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APPENDICE Á SESSÃO DE 18 DE FEVEREIRO DE l888 514-E

O sr. Silva Cordeiro: - Está quasi a dar a hora, sr. presidente. São por isso muito breves as considerações que vou fazer, reservando-me entretanto o direito de amplial-as na proxima sessão e apresentar as convenientes propostas.

Começo por chamar a attenção do illustre auctor do projecto, para aquelle artigo que permitte ás sociedades civis constituirem-se sob a fórma commercial e portanto sob a fórma de anonymato.

O projecto sujeita aos preceitos e formalidades da lei commercial todas as sociedades que queiram gosar d'aquella faculdade, excepto quanto á fallencia e á jurisdicção. Quer isto dizer que, quanto aos prasos de prescripção, vigorará tambem para ellas a lei commercial? Se assim é, e não se póde em boa hermeneutica dar outra interpretação ao artigo, que é restrictivo, decretam v. exas. uma providencia arbitraria, iniqua e altamente perigosa, que levará muitas associações civis a constituirem-se sob a fórma de sociedades anonymas, só para aproveitarem a prescripção commercial que, como todos sabem, é mais favoravel ao devedor e sempre mais breve do que a prescripção civil.

O sr. Oliveira Valle: - Que artigo é?

O Orador: - É o artigo 160º, que no projecto do sr. Beirão vinha já assim redigido:

(Leu.)

É evidentemente um lapso que a commissão não corrigiu e que n'uma segunda revisão deve merecer-lhe particular solicitude. Nem este ponto é de tão pequena importancia, como a alguns se afigura. (Apoiados.)

É sabido que muitas associações de caracter puramente civil, como, por exemplo, as que só dedicam á exploração de minas, á compra e venda de terrenos e a outras operações que no commercio são accidentaes, procuram revestir a fórma commercial, para poderem dividir o seu capital em acções, contrahir emprestimos, emittir obrigações nominativas ou ao portador, dar acções beneficiarias a socios benemeritos e empregar outros expedientes e processos que a lei civil, por si só, não reconhece nem garante.

A faculdade que o projecto lhes dá de revestirem a fórma de companhias anonymas, do sociedades de commandita ou de nome collectivo, é uma lei de favor até certo ponto rasoavel e justa, porque satisfaz uma antiga aspiração de muitas corporações, collocando-as fóra da esphera do direito commum; mas é tambem um principio perigoso, desde que a excepção se converta em privilegio contra os credores de taes sociedades, que outra cousa não é permittir-lhes que se defendam nos tribunaes dois com a prescripção commercial.

Ora é precisamente isto o que o projecto permitte.

Se o sr. ministro da justiça quer equiparar taes corporações ás sociedades anonymas no que respeita aos prasos da prescripção commercial, tão breves e tão suaves para o devedor, vá então mais longe, seja logico e seja coherente, dando aos credores uma garantia efficaz na legislação relativa a fallencias, e estabeleça, como fez a legislação brazileira de 1882, o principio de que todas as sociedades constituidas sob a fórma anonyma, são para todos os effeitos consideradas commerciaes, seja ou não commercial o seu objecto ou o seu fim.

É tambem este o systema da legislação belga, que na lei de 18 de maio de 1873 reconhece o caracter mercantil a quaesquer associações momentaneas. Se, pelo contrario, s. exa. entende que aquellas associações não devem ficar sujeitas, quanto a fallencias, á legislação commercial, como parece deduzir-se do projecto, e quer portanto applicar-lhes os principios do direito commum no caso de insolvencia, regule-as pelo mesmo direito em materia de prescripção e terá assim dado aos credores uma garantia, sem privar as sociedades civis das vantagens que lhes proporciona a fórma do anonymato. Nem insisto mais n'este assumpto que me parece...

O sr. Alves da Fonseca: - Essa questão foi levantada já no seio da commissão.

