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8 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

mente e sempre em tempo de eleições. Mas o povo já se vae desenganando e reconhecendo quaes são os seus amigos verdadeiros.

Por vezes le nos jornaes que um homem furtou um pão, que outro, um bacalhau, mas que a este proposito lera tambem que um terceiro commentÁra assim taes delictos: "Se, em vez de um, furtassem vinte, já estavam condecorados!"

Crê que os srs. ministros não podem deixar de conhecer taes factos, ponderado terem innumeros secretarios, pelo menos um cada ministro, tendo o sr. ministro do reino dois.

Assegura que, se não tivesse herdado de seus avós os meios necessarios á sua mantença, seria professor ou exerceria qualquer outra profissão, mas nunca tomaria parte em tramoias, palavra inventada por fr. Raphael de Jesus, n'um livro de que já dera noticia á camara.

Entende que é preciso dizer toda a verdade, e que nunca a patria mais carecêra do esforço de todos os seus filhos, como n'este momento em que podemos cair num verdadeiro abysmo.

Estranha que o governo não haja providenciado com relação ao que, se dá na companhia real dos caminhos de ferro, se bem a imprensa tenha conclamado toda contra os desmandos praticados ali. D'este procedimento deprehende como certo que se um pobre homem apparece com um relógio é suspeito de roubo e perseguido, emquanto que com os grandes syndicateiros não se mettem as auctoridades, as quaes, em taes casos, sempre esperam ordens superiores para proceder depois.

Pergunta, pois, directa, clara e positivamente ao sr. ministro do reino, se porventura s. exa. já dera ordens ao sr. governador civil de Lisboa, a fim de que este magistrado, por intermedio do sr. commissario geral de policia, examinasse o que ia de verdade e punivel n'esta questão do caminho de ferro; e ao sr. ministro da justiça se tambem já ordenara ao sr. procurador da corôa ou ao sr. procurador régio que syndicasse d'este negocio. E perguntará ao sr. Mendonça Cortez se o auxilio prestado pelo governo ao banco lusitano foi para manutenção desse banco ou para a do proprio governo.

Ádverte que, como os miguelistas estão muito reduzidos, e cada vez ha mais liberaes, não é para admiração que os haja tambem nas companhias, supposto não saiba elle bem o que n'ellas occorre, nem as relações que têem com o governo.

O sr. Mendonça Cortez: - Pondera-lhe que ha um meio muito simples de conhecer o digno par as relações que existem entre aquellas duas entidades, qual o de se fazer socio da companhia.

O Orador: - A boas horas! Nada!... que eu não quero que me aconteça o mesmo que acontece a quem chega tarde a um jantar: passar por baixo da mesa, e, no meu caso, eu passaria por baixo do balcão.

Lembra depois que já em tempo houvera uma inundação de patriotismo, quando se dera a questão ingleza, mas que chegára agora outro navio com carregamento de patriotismo para a companhia real dos caminhos de ferro. A differença está apenas em que, em vez de ser contra os inglezes, é contra os francezes, contra os francezes que administraram os caminhos de ferro até 1885, mas que deixaram dinheiro em cofre, emquanto os actuaes administradores deram com a companhia no estado a que está reduzida.

No estado, pois, em que as cousas se acham, entende que o governo deve tomar, se é que não o tomou já, o logar que lhe pertence e assumir as responsabilidades que lhe competem. Por isso deseja lhe responda ás perguntas que fízera.

Faz ainda varias ponderações e conclue exhortando a que os srs. ministros lhe respondam em nome da throno, cujos alicerces os falsos patriotas estão procurando alluir, em nome da patria, da justiça e da liberdade!

(O discurso do digno par será publicado na integra, quando s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. ministro do reino.

O sr. Ministro do Reino: - Começo por mandar para a mesa uma proposta do meu collega da marinha a fim de poderem alguns dignos pares accumular as funcções legislativas com as que exercem n'aquelle ministerio.

O digno par o sr. marquez de Vallada, depois de dizer muitas cousas eruditas, depois de fallar, como sempre costuma, com a maior eloquencia, fez graciosas referencias ao facto de eu ter dois secretarios, o que se dá por isso mesmo que estou encarregado de duas pastas.

O sr. Marquez de Vallada:- Eu referi, não censurei.

O Orador: - Difficilmente s. exa. o poderia censurar; em primeiro logar, porque absolutamente careço d'elles para o serviço dos ministerios a meu cargo, e em segundo logar, porque não recebem gratificação alguma, ao contrario do que se tem feito muitas vezes e que eu proprio já fiz, quando ministro em condições do thesouro mais desafogadas. E assim respondo a um digno par que se aproveitou das palavras de s. exa. para dizer que essa nomeação de secretarios era um acto de economia.

Mas pondo de parte esse incidente, vamos precisamente á pergunta que s. exa. me dirigiu.

Sr. presidente, o governo a que tenho a honra de pertencer, nem protege syndicatos, nem é solidario com syndicatos, nem os persegue senão quando se colloquem fóra da lei; e ainda assim podem-se dar hypotheses em que não tenha o direito de intervir.

O governo nunca sacrificou os interesses do estado aos de qualquer syndicato.

Respondendo tambem a uma pergunta do sr. D. Luiz da Camara Leme, declaro que o assumpto relativo á companhia dos caminhos de ferro e aos suppostos desperdicios e irregularidades que se dizem ali praticados, está apenas desde hoje submettido officialmente ao governo, em virtude de um officio do commissario régio junto d'aquella companhia.

O governo vae examinar o assumpto sobre a base d'esse officio, de cujo conteúdo eu não posso informar o digno par, porque já depois de estar aqui é que fui informado de que o sr. ministro das obras publicas tinha recebido um officio do sr. Antonio de Serpa sobre o que se passou na assembléa da companhia.

O que repito é que o governo vae examinar o assumpto e ha de tomar as providencias que julgar mais convenientes aos interesses publicos.

D'essas providencias será informada a camara que depois as julgará como entender.

Pela minha parte estimaria bem que n'essa occasião a camara me retirasse a sua confiança, porque a minha saude, ainda combalida, de certo reclama o meu repouso.

Entretanto imagino que o governo, examinando o assumpto, tomando uma resolução reflectida e meditada, poderá conquistar para essa resolução o apoio e o applauso da camara dos dignos pares do reino.

Nada mais posso dizer, nada mais direi; e ainda quando tivesse tomado, que não tomei, providencias policiaes, que s. exa. perguntou se as tinha tomado, em caso nenhum eu as diria a s. exa., nem as faria publicas, senão quando ellas tivessem começo de execução ou realisação.

Por isso eu peço ao digno par que se conserve na espectativa, que não ha de ser longa, para ter, como a camara, conhecimento completo e exacto das providencias que o governo ha de adoptar.

Supponho que isto satisfará por hoje ao digno par, e se não satisfizer, creia s. exa. que é com grande sentimento meu, porque é sempre desejo meu ser-lhe agradavel.

(s. exa. não reviu.)