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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Seguindo na minha argumentação, Sr. Presidente, gostaria de colocar a questão seguinte: uma vez que a possibilidade legal de nacionalização é conferida quer nos termos do artigo 62.º (que, conforme defende o PSD, deve ser o único a prevalecer na Constituição), quer nos termos do artigo 83.º, que o PS aparentemente pretende que se mantenha, não vemos por que razão o movimento inverso não é possível.
De resto, na esteira daquilo que, a outros títulos, o Sr. Presidente tem referido (e, convenhamos, já tive a oportunidade de fazer uma vénia à sensatez dessa observação), pode colocar-se a seguinte questão: se se permite que um governo legitimado democraticamente possa deitar mão de uma política de nacionalizações, por que é que não o poderá fazer na mesma exacta medida numa política de reprivatizações?
Esta é a questão que se deve colocar aqui, sem complexos e de uma forma desassombrada. Porque se é assim para uma política de nacionalizações, por que é que não poderá ser assim para a política inversa, seja em relação ao mesmo governo ou a um governo que lhe suceda?
Com toda a lealdade, parece-nos que esta questão é demasiado importante e que não se compadece com argumentos um pouco estafados, que só se podem estribar numa visão conservadora e de tentativa de não modernizar a Constituição naquilo que, verdadeiramente, do nosso ponto de vista, deve ser modernizado.
Todos nós sabemos, alguns melhores do que outros - com certeza que, nomeadamente, os Srs. Deputados Barbosa de Melo e Vital Moreira, por razões óbvias, conhecem, seguramente, melhor do que eu - a evolução histórica que o tratamento constitucional destas matérias teve; porém, hoje em dia, o problema deve colocar-se com toda a frontalidade nestes termos: se a nacionalização é permitida como uma liberdade constitucional perfeitamente normalizada (apenas não normalizada em relação à justa indemnização, matéria que discutimos há pouco) em termos de lançar mão do instrumento, por que é que o movimento de sentido contrário não é assim também?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, esta norma, seguramente, divide, hoje, menos do que ontem e dividirá menos amanhã do que hoje.
Não nos esqueceremos que esta norma, aprovada pelo PS e pelo PSD na revisão constitucional de 1989, foi reinserida e, portanto, é verdadeiramente herdeira do famoso artigo 83.º.
O PS tinha, nessa revisão constitucional, como é público e notório, propostas tendentes a criar regimes que, através das chamadas leis paraconstitucionais, permitissem sempre que a decisão sobre esta matéria fosse mais qualificada e decidida por uma maioria mais exigente que qualquer maioria restrita, e essa proposta foi rejeitada.
A proposta que foi consagrada em termos constitucionais é aquela que faz depender os actos de reprivatização, os tipos de bens aludidos no n.º 1 do artigo 85.º (porque quanto às privatizações de pequenas e médias empresas indirectamente nacionalizadas situadas fora dos sectores básicos da economia, como se sabe, o regime é distinto desde há bastante tempo), a uma maioria alargada. E isso tem uma justificação.
A Constituição, em relação a outros tipos de grandes actos, procura que sejam maiorias reforçadas, maiorias alargadas, a praticar decisões desse tipo.
É uma filosofia razoável e o preceito é herdeiro de umas histórias, que o PSD bem conhece e que não desperta, hoje, seguramente, as emoções que despertou no passado.
Portanto, pela nossa parte, sentimo-nos confortáveis com este artigo. Não nos incomoda termos de ser acompanhados para tomar estas decisões.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, para além de toda a retórica possível, como há pouco referi, todos sabemos que este artigo é herdeiro de um outro e integra-se num capítulo, que, por sua vez, é herdeiro de formulações diferentes que foram evoluindo ao longo do tempo. Em 1989, foi possível reduzir isto para uma lei-quadro, quando antigamente nem isso era possível, havia uma irreversibilidade. Mas conseguiu reduzir-se.
A questão que, com muita clareza, coloco ao Partido Socialista - muito embora compreenda perfeitamente que o Partido Socialista gostasse de reservar a sua posição para uma outra altura, mas, mais tarde ou mais cedo, terá de ser confrontado com esta questão - é esta: se, hoje em dia, o Partido Socialista entende que a nacionalização é um acto de gestão política perfeitamente normalizada para um qualquer governo, por que é que a desnacionalização não o é?

O Sr. Presidente: - Mas é, Sr. Deputado! Só para essas. O regime geral é de livre privatização.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, então, se quiser, por que é que a desnacionalização não é para todas?!

O Sr. Presidente: - Essa é uma norma transitória para o passado! O regime geral é de liberdade de privatização.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A pergunta está feita. O Partido Socialista percebeu perfeitamente a questão. Se me quiser responder, responde; se não quiser, não responde.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, a resposta foi dada e, aliás, estou de acordo com ela. Por isso citei tanto a história do preceito. É que, verdadeiramente, o preceito ficou nesta sede porque repugnou substituir o princípio da irreversibilidade das nacionalizações efectuadas após 25 de Abril de 1974 por uma norma que, inserida nas disposições finais e transitórias, cumprisse a função que esta cumpre.
Mas, verdadeiramente, todos conhecemos qual é o regime geral, por um lado, quais são os seus limites e, também, as suas facilidades, e, quanto a este regime, também sabemos qual é o seu alcance no presente contexto histórico.
Portanto, este facto não se ajusta mal ao actual corpo da República.