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5 DE DEZEMBRO DE 1988 1901

suficientemente sensibilizado e preparado para aplicar ao caso concreto esses normativos de que poderiam beneficiar decorrentes do direito comunitário.

Aliás, gostava de precisar que a proposta é uma mera correcção técnica e dela não resultará nenhuma ilegitimação das directivas que entretanto tenham sido validamente aplicadas a Portugal, na vigência da redacção actual do artigo 8.°, pois que não houve nenhuma acção de declaração de inconstitucionalidade das mesmas - penso, aliás, que não está nenhuma pendente no Tribunal Constitucional - e naturalmente que não haveria sequer consequência, para o passado, desta precisão que é introduzida. Para futuro, é apenas uma indicação de que o ordenamento jurídico português acompanha a dinâmica do ordenamento jurídico europeu e da construção jurídica europeia.

O papel fundamental aí não cabe ao legislador da Constituição, ou ao legislador de revisão constitucional. Não é por essa via que se poderão obter os efeitos mais relevantes. Há Constituições que consagram normas de expressa assunção de restrições à soberania - um pouco ao estão do artigo 7.°-A do CDS -, e o próprio projecto do Dr. Francisco Sá Carneiro, apresentado, a título pessoal, em 1980, previa uma norma onde expressamente se fazia referência a esse aspecto: "Portugal aceita as restrições de soberania decorrentes da adesão às Comunidades Europeias" (cito de cor). O que dizemos sobre essa dimensão é que são questões que vão ter que ser assumidas na prática legislativa dos órgãos de soberania e sobretudo pela actuação dos próprios tribunais. Não há aqui nenhuma tomada de posição sobre, por exemplo, a questão da primazia do direito comunitário; sobre a questão do âmbito do conceito de normas; sobre o papel do juiz nacional como juiz comunitário; sobre o problema da inaplicação da norma interna contrária ao direito comunitário superveniente ou previamente existente; ou sequer sobre a obrigação da derrogação dessas normas internas, que decorreria para os órgãos competentes dos Estados membros de uma declaração de desconformidade de direito interno com o direito comunitário. Esse é o grande mundo das questões, que terá de ser dirimido pela prática dos órgãos de soberania, pela prática dos tribunais, pela prática do próprio Tribunal Constitucional. Portanto, penso que a benfeitoria é limitada, e nesse sentido, assim como dela não vem ao mundo nada de espantoso, também não vejo grandes riscos quanto a eventuais situações já constituídas e consolidadas no plano do ordenamento interno. Mas naturalmente, sempre se deveria entender que essas situações estão consolidadas no direito interno, até porque são constitutivas de direitos para os particulares. Mesmo que se considerasse que durante um período a aplicação da directiva com efeito directo era inconstitucional, o direito dos particulares dela eventualmente decorrente nunca seria afectado, na medida em que sempre poderiam ser accionados junto do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias os mecanismos tendentes ao seu pleno reconhecimento por parte da ordem jurisdicional comunitária.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Deputado António Vitorino pôde enunciar os propósitos do PS

neste domínio. Em todo o caso, não nos trouxe senão a preocupação de circunscrever o alcance da proposta reduzindo-a praticamente a um pequeno acerto técnico que, como teve ocasião de sublinhar, não afectaria sequer direitos de particulares dadas as especificidades e condicionalismos que presidem à vigência do direito comunitário na ordem interna portuguesa. Contudo, não deixou de enunciar, simultaneamente, todo um complexo magno de questões que têm vindo a ser afloradas a propósito deste artigo e, em geral, a propósito da problemática do direito comunitário.

Creio ser extremamente difícil que muito do debate sobre esta matéria não seja dominado pelos temas daquilo a que chamou (aliás, creio que correctamente) grande mundo do direito comunitário. Estará, porventura, bem aferido, bem assegurado, bem garantido, bem clarificado, que a vossa proposta diz respeito ao pequeno mundo e que o PS não abre, por esta via, as portas para um outro universo em que por de mais proliferam concepções escoradas tanto numa ignorância basilar das ordens jurídicas e da natureza própria dos direitos nacionais como numa maximização, empolamento, e quase diria congeminação empolativa, do que seja direito comunitário e o seu chamado primado, que conduzem a uma visão destorcida daquilo que é, na relação normal entre as Comunidades e os países membros, o direito justo, a forma de relacionamento inevitável, a partir do momento em que há um dever de lealdade comunitária.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, gostaria de esclarecer o sentido da sua intervenção. O Sr. Deputado António Vitorino, a meu ver, explicitou de uma maneira clara que o objectivo era apenas o de tornar iniludível o efeito das directivas. Obviamente, quanto ao significado desse efeito directo, quer no caso das directivas, quer no caso dos regulamentos, deixou a questão imprejudicada. E efectivamente, tal como está formulado, assim é.

Quer V. Exa., através da sua intervenção, no fundo, referir que, para além disso, não é possível tocar na questão do efeito directo das directivas sem colocar os problemas da constitucionalidade da norma interna posterior, os da invocação da inconstitucionalidade em matéria de direitos fundamentais, eventualmente postos em causa por normas comunitárias, etc..? É essa a questão que V. Exa. pretende colocar?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente, gostaria apenas que não se tomasse por simples aquilo que é complexo e que ao penetrarmos no "pequeno mundo" do PS não estivéssemos, porventura por equívoco, a abrir portas para que outros, menos bem intencionados do que seguramente todos nós, penetrassem no grande mundo a que o Sr. Deputado António Vitorino fez referência.

E, se V. Exa. me permite, concretizo nos seguintes sentidos: por um lado, quando falamos do efeito directo das directivas, estamos a tocar um dos temas mais polémicos da elaboração do direito comunitário nos diversos planos (doutrinal, jurisprudencial), no próprio relacionamento directo entre os Estados, e, por outro lado, estamos a tocar um dos temas mais dominados por alguns, não só dos ditames como, até, dos mitos e mitologias da realidade comunitária. Há quem, a propósito deste tema, desenvolva todo um conjunto de fo-