70 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
ção de algumas disposições do decreto de 30 de outubro de 1868, quando aqui vier o bill de indemnidade. Insto porque venha quanto antes a respectiva proposta, porquanto não desejo que o governo permaneça em diciadura por mais tempo, na presença do parlamento.
Sr. presidente, no que o governo manifestou tambem falta de respeito pelas leis, foi na questão dos coroneis.
Esta questão dos coroneis é uma questão seria e grave, em que estavam já comprommettidos, quando opposição, os cavalheiros que se sentem n'aquellas cadeiras; a vistura, porém, foi o sr. João Chrysostomo, pelo seu cavalheirismo e abnegação. Eu vou mostrar como o governo, pelas opiniões de alguns dos actuaes srs. ministros, e pelos seus violentos discursos, estava altamente compromettido n'esta questão, sobre a qual tinha opinião formada de ha muito tempo. Um digno par que geriu honradamente a pasta da marinha fizera-se echo n'esta casa das doutrinas sustentadas com certa acrimonia na camara dos senhores deputados contra o sr. Fontes. Eu poderia ler aqui varios trechos d'aquelles celebres discursos, e fulminar com elles o governo. Prohibem-m'o os brios da minha dignidade. Não vão, pois, muito longe os tempos em que o sr. Fontes em ambas as casas do parlamento era atacado com violencia por ter gasto sommas enormes com o exercito, por ter dado reformas em grande escala. Fallava-se lhe na conta velha e na conta nova, nos quadros das differentes armas pejados de officiaes supranumerarios, na anarchia da legislação, nas commissões de codificações, que nada tinham feito, na parcialidade e protecção dada ás armas especiaes, no desfavor para com a arma de infantaria, injustamente aggravada pelas preterições successivas. Fallava-se-lhe em quantas faltas se podem imaginar, affirmando-se que s. exa. tinha introduzido a anarchia na legislação militar, que conservava por um simples aviso suspenso o decreto de 10 de dezembro de 1868, do sr. marquez de Sá, sobre promoções; emfim, que o sr. Fontes queria governar arbitrariamente, e não ter outra lei mais que a sua vontade.
Acrescentava-se que havia antinomia entre os decretos de 30 de outubro de 1868 do sr. Calheiros, e o decreto de 13 de dezembro de 1869 do sr. Maldonado, ambos com força de lei, e ambos em vigor hoje em virtude do decreto de 26 de janeiro de 1870, que revogou o decreto de 18 de dezembro de 1869 do sr. Lobo d'Avila, conde de Valbom, organisando a engenheria civil; e que o sr. Fontes queria esta confusão de legislação toara fazer promoções a sua vontade.
Eram estas as accusações feitas ao ministro da guerra do partido regenerador com a maxima acrimonia e violencia. E que fez o actual governo que o substituiu? Eu que tinha tambem a minha opinião compromettida, e que fazia parte d'essa cruzada, entendi que devia obrigar o governo a pôr em pratica as idéas com que fora combatido o sr. Fontes; e chamei, apenas o actual gabinete tomou posse d'aquellas cadeiras, a sua attenção para resolver a questão militar. Exigiram-no as conveniencias do exorbito e a propria coherencia. Havia antinomia entre e decreto de 30 de outubro de 1868 e o de 13 de dezembro de 1869, que lançavam confusão na legislação militar?
Porque não os revogaram logo, mesmo em dictadura, já que a tinham assumido para cousas insignificantes? Porque não revogaram o decrete de 22 de junho de 1870 que tinha trazido aquella confusão, ou querendo que ficasse em vigor, o decreto de 30 de outubro de 1868, porque não revogaram o de 13 de dezembro de 1869?
Tudo isto era facil; facilimo; era dever do governo fazel-o, porque a legislação de 1868 é dos reformistas, e a de 1869 dos historicos, hoje fundidos, e porque a opinião dos actuaes ministros estava compromettida a fazel-o.
Não se fez, pois, porque lhes convinha a anarchia na legislação para fazerem em grande escala tudo que tinham accusado no sr. Fontes.
