentejo. Na realidade, a decisão de manter modelos agrícolas tem a ver com o próprio sistema da propriedade, tem a ver com as UCP's, tem a ver com decisões de tipo político, que estão inscritas no modelo da Constituição, e com uma determinada prática de poder, não têm a ver com a posição dos trabalhadores rurais alentejanos.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Não sei se deva interpretar isso como um atestado de menor capacidade aos trabalhadores alentejanos ou como um atestado no sentido de que eu diga que efectivamente os comunistas tinham o poder, o controlo centralizador, etc. Não me leva por aí.

Sou dos que entendem que os trabalhadores que fizeram a reforma agrária encontraram por si os seus próprios mecanismos, tiveram as dificuldades inerentes à construção de um processo de vida colectiva e democrática - isso não é fácil, mas enfrentaram-no com vicissitudes, com dificuldades, com erros. Se os recusássemos, estaríamos a ser hipócritas ou pelo menos, muito pouco científicos. Cientificamente qualquer destes processos comporta, inevitavelmente, erros, defeitos, rupturas, etc.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Aceito essa formulação mas isso também é verdade para a atitude de um empresário, e o empresário considera aquilo a que chama erros e vicissitudes acontecidos no Alentejo