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das leis. Os despachos dos ministros são importantes. Por vezes um despacho de um ministro permite fazer uma ponte, fazer uma estrada, não é preciso uma lei para fazer a estrada, mas a verdade é que as leis tratam da matéria mais sensível, que é aquela que diz respeito, repito, à vida das pessoas.
Por isso é o acto de governo mais responsabilizante e também o mais difícil, mas também é o mais importante e o mais nobre de todos os actos políticos.
Ora, essa responsabilidade é aqui, nesta Casa. Nesta casa é que se fabricam as leis, é aqui a forja que bate o ferro quente das leis que as transforma em normas de conduta para as pessoas: "Não podes fazer isto" ou "És obrigado a fazer aquilo".
Isto devia fazer com que os cidadãos tivessem, pelos parlamentos em geral, em todas as democracias, e pelo nosso também, uma atitude de veneração e de respeito que nem sempre existe. E por que é que nem sempre existe? Pela razão simples de que o Deputado é um representante de quem o elegeu, e quem o elegeu considera-o não apenas como um representante seu mas como estando ali para exprimir a sua vontade. Mas como os Deputados têm de se mover de acordo com o interesse geral, não podem atender a interesses privados, a interesses regionais, a interesses locais e, por vezes, desagradam a muita gente.
E quer o juiz quando decide, quer o legislador quando legisla, por vezes, é para criar constrangimentos. O juiz manda as pessoas para a cadeia, obriga a pagar indemnizações, obriga a cumprir as obrigações; o legislador diz aquilo que se não deve fazer, porque o que fica fora da lei é o espaço da liberdade individual. Mas a lei diz, fundamentalmente, não só aquilo que se não deve fazer mas também aquilo que se deve fazer para garantir os direitos e os interesses das pessoas.
Mas, de um modo geral, a lei não diz coisas simpáticas, muitas vezes diz coisas antipáticas às pessoas. E como as leis são, em regra, feitas no Parlamento as pessoas acham que os constrangimentos que as leis lhes impõem são da responsabilidade dos Deputados e que as leis podiam ser evitáveis. Para quê esta lei, a criar complicações? Para quê pagar a portagem? Que diabo, não era melhor passarmos sem pagar a portagem?! É claro que era! Para quê pagar impostos? Bom, se não houver impostos, não há estradas, não há funcionalismo público pago no fim do mês; não há hospitais, não há escolas construídas pelo Estado. Portanto, os impostos são necessários mas são dolorosos para as pessoas. Mais um constrangimento!
Portanto, o Parlamento não só faz coisas que nem sempre são agradáveis para as pessoas, como as pessoas se não revêem na maneira como o Parlamento as faz. Têm tendência para dizer: "Se fosse eu, fazia melhor. Se eu lá estivesse não cometia este disparate. Eu teria feito uma lei muito mais justa". A lei mais justa é a que lhe fosse, para si próprio, mais agradável, como é óbvio.
Por isso, de um modo geral, tende-se a culpabilizar o Deputado por tomar atitudes e fazer leis que não são tão boas como as pessoas julgam que seriam aquelas feitas por elas próprias, porque não avaliam a dificuldade de fazer uma lei nem se colocam do ponto de vista do interesse nacional, do interesse geral.
Mas essa relação de mandato entre o eleitor e o Deputado faz com que o eleitor seja muito mais exigente para o Deputado do que é, por exemplo, para um membro do governo, porque um membro do governo não foi escolhido directamente por ele, é escolhido pela Assembleia e pelo Presidente da República. Mas o Deputado foi ele que o escolheu e, portanto, ele tem que lhe dar contas. "Fui eu que o lá pus, não foi para fazer leis destas, foi para fazer outras!" Isso torna a relação entre o eleitor e o Deputado uma relação de algum modo conflitual, ou pelo menos uma relação difícil.
Por outro lado, o Parlamento é o único órgão de soberania que funciona em sistema de porta aberta. Nós trabalhamos com os jornalistas, com as televisões a filmar-nos; cada vez que metemos o dedo no nariz, lemos o jornal, fazermos um bocejo ou nos distrairmos a conversar com o colega do lado, é nesse momento que a comunicação social nos filma. Porquê? Porque só a pequena anormalidade também aqui é notícia. A normalidade não é notícia em momento nenhum e em lugar nenhum! Dar notícias ou filmar o que é comum, o que é frequente, o que é normal, o que é feliz, o que é bom? Isso não é notícia! Notícia é o que é ou o que está fora do normal. Ou porque é uma desgraça e é preciso filmar as desgraças todas, ou porque é ridículo e é preciso surpreender o ridículo, ou porque o Deputado não está a cumprir o seu dever e é apanhá-lo no momento da falta. E esta atitude causticante, digamos assim, da comunicação social sobre o trabalho dos Deputados faz com que a imagem do Parlamento não seja, por vezes, tão positiva como é a imagem dos governos ou a imagem do Presidentes da República.
O Presidente da República tem um papel representativo, um papel importante em todo o caso, mas não é um papel que pode criar problemas à vida das pessoas, pelo contrário, pode resolver alguns, mas criar problemas, propriamente, ele não pode ou não deve e não o faz.
O governo é quem tem o caixa do tesouro, é ele que tem o dinheiro, é ele que pode fazer coisas bonitas, autorizar a ponte, autorizar a estrada, pode aumentar os vencimentos, pode corrigir defeitos, pode fazer muita coisa porque tem meios para isso. O Parlamento só faz as leis e só fiscaliza o governo e a Administração Pública, mais nada.
Daí a razão de ser desta apreciação mais negativa do que positiva, em regra, em relação aos parlamentos em geral.
Por outro lado, os parlamentos existem na base da figura da chamada democracia parlamentar, da democracia pluralista, partidária, que é um sistema democrático em que o povo, por ser muito numeroso e estar muito distante dos locais onde se tomam as decisões, precisa de escolher representantes seus, delegados seus para os representarem. Então, o povo todo está aqui representado nesta miniatura que é a Assembleia da República. Somos 230, mas é como se fossemos os 10 milhões de cidadãos portugueses, ou os 6 ou 7 milhões de eleitores, que é o universo eleitoral do nosso país.
Mas exactamente porque somos um pequeno número a representar um grande número, esse grande número tende, já o disse há pouco, a reivindicar algumas das prerrogativas que tradicionalmente as pessoas delegavam nos parlamentos.
Os parlamentos começaram por surgir numa altura em que as nações eram muito grandes, no sentido de que era muito difícil ir de um extremo a outro extremo delas, as comunicações, quer por terra, quer por telefone, quer por telégrafo, até antes disso, eram muito difíceis, o que significava que o espaço nacional era um espaço muito grande em termos de transportes e comunicações.