APPENDIOE A SESSÃO N.° 56 DE 18 DE ABRIL DE 1896 978-G
propriedade, que o governo portuguez havia calcado aos pés de uma maneira inqualificavel; que, quando os toes decretos foram publicados, se elle estivesse no ministerio havia fazer o que fez agora; que se elle começava por Portugal as suas reclamações a favor dos subditos inglezes despojados por diversos governos, era porque o governo portuguez havia procedido de uma maneira ainda mais escandalosa do que os outros governos, os quaes elle tambem havia visitar, foi esta a sua expressão; que o governo portuguez, para attrahir ainda mais os capitaes ingleses, lhes havia offerecido uma hypotheca especial, o rendimento das alfandegas; que, se estes ajustes tivessem sido feitos com subditos dos Estados Unidos, ha muito que o governo portuguez se teria apressado a fazer-lhes justiça; que, finalmente, elle (lord Clarendon), como ministro inglez, era obrigado a sustentar os direitos dos subditos inglezes; o que estes, se elle assim não procedesse, se dirigiriam ao parlamento, o qual lhe tomaria rigorosas contas, o que bem mal iria ao governo portuguez se este negocio fosse debatido na casa dos communs, porque na discussão se apresentariam factos escandalosos que arruinariam completamente o credito do governo portuguez; e que se ali se não tinha já apresentado alguma moção áquelle respeito, era em consequencia d'elle haver promettido sustentar as justas reclamações dos prestamistas inglezes; e terminou dizendo-me que, posto que elle não quisesse por certo cansar embaraço algum ao governo de Sua Magestade Fidelissima, não podia comtudo deixar do cumprir o seu dever: e por isso de insistir na reclamação apresentada por sir Richard Pakenham.
"Então, conhecendo que alguns dos meus argumentos haviam feito impressão sobre o animo de lord Clarendon, disse-lhe com um tom bastante indignado: "Se isto que acabo de voa dizer não é verdade, negue-o; mas se o é, a vossa conducta é inexplicavel o dá logar a desconfianças, que eu não queria ter nem um momento. Vós dizeis-me que haveis tambem de visitar com as vossas reclamações todos os outros governos que, havendo contrahido emprestimos em Inglaterra, deixaram de cumprir o que prometteram. Quero acreditar que essa seja a vossa intenção; mas então qual foi o motivo por que haveis escolhido o governo portuguez, o mais fiel o antigo alliado da Gran-Bretanha, para ser a primeira victima das vossas exigencias, cuja justiça eu não reconheço? O motivo por vós allegado já eu previa que não existia, e muito melhor o ha de ainda provar o governo de Sua Magestade na resposta que ha do dar á nota de sir Richard Pakenham." Continuei ainda por algum tempo, e com diversos argumentos, que me parece inutil repetir a v. exa. a combater os de lord Clarendon. Este, com a amabilidade que o caracterisa, conhecendo o estado do irritação em que eu estava, procurou acalmar-me, dizendo-me primeiro muita cousa lisonjeira para mim, fazendo-me mil expressões de amisade, e que para me provar que elle nenhum desejo tinha de ser nocivo ao actual ministerio, nem de lhe causar os menores embaraços, estava prompto a receber qualquer proposta que se lhe quizesse fazer, que podesse acalmar a indignação dos credores inglezes.
"Passou depois a dar-me algumas explicações confidenciaes sobre as difficuldades em que elle se achava, em consequencia dos muitos e energicos advogados que os bondholders portuguezes têem na casa dos communs, a quem elle, até para evitar grandes escandalos, como já me havia observado, era obrigado a dar satisfação.
"É facto que na casa dos communs ha pessoas interessadas na divida portugueza; é facto que Thorton, o maior inimigo que tem o governo de Sua Magestade, tem, pela sua riqueza, grande influencia na praça do Londres; é facto que as publicações e intrigas da direcção do banco de Portugal excitaram notavelmente Thorton o os principaes bondholders, e eram talvez uma das principaes, se não a principal causada reclamação hoje pendente. Conhecendo a praça de Londres, desde logo previ que a conducta do banco de Portugal havia ter grande alcance: causar grandes embaraços ao governo de Sua Magestade e grandes males ao paiz.
