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1924 II SÉRIE - NÚMERO 62-RC

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 16 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, na última reunião tínhamos ficado na discussão do artigo 9.° Pretende algum dos Srs. Deputados pronunciar-se ainda sobre este preceito?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na passada reunião plenária, em resposta a algumas observações feitas por mim, em nome da minha bancada, o Sr. Deputado António Vitorino teve ocasião de fazer um conjunto de imputações e de aprofundar alguns dos fundamentos do texto, apresentado pelo PS, de reformulação da alínea d) do artigo 9.° da Constituição. Nessa altura, o Sr. Deputado fez algumas considerações críticas sobre a visão que o PCP tem sobre a revisão constitucional neste ponto, que eram resposta a algumas que eu próprio tinha formulado em relação à estratégia de revisão constitucional do PS. Ficou acertado implicitamente que aprofundaríamos o debate sobre essas matérias neste momento.

Tudo aquilo que o Sr. Deputado António Vitorino disse faz parte de um contencioso e de um património de debate que seria pretensioso considerar susceptível de encerrar numa reunião como esta. Em todo o caso, creio que algumas das observações que fez merecem alguma consideração imediata. No fundo, o PS alega que retirar aquilo a que chama a "carga ideológica da Constituição", eliminar aquilo a que também aqui foi chamado a "hipoteca nominalista" e suprimir as alusões ao socialismo seria uma meritória contribuição para transformar a Constituição em algo susceptível de ter reconhecimento alargado entre as forças que ocupam o espectro político-partidário português, de pacificar, em termos de opinião pública, a própria existência constitucional, no fundo, susceptível de relegitimar a Constituição ou alargar a sua base de legitimação. A isto respondi o que consta das actas. O Sr. Deputado António Vitorino entendeu replicar com afirmações que são verdadeiros pedregulhos políticos e ideológicos. Ouvimos-lhe coisas como: o PCP tem relativamente ao PS uma relação "waltdisneyana" de galo que gosta do cão (suponho que a metáfora foi esta) e que portanto não é capaz de o atacar senão na medida exacta em que, quando ele está exangue, precisa de lhe dar um suplemento de alma que lhe permita aguentar a continuação, porque, verdadeiramente, galo sem cão não é coisa nenhuma e cão sem galo também não...

Creio que é um péssimo estão de debate. Pode pensar-se o que se pensar da estratégia de revisão constitucional do PCP, mas não se pode deixar de reconhecer que ela é coerente e que visa preservar, na máxima extensão possível, aquilo que é o património constitucional da revolução democrática do 25 de Abril. Essa nossa recusa de considerarmos ideias derimidas, os ideais pelos quais nos batemos e, mais ainda, que obtiveram consagração constitucional com o voto do PS num determinado momento histórico, essa coerência, essa persistência não nos pode ser censurada senão com fundamentos alargados e com uma demonstração, uma evidenciação de que a operação proposta pelo PS colhe, que ela é susceptível de produzir os efeitos que se reclamam, que não é apenas mais uma tentativa inútil de satisfazer guias que não se aplacam com isso, mas que, pelo contrário, se reforçam; que não é mais uma cedência susceptível de reforçar aqueles que sempre se opuseram à Constituição que, coerentemente também, batalham contra ela por todos os meios e que, neste momento, desenvolvem uma estratégia (em nosso entender, perigosa) de semantizar, de incumprir a Constituição e de a violar sistematicamente para a destruir o mais que possam. Dizer que o PCP se opõe por uma relação perversa, de galo/cão, parece-me, francamente, que é fazer derivar uma discussão extremamente grave para uma verdadeira anedota, para um verdadeiro desenho animado. Aquilo que o PS aqui tem de provar, ou deveria provar (talvez tenhamos uma ambição excessiva), é que se pode prescindir sem desvantagens de tudo aquilo de que o PS entende poder prescindir.

O Sr. Deputado António Vitorino, no fluxo das suas alegações, dizia também: a espada do PSD é mais livre do que a do PS, quase sugerindo que nos congratulemos pelo facto de a espada do PS cortar o que corta, mas apenas o que corta. E nós entendemos que tal visão, sem dúvida própria de uma máquina cortadora de fiambre, não é, seguramente, a mais adequada para encarar a preservação do texto constitucional. Não conseguimos congratularmo-nos com o facto de, olhando a proposta do PS e olhando a proposta do PSD, podermos dizer: "São diferentes." Porque devo dize-lo à puridade: são diferentes! Mas isso não basta: é que também coincidem demasiado em demasiados pontos.

Procurei sublinhar durante o debate em que é que consistiam as diferenças, procurei sublinhar que, ao aceitar esta proposta, o PSD não deixaria de o fazer (não sabemos se e em que termos o fará) com uma certa reserva mental, com uma certa aceitação provisória, com uma certa aceitação com condição. Lembremos a declaração feita pelo Sr. Deputado Pedro Roseta de que o ponto de vista do PSD não é bem este e a revelação de que o PSD aceitaria (não sabemos ainda se aceitará e em que termos) uma proposta como a do PS, não abdicando da sua concepção e da sua perspectiva nesta matéria. Tal como em relação à revisão constitucional de 1982, o PSD aceita o mais possível, recebe o que o PS lhe dá, sem renunciar às suas concepções nessa matéria e sem renunciar à possibilidade de um aprofundamento ulterior daquilo que agora não consiga obter.

E mais ainda: como o PSD faz tudo isso tendo em atenção o quadro de poder, como o PSD faz tudo isso tendo em atenção não só a revisão constitucional como tal mas outras coisas [por exemplo, já imagina uma próxima revisão constitucional, surda, a fazer no Tribunal Constitucional (TC) e pela via da legislação ordinária consentida ou passada no TC], a opção que o PS nos coloca é, a todos os títulos, infrutífera num domínio, perigosa noutro domínio, e acima de tudo preocupante quanto à própria definição que faz do que deva ser a Constituição da República Portuguesa.

Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a opção feita pelo PS, aqui trazida e sustentada pelo Sr. Deputado António Vitorino, constitui uma opção decorrente de uma funda alteração de concepções. Nestes anos