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SESSÃO N.° 63 DE 10 DE SETEMBRO DE 1909 7

ciencia, crê-se que a nossa integridade está garantida pela alliança inglesa. Existe essa alliança? Dizem os tratadistas que sim, mas o que não dizem é se, parallelamente, existe uma convenção militar. Mas suppondo mesmo que exista, com que conta Portugal para valorizar essa alliança?

Ha quem encare a alliança inglesa como um prolongamento da guarda municipal para a manutenção das instituições, mas é preciso que se lembrem de que a Inglaterra é um país essencialmente pratico, que não se deixa levar por sentimentalismos.

Na phase capitalista em que entraram as sociedades, só o interesse é que domina nas relações internacionaes.

A guerra hoje entre as nações tem um significado essencialmente economico, e, no dizer de um publicista francês, faz-se a coup d'argent ou a coup de canon.

Esse conceito que fazem da Inglaterra é errado; a Inglaterra, acima de monarchias ou de republicas, põe os interesses nacionaes, e quando se tratar da luta inevitavel que tem de se travar entre as grandes potencias, não recorrerá ao almanach de Gotha para ver quantas gotas de sangue inglês ha na familia reinante, mas de que elementos militares pode dispor.

Hoje o conflicto mundial não é outra cousa senão a luta entre a classe capitalista e o proletariado. E apesar de todas as manifestações anti-
-militaristas e de todas as violencias para exterminar a guerra, esta ha de sempre dar-se.

Nós, apesar de sermos uma nação pequena, nunca poderemos ter a felicidade de nos conservarmos neutraes. A nação considerada como neutral na Europa, que até hoje se tem considerado a nação cuja independencia está garantida pela propria conveniencia das nações limitrophes, essa nação confia tão pouco nos tratados, no acaso ou na Providencia que está pronta a mobilizar á primeira voz 200:000 a 300:000 homens da primeira linha, fora muitos milhares de homens das outras linhas. Esta nação é a Belgica, que durante tanto tempo descurou o problema militar, confiando só na sua neutralidade, mas agora não hesitou em abalançar-se na obra collossal das fortificações de Antuerpia, e trata por todas as maneiras de organizar um exercito que faça respeitar a sua neutralidade, porque não confia nas assinaturas dos diplomatas por baixo de um papel, quando por detrás d'elle não estejam as bayonetas dos cidadãos do país, dispostas a defendê-lo.

Nós, de modo nenhum podemos ser uma nação neutral.

Mas o que temos nós para assegurar a defesa nacional? Somente o poder moral. Orgulhamo-nos do espirito patriotico dos portugueses e do valor moral dos nossos soldados. É necessario, todavia, a existencia da organização militar em Portugal. Mas existe esboçado porventura, o nosso systema de defesa? Encontramo--nos prontos, num momento de perigo, para a luta?

Não hesita em dizer que nada absolutamente existe de defesa nacional.

A seguir o orador evoca a figura de Latino Coelho, que foi o unico homem encarregado de escrever a historia das guerras da peninsula, de cujo admiravel livro lerá algumas paginas para reforço das suas considerações.

E, já que falou em Latino Coelho, permitta-se-lhe que levante uma mentira que durante muitos annos teve foros de verdade na politica portuguesa.

Disse-se, escreveu-se, que Latino Coelho, encarregado, como disse, de escrever a historia das guerras peninsulares, recebera a devida gratificação, sem ter dado cumprimento ao seu trabalho. Quis o acaso, entretanto, que fosse parar á mão d'elle, orador, uma carta de Latino Coelho, e que passa a lê-la, como um grande documento moral. Essa carta foi escrita a Saraiva de Carvalho, quando esteve no poder o Ministerio progressista.

É-lhe agradavel, declara, e certamente tambem a todos que, áparte as opiniões politicas, foram sempre admiradores d'esse alto espirito, que era um verdadeiro homem de sciencia, que no Parlamento foi um dos maiores oradores, que na cadeira de professor foi um dos mais illustres do país, que, como estylista, não se encontrou quem lhe succedesse, e que, como historiador, produziu tres bellos volumes, cuja obra elle, orador, desejaria ver continuada por homens de tanto valor como Latino, evocar a figura de Latino Coelho.

Ignora, no entanto, se levantará protestos o facto de mostrar a portugueses a nobreza de caracter de um verdadeiro português, e recordar o seu valor scientifico.

Continuando, o orador pergunta se nós, no caso de um conflicto europeu, no qual, de resto, havemos de ser fatalmente envolvidos, temos os elementos necessarios para figurar nessa guerra.

O que é a nossa força naval já por mais de uma vez o afirmou, nesta casa, o illustre Deputado, collega e seu amigo, o distincto official de marinha, Sr. Augusto do Valle, que ainda hontem declarou que durante os ultimos cinco annos foram desarmados, nada menos, vinte e cinco navios de guerra.

É sempre bom que os depositarios do poder, em qualquer país, taes como os Ministros da Guerra e da Marinha, procurem por todas as formas conquistar a attenção dos civis para os assuntos que foram encarregados de administrar superiormente, porque uma guerra não se faz simplesmente com os homens que se encontram nas fileiras: combatem, tambem, todos aquelles que facilitam a sua acção. E só uma pretensão muito ridicula de espirito tacanho e obtuso podia commentar, com desdem, as preoccupações dos individuos que, não pertencendo á classe militar, se interessam devotadamente pelo problema da defesa nacional.

O Sr. Brito Camacho (interrompendo): - Para reforço da opinião do Sr. João de Menezes, pede licença para ler umas considerações publicadas por um illustre escritor militar allemão.

O interruptor lê, a seguir, algumas passagens d'aquelle escritor e termina dizendo que não são senão a confirmação das palavras de S. Exa.

O Orador: - Acho indispensavel que todos os portugueses tenham, na medida do possivel, pelo menos tanto conhecimento das coisas militares da nação como os estrangeiros.

Allude depois ao que escreveu o Sr. general Moraes Sarmento, a respeito de não se exporem ao Parlamento as deficiencias do militarismo, e diz que todos os cidadãos portugueses deviam occupar-se da defesa nacional.

O preconceito ou o erro de considerar fechados a todos os individuos que não são militares os assuntos da defesa nacional no nosso país prevalece em muitos espiritos; mas a verdade é que as nações que foram vencidas e derrotadas nunca foram aquellas em que os cidadãos se interessaram pela sua defesa; foram, sim, aquellas em que o exercito se transformou numa casta e se desprezou a collaboração dos outros cidadãos prestimosos.

Como se responde, porem, ao projecto de lei apresentado pelo Sr. Brito Camacho, sobre a reducção do tempo de serviço militar ? Como se responde tambem ao projecto que elle, orador, apresentou sobre a obrigatoriedade do serviço militar? Como se responderia ainda ao projecto apresentado por um individuo da classe militar pedindo a redução do tempo de serviço naval?

O Sr. Presidente: - Observa ao orador de que fala ha uma hora, tendo mais um quarto de hora para concluir o seu discurso.