também para corrigir aquilo que o Tribunal Constitucional foi fazendo, interpretando a Constituição, da forma que não é, porventura, a mais desejável.
Mas, voltando à questão "que garantias?", uma coisa é certa, dizia, a alteração do n.º 3 do artigo 33.º só pode significar que vão ser possíveis garantias de tipo diplomático porque, quanto às garantias jurisdicionais, já a suficiência delas resulta da jurisprudência do Tribunal Constitucional. Quanto a essas, não há dúvida alguma, se houver uma sentença judicial ou um despacho do juiz, irrevogáveis, que, antecipadamente, comutem a pena do acusado. Ou até, por exemplo, se num qualquer Estado existir um mecanismo semelhante ao do artigo 16.º, n.º 3, do Código Penal, que permite ao Ministério Público propor a pena até um certo máximo e modifica a competência do Tribunal - e essa é uma decisão irrevogável -, de maneira que a condenação não pode ultrapassar... Bom, garantias dessas, já o Tribunal as considera suficientes.
Portanto, a abertura às garantias há-de, naturalmente, entender-se como uma abertura às garantias de tipo diplomático.
Sobre o nível em que as mesmas garantias se devem colocar, aí é que há, de facto, gradações possíveis. Porventura, uma garantia diplomática, expressa na forma de uma mera declaração unilateral, é, provavelmente, diferente de uma garantia dada pelo Estado, no quadro de uma convenção multilateral, em que há uma assunção recíproca de direitos e deveres nesta matéria, possivelmente.
Por aquilo que ouvi, será a lei a definir as garantias. Portanto, a lei definirá. Mas, isto não foge a que, em cada caso, tenha que se analisar o tipo de garantias. É-me realmente muito difícil... Diria que, a avançar-se neste caminho - e isto é naturalmente da responsabilidade de VV. Ex.as e dos vossos pares -, haveria de ter-se a preocupação de procurar objectivar, tanto quanto possível, o tipo de garantias suficientes, ainda que de garantias diplomáticas, eliminando o mais possível a álea da apreciação dos casos concretos. É que, realmente, em Portugal, apesar de tudo, nestas duas situações que, obviamente, não agradaram aos Estados requisitantes e em que o Tribunal Constitucional foi protagonista, as coisas não correram, nesse plano - permitam-me este aparte -, mal de todo porque assim como foi recusada a extradição para a China foi também recusada a extradição para os Estados Unidos da América.
Portanto, é visível, é claro que, do ponto de vista do Estado português - neste caso, era uma instância jurisdicional mas poderia ser o Governo -, não houve qualquer avaliação diplomática das garantias dadas por cada um dos Estados. E, de facto, diria que o desejável - respondendo ao Sr. Deputado António Filipe - é que a formulação das garantias fosse de molde a tornar esse requisito o mais objectivo possível e o mais possível eliminador destas situações, sempre complicadas.
Passo a responder ao Sr. Deputado Calvão da Silva, mas continuo ainda com a pergunta do Sr. Deputado Barbosa de Melo. É que a pergunta que o Sr. Deputado Calvão da Silva faz também tem que ver com os elementos de flexibilização da jurisprudência do Tribunal Constitucional, agora no sentido de flexibilizá-la para alargar os casos em que não seria possível a extradição, se bem entendi, isto é, se o Tribunal entendeu proibir a extradição para países que, na prática, têm prisão perpétua.
Embora esta situação, de facto, nunca tenha sido colocada, não estranharia que a posição do Tribunal se centrasse muito em torno do direito concreto, do direito tal como ele na realidade opera nos casos e, portanto, que se não bastasse com a mera afirmação abstracta numa norma de que não há prisão perpétua.
Mas, a situação é muito complicada, é uma situação diferente. Esta situação, no fundo, tem a ver com a extradição para países onde não são asseguradas as garantias de defesa. É que se a lei não prevê a prisão perpétua mas pode prever medidas de segurança indefinidamente prorrogáveis, por exemplo, ou, então, nem sequer isso prevê, mas sabe-se que as pessoas são presas e são esquecidas nas masmorras ad aeternum. Bom, neste caso, é mais complicado, diria que até seria mais difícil ao Tribunal estender a proibição de extradição a esses casos, na lógica dos acórdãos. E isto porque os acórdãos que o Tribunal Constitucional tirou nunca abordaram esse ponto específico das garantias. Abordaram, sim, um outro ponto, que vai ao encontro da pergunta do Sr. Deputado Barbosa de Melo, ao admitirem que o direito aplicável ao caso fosse estabelecido por via jurisprudencial. Não por acaso, essa consideração teve lugar no acórdão que versou sobre o requerimento de extradição dos Estado Unidos da América do cidadão brasileiro.
É que aí, em boa parte, o direito é jurisprudencial e, por consequência, o Tribunal seria cego para a realidade jurídica do país requisitante se não considerasse essa situação. E, justamente, isso foi dito. Há um ponto em que a dimensão jurisprudencial do direito também é considerada, ponto esse que, de momento, não localizo, mas que está realmente formulado algures, em outro arresto.
A configuração dos casos que os tribunais decidem influenciam sempre, quer se queira quer não, as normas do caso. As generalizações são sempre arriscadas, isto é, a extrapolação de uma norma geral, a partir das normas do caso, que os tribunais formulam, é sempre arriscada.
Portanto, não me atreveria a dizer que esteja de todo excluída qualquer margem de flexibilização na jurisprudência do Tribunal Constitucional. E isto porque são os próprios casos que obrigam os tribunais a reflectir, a "acertar o rito", a corrigir, a moderar, porventura, expressões e afirmações que foram, aqui ou além, excessivas, a rever situações que, enfim, foram consideradas em termos demasiado amplos.
Sublinharei, em todo o caso, que a consideração expressa do Direito Internacional Público, por parte do Estado requisitante, como direito do caso, não foi, de facto, considerada nos acórdãos do Tribunal Constitucional.
Há uma pergunta que nenhum dos Srs. Deputados me formulou, mas que, mentalmente, formulei, enquanto os ia ouvindo. É que, com tudo isto, tem também a ver quem avalia as garantias que o Estado requisitante oferece. Permitir-me-ia trazer este tópico também para a reflexão de VV. Ex.as se, porventura, ele não for de todo falho de sentido e que formulo nos seguintes termos: quem avalia essas garantias? Se são garantias de carácter diplomático, deve avaliá-las um tribunal? Ou deve a avaliação dessas garantias ficar na área da decisão política sobre a extradição?
Claro que se esta pergunta fosse colocada no quadro da elaboração de uma lei ordinária, haveria o problema de saber se isso era possível, se, no fundo, a reserva do Governo