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SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1886 789

terio transacto, era por elle não ter idéas assentes sobre o conflicto levantado entre Guimarães e Braga. (Apoiados.)
Diziam: Pois o governo não tem idéas? É preciso ter idéas.
O que pretendem? o que querem? o que tencionam fazer? (Apoiados.) É indispensavel dizel-o.
Era esta a principal accusação com que se pretendia fulminar o governo de então e n'ella se insistia, sempre que se tratava do assumpto. (Apoiados.)
Pois succede agora que o sr. ministro da fazenda tambem não tem idéas a respeito de uma questão capital como esta é; o que demonstra mais uma vez a procedencia; da minha figura de rhetorica. Está ali o Lethes (apontando para as cadeiras dos srs. ministros) a produzir o seu effeito. (Riso.)
E aproveito agora a occasião de responder em espirito a um collega nosso que está presente, e que lá fóra só illustra pelas demonstrações que dá do seu avantajadissimo talento, fino criterio e aprimorado engenho na arte do jornalismo; collega que me accusava de humorismo sceptico, porque eu, no dia da apresentação d'este ministerio, declarei que havia de ser mais opposição aos processos e maneiras de administrar do actual governo, do que ás suas idéas.
É possivel que seja sceptico; mas a culpa não é minha; é dos factos. A camara vê que n'um pequeno espaço de tempo o governo teve occasião de demonstrar que a respeito de duas questões capitães ou uno tinha idéas, ou se as tinha eram as mesmas do governo transacto. (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, não é este o motivo principal por que pedi a palavra. Não é meu intuito irritar o debate nem causar difficuldades ao governo. A camara vê isto mesmo pelo tom mellifuo, impregnado da minha habitual ingenuidade, (Riso.) com que eu estou dizendo estas cousas. Nem os iliustres deputados podem imaginar o contrario.
Pedi a palavra especialmente para chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para o capitulo 2.° do mappa das despezas extraordinarias que acompanha este projecto de lei.
Ha de haver dez ou doze dias que eu tive a honra de enviar para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas ácerca do caminho de ferro do Algarve. S. exa. não se deu ainda por habilitado a responder; não o increpo por isso, porque antevejo quantas difficuldades hão de cercar um ministro, embora do valimento e do talento de s. exa., ao tomar, pela primeira vez, conta de uma pasta, tão complicada como é a das obras publicas.
Não tenho, por isso, a menor intenção, repito, de increpar s. exa. por não se ter dado ainda por habilitado a responder á minha interpellação: mas, sendo esta a primeira occasião que se me offerece, permitta-me o illustre ministro que a aproveite para chamar a sua attenção para as condições especiaes em que se encontra a construcção d'aquelle caminho, e para solicitar em favor d'elle a sua maior actividade.
Este assumpto do caminho de ferro do Algarve só tem um similhante na nossa administração política; é o deficit. Quer-me parecer que o deficit e o caminho de ferro do Algarve são as duas cousas que no paiz nunca acabam. (Riso.)
(Internação.)
Eu não os comparo no seu inicio; comparo-os no seu acabamento. O caminho de ferro do Algarve começou, creio eu, ha vinte, trinta, ou mais annos; não o sei bem. Perda-se na noite dos tempos o seu começo. (Riso.)
Mas, realmente, não sei porque fatalidade, aquelle caminho de ferro começado ha tão longo tempo, ainda não tem chegado ao seu termo. E não é porque não tenham passado pelo ministerio das obras publicas os ramos mais variados dos conhecimentos humanos, symbolisados pelas pessoas dos srs. ministros.
Ali temos visto a poesia, a chimica, o jornalismo. Lá temos tido todos os ramos da actividade e dos conhecimentos humanos, e todavia o caminho de ferro do Algarve continua no mesmo estado; continúa a ser feito por meio de parcellas dosimetricas. (Riso.)
Têem talvez medo de que applicando-se-lhe o systema allopatha fique peior; d'onde resulta que, quando se faz o decimo kilometro, o primeiro que tinha sido construido, ha doze annos está naturalmente estragado, e quando se faz o vigesimo, o decimo está perdido. É assim sucessivamente, não havendo maneira de chegarmos a ver a sua conclusão.
É para este ponto grave, é para este estado de cousas que eu chamo a attenção do sr. ministro das obras publicas.
De mais a mais o ministerio apresentou-se aqui desfraldando a bandeira das economias; e em relação ao caminho de ferro do Algarve, para se fazerem economias é necessario que elle se construa; porque as economias não consistem só em não gastar, consistem tambem em gastar com proveito (Apoiados.) Assim como muitas vezes é económica uma despeza, assim tambem muitas vezes é dispendiosa uma economia. (Apoiados.)
No caso de que se trata, não se construir por uma vez e a serio o caminho de ferro do Algarve, dá em resultado fazer-se todos os annos uma despeza extraordinaria, perdendo o estado, não menos de 60:000$000 réis a 80:000$000 réis por anno, porque estão lá adherentes ao solo e sujeitos aos naturaes estragos e á acção de tempo materiaes de valor superior a 1.500:000$000 réis.
Que administração é pois a d'este paiz que procede d'esta fórma?
Bem sei que o sr. ministro, não contra a verdade do que eu estou dizendo, mas contra a auctoridade com que posso produzir estas rasões, poderá allegar que eu nem sempre procedi talvez com a mesma energia a respeito da situação passada: mas responderei a s. exa. que eu até tive a desventura de interromper as minhas relações pessoaes com o sr. Hintze Ribeiro por causa do caminho de ferro do Algarve; que tenho feito tudo quanto é possivel fazer-se; que tenho empregado todos os esforços, todas as diligencias de que sou capaz para ver se convencia os poderes publicos d'esta terra, não a fazer uma despeza que alargue as proporções do deficit, mas uma verdadeira economia; e todavia, apesar de tudo isto e dos programmas de todos os ministerios presentes e passados, as cousas continuam no mesmo estado!
O que se está fazendo com a construcção d'aquelle caminho é uma vergonha, porque accusa um desmazelo e uma relaxação superior a toda a censura.
Ora, como eu conheço a actividade, a energia de caracter e boa vontade do actual sr. ministro das obras publicas e como sei que s. exa. é proficiente no conhecimento, não só d'este assumpto, mas de todos aquelles que estão entregues á sua competencia official no ministerio das obras publicas, ouso pedir-lhe que empenhe os seus recursos intellectuaes e a sua mui reconhecida e proverbial actividade, para que de uma vez por todas acabe com similhante lastima e com aquella vergonha.
Não quero alongar me em mais considerações. A hora não é a mais propicia nem a mais propria.
Creio ter dito o sufficiente para solicitar um despertamento de energia por parte dos poderes publicos, a fim de prestarem attenção a este assumpto, que realmente a merece por todos os respeitos.
N'este sentido mando para a mesa uma proposta, na qual não insistirei, se o sr. ministro das obras publicas me disser que torna este assumpto ao seu cuidado especial, porque não tenho a menor rasão para não depositar absoluta confiança nas palavras de s. exa.
Tenho dito.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)