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1902 II SÉRIE - NÚMERO 60-RC

gosas concepções sobre a natureza jurídica das Comunidades, sobre as características do direito comunitário, sobre a superação e inaplicabilidade das teorias do monismo, do dualismo, da transformação própria do direito internacional ao direito comunitário, sobre a tipificação do acto comunitário, sobre a natureza, o alcance e o âmbito das directivas, sobre o sentido próprio das próprias directivas, sobre o que é que seja o próprio espírito de "lealdade comunitária" na execução das directivas...

O Sr. Presidente: - É a Verfassungstreue.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É a Gemeinshaftstreue...

De facto há quem desenvolva concepções também sobre a violação das normas comunitárias directamente aplicáveis e sobre a qualificação da natureza jurídica dessa violação, ou seja, se a violação da obrigação legal deve ser sancionada, se origina responsabilidade civil ou não para o violador, e em que termos, etc. ... Sobre a matéria, a doutrina e a jurisprudência são conhecidas. Trata-se de saber em que ponto é que nós, Portugal, ficamos.

Seria útil, creio, que o PS situasse bem claramente qual o juízo que faz sobre o estado actual da aplicação do direito comunitário em Portugal, ao propor o que propõe. O relatório da Comissão das Comunidades Europeias ao Parlamento Europeu sobre o controlo da aplicação do direito comunitário (o último de que tenho conhecimento refere-se a 1986), o relatório que em nome da Comissão dos Assuntos Jurídicos e dos Direitos dos Cidadãos foi elaborado pelo Parlamento Europeu e que é o documento A20305/87, não diz ainda respeito a Portugal e Espanha, porque esse não podia ser, à data, o objecto do relatório das Comunidades. Não disponho, portanto, de uma leitura do estado de aplicação do direito comunitário em Portugal feito a partir das Comunidades. Em todo o caso, seria útil que o PS, que isto propõe, nos trouxesse um juízo ou uma leitura sobre esse estado de aplicação e sobre as consequências potenciais de uma norma deste tipo.

Em segundo lugar, estou, evidentemente, ciente de que, se se clarificar, apenas clarificar, que as directivas existem como acto típico do direito comunitário, não traremos, quanto me é dado perceber por inserção constitucional, qualquer apport significativo para a polémica jurisprudencial e política em curso sobre esta matéria. Se!

O Sr. Presidente: - É essa a ideia.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Esse contributo ex novo será nulo, na medida exacta em que, como se sabe, os actos comunitários são uma realidade não fixa, não cristalizada. A própria definição do que sejam regulamentos, do que sejam directivas e do espaço próprio de cada uma das figuras, de cada um dos actos típicos de direito comunitário, sofre alteração. Suponho que ninguém sustenta, hoje em dia, uma cristalização dessas duas noções, e, pela nossa parte, não alimentamos nenhuma ilusão sobre quais sejam as razões fundas que levam a que se procure rearranjar aprovações de directivas que substituam a aprovação de verdadeiros e próprios regulamentos. Sabemos também que esses rearranjos não poderão, em qualquer caso, conduzir a uma situação em que houvesse a supressão das directivas em benefício dos regulamentos ou o alargamento indébito do papel das directivas para evitar regulamentos propriamante ditos.

Creio igualmente que seria impossível ter-se uma consideração desta matéria situada nos quadros típicos duma certa dogmática jurídica que começa com um hino às Comunidades e acaba com um "viva a Europa", deixando de lado essa realidade que é as relações de forças existentes entre os diversos Estados membros de que a Comunidade é expressão.

Creio que alguém dizia com alguma razão, analisando a evolução da jurisprudência comunitária nesta matéria, que depois do caso Ratti as coisas não eram susceptíveis de serem lidas da mesma forma e que certas ilusões seriam sem dúvida quebradas. Por outro lado, creio que andavam bem aqueles que assinalavam que os esforços para conceber um crescendo daquilo a que alguns chamam supranacionalidade no plano normativo por vezes ocultam aquilo que é um recuo no plano decisional. Alguém sublinhava, com razão, que o processo decisional no seio das Comunidades revela que a vontade dos Estados não se extinguiu com a assinatura uús uãLãuos: os Estados mantêm ú seu poder de, só eles e através dos órgãos próprios, determinar a revisão dos tratados comunitários. São os tratados que determinam o tipo de actos normativos, o seu valor, e não há em poder das Comunidades outros meios, outras formas, que não aqueles que os próprios tratados instituem para fazer vigorar e para impor na ordem jurídica dos Estados membros' os actos típicos de direito comunitário. Essa é a situação que não é alterável a qualquer golpe de batuta mágica normativa, neste ou em qualquer outro artigo da Constituição. Em todo o caso, seria útil que o PS pudesse, pelo menos, precisar alguns dos pontos que procurei aflorar.

O Sr. Presidente: - Em todo o caso, não gostaria de transformar este debate acerca de um advérbio (embora importante) numa discussão sobre a dogmática do direito comunitário e a sua jurisprudência, aliás muito interessante. Compreendo e aprecio que todos os Srs. Deputados se preparem devidamente e revelem os seus conhecimentos nesta matéria. Aliás, depois da exposição feita pelo Sr. Deputado António Vitorino acerca da carência de conhecimentos em matéria de direito comunitário por parte de alguns dos nossos agentes do ordenamento, digamos assim, é bom que os deputados dêem o exemplo no sentido de que pelo menos eles estão bem conscientes das correntes jurisprudenciais e dos principais problemas. Muito folgo na medida em que isso demonstra a afincada preparação de que estes debates são objecto.

Todavia, não devemos perder o sentido da matéria em discussão e penso que é um pouco excessivo - mas veremos o que diz o Sr. Deputado António Vitorino - pedir-lhe que faça uma exposição sobre o princípio da aplicação directa em geral e a evolução doutrinal havida sobre o assunto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas pode ficar para sexta-feira!

O Sr. Presidente: - Mesmo para sexta-feira, Sr. Deputado! Essa exposição fica mais adequada numa conferência sobre esta matéria do que a propósito, circunscritamente, da matéria objecto do nosso debate.