Para que se conheçam bem as duvidas e as difficuldades que existiam, será bom fazer a historia d'aquelles decretos que hoje estão em vigor, lançando a confusão e a desordem na legislação que rege a arma de engenheria.
Em 1868, o ministerio de então era presidido pelo sr. marques de Sá da Bandeira, e o sr. Calheiros, ministro das obras publicas, reformou a engenheria militar pelo decreto de 30 de outubro de 1868 deixando a engenheria civil entregue aos districtos.
Este ministerio foi substituido em 1869 por outro presidido pelo sr. duque de Loulé. Esse ministerio querendo revogar o decreto de 30 de dezembro de 1868, fel-o por dois outros que se completavam, o decreto de 13 de dezembro organizando a engenheria militar, e o de 18 do mesmo mez organizando a engenheria civil. Seguiu-se a dictadura do sr. duque de Saldanha, que revogou logo o decreto de 18 de dezembro, sem revogar o de 13 do mesmo mez e anno. Como estes dois decretos se completavam, fica evidente que a publicação do decreto de 22 de junho de 1870 tinha trazido n'aquella legislação certa desordem e confusão, que era mister promptamente remediar. Que fez, pois, o governo actual a esta desordem, apesar de eu lhe chamar a attenção para ella?
Esta arma como se vê não era mais do que um artificio para derrubar o governo transacto.
Estava suspenso o decreto de 10 de dezembro de 1868 do sr. marquez de Sá sobre promoções? Estava suspenso esse decreto por um simples aviso publicado na ordem do exercito de 15 de janeiro de 1869? Accusavam o sr. Fontes de deixar suspenso por um simples aviso, aquelle decreto com força de lei, que continha os principios os mais luminosos, as disposições as mais sabias e a doutrina a mais justa e moral? Porque não o puzeram em execução? O que fez este governo, apesar de eu lhe lembrar as suas opiniões e compromissos? Deixou subsistir o aviso que o suspendia e fez promoções ás fornadas, sem se importar com o decreto suspenso, nem tão pouco com a contradicção das suas opiniões e incoherencia de seu proceder!
Sr. presidente, por este simples esboço historico vêem v. exa. e a camara que o governo tinha estudado a questão militar, tinha opinião firme e assentada, sabia de ha muito que a arma de infanteria estava altamente prejudicada; e conferenciando com o sr. ministro da guerra para fazer áquella arma a justiça que lhe era devida, tudo o que se seguiu foi resultado d'essa conferencia.
O governo podia por um simples aviso suspender tambem o effeito do aviso sobre o decreto de 10 de dezembro de 1868, e ter assim em vigor uma lei de promoções que tanto elogiava. Não o faz porque entendeu que com a confusão e a desordem poderia fazer mais favores. O governo sabia e conhecia bem o alcance do decreto da reforma do coronel Affonso de Campos; se se recusou, se não quiz tomar a responsabilidade d'elle é porque achou um ministro altamente cavalheiroso, que se fez espoataneamente victima para salvar esse ministerio pusilhamine, que para ahi está sem convicções, nem systema, O ministerio que sabia evidentemente o alcance que ha de ter aquelle decreto, porque o sr. João Chrysostomo lh'o tinha dito, o ministerio que não tinha feito uma lei de promoções, mas que queria indemnisada a arma de infanteria dos prejuizos que tem soffrido, o ministerio que sabia que o decreto do coronel Affonso de Campos aproveitaria a mais vinte coroneis, segundo as declarações do sr. João Chrysostomo, logo que viu que a imprensa se pronunciava contra, similhante medida, atirou ás feras o honrado ministro da guerra, consentindo até que elle fosse invectivado na sua propria imprensa.
É muito, e de mais! O sr. João Chrysostomo deve estar satisfeito, vendo que todos apreciam a sua honradez, probidade o abnegação, ao passo que censuram a falta de lealdade do governo para com s. exa., politica acanhada e pusilanimo dos seus desleaes ex-collegas. O sr. João Chrysostomo devo estar satisfeito, porque emquanto todos apre-