O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Eu entendia que o Parlamento devia determinar na lei todos os pormenores e detalhes do acordo, e fixar os encargos que o país vae assumir, em logar de se conceder uma autorização, como a que se propõe, visto que tão mau resultado tem dado este systema nas mãos do actual Governo.

Eu entendia que o Parlamento devia conhecer com a maior precisão tudo aquillo a que vae obrigar o país.

O que se passou hontem aqui mais me arreigou no espirito a convicção de que será funesta para nós todos uma autorizarão tão ampla como a que o Governo solicita do Parlamento; porque maiores encargos e obrigações provirão para o Thesouro Nacional do que aquelles que se pode presumir resultarão em vista dos termos da lei. É a experiencia do passado que nos deve guiar neste assumpto, e o espectaculo que hontem aqui presenciamos não augmentou a confiança, no Governo, nem nos dá garantias para o futuro. (Apoiados).

Vão já passadas cêrca de dezaseis horas sobre os factos que hontem presenciámos, e confesso á Camara que sinto ainda, uma viva o profunda impressão, ao
recordá-los, tão extraordinarios elles foram. (Apoiados).

Nunca, nas nossas assembleias politicas, quando mais accesas eram as lutas partidarias, quando mais acrimoniosa era a discussão, se viu acto semelhante a esse. (Apoiados).

Quando a vehemencia das paixões politicas poderia até certo ponto desculpar o que hontem presenciou a Camara, nem mesmo nessa occasião se deram factos iguaes ou semelhantes. (Apoiados).

Quando á luta armada se seguiam as aggressões pessoaes, e as accusações que podiam ferir a honra e a dignidade dos homens publicos, nem mesmo nessa occasião se praticou um acto como aquelle a que hontem assistimos. (Apoiados).

Essas accusações mal saiam do ambito d'esta casa e não chegavam á fronteira.

Hontem viu, porem, a Camara que o illustre leader da maioria não duvidou trazer para o Parlamento um documento d'aquella natureza, lendo-o na lingua francesa, que é a lingua universal, para que o seu conhecimento não se limitasse ao nosso meio e passasse para o estrangeiro. (Apoiados).

S. Exa. nem sequer leu a traducção que deve existir no Ministerio da Fazenda, apresentou o ao Parlamento na lingua francesa, para que fosse bem entendido lá fora. (Apoiados).

Nunca se viu um tal rebaixamento de costumes parlamentares.

Era no interesse publico, para salvação ou defesa da causa nacional?

Não era (Apoiados); porque, se fosse necessario, ao Governo é que competia apresentar esse documento (Apoiados); porque era a elle que cumpria dizer á Camara que se no projecto incluirá a clausula da consignação das receitas das alfandegas á divida externa, o fizera por se julgar a isso obrigado, em virtude do documento aqui apresentado.

O fim foi, porem, outro: foi um mesquinho ardil partidario. (Apoiados).

Quis se simplesmente inutilizar por aquella forma aquelle que, sendo hontem alliado, é hoje adversario (Apoiados), e vinha par em relevo a obra do Governo.

Contrariava o Governo a opposição d'aquelle Deputado á clausula introduzida no projecto para ficarem consignadas á divida externa as receitas das alfandegas?

Mas o que faz agora o Deputado?

O mesmo que já tinha feito o Sr. Hintze Ribeiro. (Apoiados). Era o seguimento de uma campanha em que tinham sido alliados. (Apoiados).

Eu pergunto á Camara: que noção tem este Governo da solidariedade ministerial? (Apoiados). Que opinião forma da responsabilidade collectiva dos Ministros? Que ideia forma o Sr. Presidente do Conselho da sua propria responsabilidade? (Apoiados).

Hoje vem o Sr. Arroyo, com um documento de 1893, que é da responsabilidade politica do Sr. Presidente do Conselho, justificar perante o país a obrigação em que se via collocado o Governo actual de conceder aquella consignação! (Apoiados).

Mas o Sr. Presidente do Conselho não sabia isso mesmo em 1898? (Muitos apoiados).

Até certo ponto comprehendia-se que pudesse não ter responsabilidade moral, mas tinha-a politica; e é d'essa que aqui nos occupamos.

Mas o Ministro da Fazenda d'aquella epoca conhecia bem esse documento; e sabia o alcance que tinha, que foi hontem perfeitamente definido pelo Sr. Arroyo.

O Sr. Arroyo não foi como Deputado, mas como leader da maioria, que apresentou esse documento que o Governo lhe tinha dado para que o apresentasse á Camara; porque S. Exa. não o podia ter obtido senão mandado officialmente pelo Governo. (Muitos apoiados).

É para notar que, quando aqui se pediram documentos para esclarecimento d'este assumpto, o Governo absolutamente se recusou a mandá-los, declarando que só mandaria os que julgasse convenientes á causa publica!

E que conclusão deve tirar o país do acto que hontem se praticou? (Apoiados).

É facto que o meu illustre antecessor na pasta da Fazenda, e meu amigo muito dilecto, não desconhecia esse documento, que tambem era conhecido no estrangeiro; porque a elle se faz referencia num dos relatorios do Council of Foreign Bondholders.

Conhecia-o; e quando apresentou a proposta de lei em que se autorizava o Governo a consignar os rendimentos das alfandegas á divida externa não veiu desculpar-se com semelhante documento, que se conservava secreto e se conservaria ainda se o Governo o não mandasse divulgar pelo illustre leader da maioria. E demais o Sr. Arroyo tem responsabilizados especiaes, porque foi membro d'este Governo. O Sr. Ressano Garcia não se serviu d'esse documento, porque nós tivemos em vista, na solução d'esta questão, unicamente o interesse do país, e nunca procurámos effeitos partidarios e politicos. (Apoiados). Podia responder aos violentos ataques do Sr. Hintze Ribeiro com a apresentação d'esse documento, mas isso enfraquecia o Governo do meu país nas negociações com os credores estrangeiros. Preferiu ouvir os doestos e as aggressões que sobre esse ponto continuaram sempre, avir dizer ao mundo inteiro, que tem os olhos fitos em nós, que a nossa administração publica é de tal ordem que um Ministro póde comprometter o país, isoladamente, sem que os seus collegas se julguem responsaveis por esse acto.

Ora, Sr. Presidente, é esse o facto que mais profunda impressão me causou hontem. Não comprehendeu o illustre Deputado, que ainda ha pouco era Ministro dos Estrangeiros, que aos motivos que já havia para o descredito do país no estrangeiro vinha accrescentar um outro talvez dos mais fortes (Apoiados), enfraquecendo assim o Governo do seu país na conclusão d'este assunto?... É tambem incomprehensivel que o Sr. Presidente do Conselho de Ministros, depois de ter encetado em 1898 uma violenta campanha politica aqui, e em toda a parte, empregando todos os meios de opposição systematica e acintosa, com o pretexto da consignação dos rendimentos das alfandegas á divida externa, seja elle proprio que venha agora propor essa mesma consignação.

Mas o que explica esta contradicção, o que explica esta incoherencia? E que justificação pode ter a apresentação á ultima hora d'aquelle documento com o unico fim de desauctorizar quem pouco antes era auxiliar nas tristes campanhas de opposição, e fôra collega do Sr. Presidente do Conselho?

Se ha crime e se algum attentado se commetteu, reu do