"Quem poderá acreditar que se me guardasse um profundo segredo dos decretos de 3 de dezembro de 1851 e de 18 de dezembro de 1852, e que eu só d'elles tivesse conhecimento pelos Diarios do governo."
Tinham sido reduzidos os juros em 1852, e em 1854 ainda o governo inglez insistia nas suas reclamações.
Em 5 de maio de 1854 dirigia-se o ministro inglez em Lisboa nos seguintes termos ao nosso ministro dos negocios estrangeiros:
"Sir. - Ao governo do Sua Magestade Britannica continuam a ser dirigidas vehementes representações por parte dos subditos de Sua Magestade, possuidores de fundos portuguezes, queixando-se do prejuizo o damno que lhes causou a arbitraria reducção dos juros estipulados sobre o dinheiro por elles emprestado ao governo de Portugal, a cuja violação do contrato entre o governo e os bondholders se tentou dar um caracter de legalidade pelo decreto de 18 de dezembro de 1852.
"Em uma nota que tive a honra de dirigir a v. exa., em 7 de maio ultimo, fiz constar a v. exa. os sentimentos do governo do Sua Magestade n'este desgraçado objecto; e em 22 de agosto seguinte, por ordem do governo de Sua Magestade, passei ás mãos de v. exa. copia do um protesto feito pelos bondholders contra a deducção então recentemente feita sobre a somma de juros que legalmente lhes eram devidos, manifestando a v. exa. ao mesmo tempo a opinião do governo de Sua Magestade quanto ao inquestionavel direito que justificam os bondholders, a protestar contra a violencia que, por esta fórma, lhes fazia. Um segundo protesto foi ultimamente apresentado ao governo de Sua Magestade, em consequencia de uma repetição da mesma violencia em reter ou, para melhor dizer, em confiscar em proveito du estado uma certa porção do dividendo vencido em l de janeiro ultimo. O governo de Sua Magestade tinha, na verdade, esperanças que noções mais solidas, em relação ao credito publico, e que um sentimento de justiça da parte do governo portuguez teria produzido ha mais tempo, se não a revogação do decreto de 18 de dezembro, ao menos tal modificação que provasse aos credores britannicos de Portugal que, se as circumstancias tinham, infelizmente, obrigado o governo a reter por algum, tempo parto dos juros legalmente applicados á dívida publica, não fôra com a intenção de que esta usurpação nos direitos dos bondholders fosse perpetua; que, pelo contrario, era do desejo e vontade do governo portuguez, logo que as circumstancias o permittissem, tornar a cumprir a estricta obrigação dos compromissos da nação, e que os sacrificios temporariamente impostos aos bondholders, na forçada reducção dos seus dividendos semestraes, seriam levados em conta, constituindo por esta fórma uma divida crescente a seu favor, para ser do futuro liquidada quando estado de tranqnillidade publica em Portugal, de que agora, felizmente, gosa, tenha produzido os seus effeitos naturaes, desenvolvendo os vastos e invejaveis recursos d'este paiz favorecido, contribuindo d'este modo em tão larga escala para a riqueza nacional, que torna o cumprimento das obrigações publicas um ligeiro fardo, comparado com as vantagens que do ahi poderia resultar no impulso Lado ao credito nacional em um augmento consciencioso de força moral, dignidade e respeito que as nações, assim como os indivíduos, nunca deixam de conseguir de um cumprimento honroso dos seus justos compromissos. Infelizmente, estas esperanças da parte do governo de Sua Magestade não foram ate agora realisadas.
"O decreto de 18 de dezembro de 1852 ainda se acha em vigor, e nenhuma prova se tem offerecido de que haja disposição da parte do governo portuguez para revogar ou modificar as suas arduas e injustificaveis previsões.