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6 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

offendiam corporalmente, estabelecendo-se pequenos conflictos, que a prudencia da guarda municipal evitou serem graves.

Ha já dias, porem, que estas provocações cessaram, e que as relações entre a guarda municipal e o povo da capital parece terem entrado em franca melhoria, se não em completa normalidade.

Não posso ir mais adeante nas minhas affirmativas porque não desejo antecipar juizos; a justiça dirá a sua ultima palavra e a intervenção do Governo será só para a proteger no exercicio livre da sua missão julgadora.

No dia seguinte aos acontecimentos de 5 de abril, finalizou o acto eleitoral sem novidade; mas levantaram-se tumultos nas ruas, promovidos por pessoas das ultimas camadas sociaes.

Dados os acontecimentos da vespera, e a excitação dos animos contra a policia e a guarda municipal, foi o exercito encarregado de manter a ordem, o que fez com difficuldade, ainda que sem resistencia, porque os bandos que se formaram dispersavam, mal avistavam a tropa.

Durante a noite continuou o barulho, e ainda no dia seguinte, até que pela altitude do exercito e pela prisão de grande numero dos individuos que nas rusgas foram apanhados, cessou a desagradavel impressão que seria natural causar um movimento, que se não explicaria decerto em occasiões normaes.

Fui censurado por ter deixado continuar por tanto tempo os desordeiros impondo o panico aos cidadãos honestos, dizendo-se então que bastaria uma duzia de policias a tomar as embocaduras das ruas, para que terminasse a anomala situação criada pela pressão dos discolos e maltrapilhos, que constituiam o grosso da manifestação.

Para fazer uma apreciação justa dos factos, e necessario não os considerar em absoluto.

É essencial julgá-los pelas circumstancias de occasião, ponderar-se que a situação que o Governo encontrou, e que não criou, era absolutamente anormal.

O país acabava de sair de uma revolução armada; a guarda municipal e a policia civil, ás quaes se deveu, no seu primeiro impulso, o mallogro do movimento revolucionario, não tinham seguramente as sympathias dos que se haviam revolucionado; o conflicto do dia 5 mais aggravara a situação; ninguem podia saber o que estaria por detrás de uma expansão dos elementos que appareciam nas ruas; se se mettesse nessa occasião a policia a funccionar nas ruas, como normalmente succede, os resultados seriam seguramente novos conflictos sangrentos, e novas lutas, que era preciso, por todas as formas, evitar.

Foi isto que se conseguiu pelo systema das rusgas, que, executadas pela policia, protegida por troços de cavallaria do exercito, fizeram em pouco tempo voltar á normalidade o socego da capital, sem derramamento de sangue, alem do já havido, e que tão profundamente abalou o meu coração de português.

Convencido de que o movimento havido derivara de animadversão contra os elementos policiaes, que até os proprios elementos conservadores por vezes fomentaram com o exagero das suas criticas, o que pretendi a todo o custo, evitar foi que na occasião de mais movimento nas ruas da capital taes conflictos comprehendessem não só os discolos, mas as pessoas que por dever dos seus lavores se achassem occasionalmente nos logares onde os discolos se agglomeravam em bandos.

O processo que empreguei para manter a ordem não teria sido o mais rapido no suppor de quem critica; o que seguramente evitou foi mais derramamento de sangue, mais um desgosto para o coração de todos nós, mais uma irritação segura contra, os elementos de ordem, que é preciso que existam em todas as sociedades constituidas.

É certo que em seguida aos acontecimentos, a que me tenho referido, se aggravou a atmosphera do mau-estar, que encontrámos, e que parecia ir pouco a pouco melhorando em relação aos primeiros dias de existencia do actual Governo.

Boatos espalhados por toda a gente, uns inconscientemente, e pelo mau gosto de falar e parecerem bem informados, outros para fins bolsistas, outros ainda para conservar a agitação, e porventura provar a impossibilidade de fazer de Portugal um país constitucionalmente governavel, outros, finalmente, pelo susto que desde o attentado de 1 de fevereiro se havia apoderado da maioria das pessoas que viviam na capital, tudo isso concorreu para o estado de ansiedade que avassallava os animos, e que se traduzia na desconfiança de todos e de tudo, eco que se repercutia nos mercados bolsistas estrangeiros, não ainda assim com a intensidade com que se manifestava nos estabelecimentos de credito, tanto do Estado, como particulares dentro do país.

Todos os dias chegavam ao conhecimento do Governo noticias desagradaveis, com relação a alterações de ordem publica, que não provinham só de elementos policiaes ou de elementos nacionaes, e a Camara pode calcular como foi attribulada a existencia do Governo nesse tempo, e quanta prudencia foi preciso desenvolver, a par da necessaria demonstração de que a força publica estava ao lado da ordem e da manutenção da Constituição em toda a pureza das suas condições livres e ao mesmo tempo em toda a pureza do regime da ordem, unica condição de progresso, de paz e de vida social possivel.

O estado de cousas que a largos traços tenho esboçado, só melhorou consideravelmente quando o país entrou, pela abertura do Parlamento, em pleno funccionamento da Constituição do Estado; a melhoria de condições geraes definiu se pelo brilho do acto da acclamação, cujo eco em todo o país e no estrangeiro restituiu a todos a confiança e a esperança de que, mantendo-se todos os poderes do Estado dentro da sua lei fundamental, o país o que pretende e deseja é que aquella lhe garanta: administração, liberdade e paz.

Aconselha o Digno Par que das manifestações externas de adhesão á monarchia se não deve abusar. Em pleno acordo com este modo de pensar, nunca o Governo provocou taes manifestações. Ellas teem brotado espontaneas da reacção que se tem operado em Portugal contra a ideia de necessidade de mudança de instituições, e tendo tambem não pouco contribuido para isso a sympathia inspirada pelo joven Monarcha e a confiança que a todos inspira a sua decidida vontade de cumprir a lei, e sempre a lei.

Não se pense que o que estou affirmando se baseia em intenções de cortesia ou lisonja palaciana; não é esse o meu feitio. É um facto por todos constatado e devidamente apreciado, devendo ainda, e a proposito, affirmar que não ha o menor risco de que este Governo seja o que em tempos se capitulava de um Governo palaciano. É um Governo que governa para o país, servindo com um Rei que só em igual intuição se inspira.

No dia em que surgisse o menor desacordo no modo de conseguir este desideratum, o Rei e o Governo saberiam qual o seu dever.

O Governo encontrou o país em pleno desassocego; tudo era anormal.

O attentado de 1 de fevereiro, que encheu de pavor e indignação toda a gente, a revolta armada, apenas suffocada, os odios politicos e quasi pessoaes em plena laboração dissolvente, uma enorme porção de presos politicos pejando os calabouços, a incerteza e a duvida em todos os espiritos, o credito do país arrastado lá fora, a ponto de ser preciso, para evitar desgostos, não tornarmos conhecida a propria nacionalidade, todos os elementos que ficam sempre em actividade perigosa depois de uma revolução, ainda mesmo quando vencedora, se manifestaram pelas mil formas desordeiras e insolentes que