20 DE OUTUDRO DE 1994 225
velmente, o que nos é pedido é que apuremos se algumacoisa existe a nfvel constitucional que rnereca ponderacäono sentido de uma alteraçäo.
Creio que essa ponderacâo tern de ter em conta nãoapenas urn conceito jurisdicista, ou seja, a análise do quadro legal dos seus desenvolvirnentos, das suas carências,urn pouco na dptica que utilizei para 0 analisar agoramesmo, mas tambm as profudas mutaçoes conceptual,social, cultural nas atitudes sociais perante as coisas queestarnos a discutir.
Ora, o que é proprio dos anos 90 e que é tAo diferentedos anos 70— feizrnente! — é a radical mudança dessasatitudes.
Por urn lado, consumou-se irreversivelmente a dessacralizacAo do casarnento como instituição e banalizou-sea ideia do conceito aberto de famflia sem o travo e sem olabéu que foi próprio de todo urn.. ciclo histórico muitolongo e corn projecçöes particularmente degradantes nósdireitos dos vários palses, ocidentais ou não.
Por outro lade, acentuou-se a laicizaçAo, acentuQu-se adessacralizaçAo geral e nina certa projecçAo nas sociedadesmodernas de urna atitude arreligiosa, quando nAo mesmoantirreligiosa, e logo propicia a eliminaçAo do predomfnioda hegemonia de certas concepçöes: institucionalizou-se ebanalizou-se o divdrcio, independentemente cia convicçäo,da atitude e da prática reigiosa das pessoas; multiplicaramse experiências de carácter pié-rnatrimonial, pds-matrimonial; foi rejeitada a prdpria ideia de uniAo de facto cornoo ilnico modelo de exercfcio livre, de urna forma de convivência diferente da conjugalidade burguesa, corno tal, talqual era caricaturada na literatura prdpna e nas discussöespolitico-ideolcigicas; acentuararn-se novas fonnas de vivência e de convivência, e mesmo a afirmaçAo da solidAocomo atitude não incompativel corn a famifia mas incornpativel corn o casamento, certamente, bern como corn auniao de facto; multiplicararn-se, de vários quadrantes, asteses a que a Sr.a Deputada Odete Santos, ironicamente, agoraaludia como os apelos a abstinência, bern como as teses abstnisassobre o divórcio e a penalizacAo do divdrcio.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Não fui eu que disseisso. Foi o cardeal Ratzinger!
0 Sr. José MagalhAes (PS): — Sim, foi o cardealRatzinger — en sd!
No plane das nossas sociedades, generalizaram-seformas de proteccão das uniôes de facto, incluindo emPortugal. A tentativa — muito medida — contida na revisäodo Codigo Civil (e o Sr. Deputado Almeida Santos, 1cm-bra-se, fotograficarnente, cia como foi medida essa tentativade protecçAo, na parte do direito sucessdrio, como foi
B 6 af que cliscordo cia Sr. Deputada Margarida SilvaPereira, porque acho que temos urn contrato corn osPortugueses (carla qual tern o seu, que assumiu livrernentee cumpre-o, melhor ou pior — serernos julgados per isso!),mas nao creio que estejamos amarrados a nenhum contratoretrdgrado ou de irnobilismo.
Neste ponto, creio que temos as. mAos livres e nAoferiremos a cônsciência social se estivermos abertos àquioque se passa na sociedade e as mudancas culturais, designadamente em relaçAo a nova atitude relativarnente aprotecçAo dos flihos nascidos fora do casamento. Isso,quanto a mim, tern bastante esteio constitucional, pelo quenAo carece de obras. B. quanto a fendmenos como a adopçAo em que a ideia de que <
A Sr.a Margarida Silva Pereira (PSD): — Sr. Deputado, desculpe interrom-lo, mas queria dizer-Ihe que, setivesse assistido ao debate de ontern, teria verificado quea tinica coisa contra a qual me estou a rebelar — e deixoisto bern claro —6 a equiparação corn todos os efeitos, econcretizo: regirne de bens e regime sucessdrio, cornconcretizaçao plena e equiparaçAo corn todos os efeitos,da uniAo de facto as situaçöes farniliares normais, tradicionais. Preferiria riscar aqui a palavra normal, porque,francamente, nAo me agrada. Alias, a forma como aSr.a Deputada Odete Santos acaba de equacionar umaproposta de introduçAo de referência a uniAo de factosuponho que será algo que ternos em aberto sobre a mesa.
Sc tivesse assistido ao debate de ontem, ter-se-iaapercebido de que o problema foi este: foi o saber se, defacto, a união de facto, scm uma caracterizaçao jurfdicamais apurada ou mesmo o continente dessa caracterizaçãojurfdica, pode implicar urna situaçAo de regime de bansidêntica a do casarnento, pode irnplicar urn regime sucessorb idêntico ao do casarnento e pode.irnplicar uma postura do direito português em rnatéria de direitos e deveressobre as criancas que existem, flihos ou nAo do casal emuniAo, igual aquela que decorre do casarnento — tAo-soisto.
0 Sr. José MagalhAes (PS): — Tern side precisamenteesse o ponto central de todos os debates que fizemos, emsede de revisAo constitucional ou fora dela, sobre estarnatéria. NAo tive o prazer de auscultar o detalhe do debate,mas essa 6, scm dulvida, a árvore das decisöes neste dominio, tal qual a discutimos em 1989 e tal qual a discutirnosem outras circunstAncias. bistOricas aqui, na Assembleia.
Precisamente por isso, Sr. Presidente, entrando no centrodas observaces que pretendo fazer, gostava de dizer quecreio que a questao que se nos coloca 6 a de saber se aformulacAo adiantada 6 operacional e susceptfvel de introduzir urn valor acrescentado a ConstituiçAo, scm depreciaçAo nem problemas adicionais, ou nao. D sse ponto devista, creio que os problemas suscitados são relevantes epara os quais as formulacôes propostas nAo dAo respostaadequada e cornportulvel subscritfvel.
Ha duas coisas que poderiam fazer-se aqui corn urncarácter inteiramente novo: uma, era suprirnir o limite quedecorre do n.° 1 e dizer