O Orador: - Não sei o que se passa nas commissões de que não seu membro, principalmente quando ellas não publicam as suas actas, o que aliás, e va sans dire, não me pareceu muito correcto, tratando-se do projecto de um codigo que vae vigorar indefinidamente e que ámanhã vae ser digerido no ventre pantagruelico da nossa casuistica.

(Interrupção do sr. Vicente Monteiro, que não se ouviu)

O Orador: - V. exa. lembra-se de certo do que disse Napoleão I quando os advogados começaram a commentar o codigo civil: «Lá me estragaram o codigo». Pois, para que não aconteça o mesmo com este codigo, para que a analyse meticulosa dos jurisconsultos não venha a estragar o n'um esmerilhamento chinez de infinitas e abstrusas hypotheses, como fazia certo professor de direito que incluia os peixes na classe dos animaes ferozes, (Riso.) para que a chicana dos advogados, servindo-me de uma palavra que é do jargon forense, posto que não seja bem parlamentar...

O sr. Oliveira Valle: - É até muito parlamentar, empregada pelo sr. visconde de Seabra.

O Orador: - Para que o espirito de chicana não venha a pôr escuro e torto o que de si é claro e direito, é que eu desejava que a commissão resolvesse esta questão, visto que a discutiu e que tivesse publicado as suas actas que tanta luz projectariam no debate. Fallo com esta liberdade, sr. presidente, porque vejo a camara convertida n'um gremio de jurisconsultos, onde o que se diz nem sequer chega a ser um discurso, porque não passa do uma palestra amavel, mas levantada e seria, como devera ser as discussões d'esta natureza. Demais reparem v. exas. n'aquillo (apontando para as lançadas vazias da opposição). Olhem para aquelle deserto onde, ha um mez esbravejava a paixão politica em apostrophes violentissimas e onde a fome do poder congestionava as cabeças e punha nos labios crispações epilepticas. Para onde foram aquelles estoicos zeladores da liberdade? Onde estão aquelles doentes sagrados da morbus comitialis que ha pouco juravam pelos seus manes combater à entrance o governo até o derribarem gastar o ultimo cartucho n'essa campanha uma campanha de furor, feita do gestos theatraes a murros nas carteiras e phrases carnavalescas? Vê-se, sr. presidente, que a cartucheira não vinha bem sortida e a polvoreira... trazia só polvora secca, como a d'aquelle rei de opera buffa que attribuia, tudo ás manobras do seu exercito, inclusivamente os netos que lhe appareciam. (Riso.)

Pois eu receio que esta rapida mudança de tactica n'aquelles arraiaes seja tambem o effeito das manobras de algum accordo que o sr. ministro da fazenda traga por ahi escondido nas dobras da sua pasta. Vá longe o agoiro, mas fique consignado aqui o meu protesto contra tal politica de accordos que tudo desaccorda e nos enxovalha a todos, fazendo crer lá fóra que valemos tanto uns como outros.

(Interrupção do sr. ministro da justiça que não se ouviu.)

Como v. exa. vê, apparent rari mantes in gargite vasto.

Pois faz isso muita honra ao sr. Julio de Vilhena que desde o principio nos tem acompanhado, prestando a este debate toda a illustração do seu estudo que é grande e variado, e toda a inspiração do seu criterio que ainda e maior. Fez hontem s. exa. observações e propostas a que terei de referir-me. Folgo por isso de o ver presente, porque é sempre com repugnancia que me vejo obrigado a alludir a um orador ausente. Uma das questões que s. exa. discutiu com o sr. relator, foi a de se prohibir ou facultar a emissão de acções beneficiarias. Nem me sorri a proposta de s. exa. que é larga de mais para por ella se introduzir a agiotagem da bolsa, nem me parece liberal a solução do projecto, tão habilmente defendida ha pouco pelo sr. Vicente Monteiro.

Comtudo, como a hora vão muito adiantada, explanarei
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