92 DIARIO DA CAMARA DOS DIGOS PARES DO REINO
adversarios, notar os seus erros, e tornar difficil ou impossivel no futuro a Bua ascenção ao poder. O seu fim unico foi procurar conhecer se havia erros, para os emendar; se se tinham introduzido abusos nos serviços publicos, para quanto possivel lhes por um termo; e nunca, repito, podia ter em vista deprimir os seus adversarios...
(Susurro nas galerias.)
O sr. Presidente: - Peço ás galerias que se contenham em silencio. (Muitos apoiados.)
O Orador (continuando): - São de ordem diversa os inqueritos a que o governo, não só o actual, mas aquelle a que v. exa. presidiu, e até o proprio ministerio regenerador, mandou proceder.
No relatorio que precede o decreto que nomeou a commissão de inquerito ás secretarias de estado, declara-se muito expressamente qual foi o pensamento que animou o governo quando mandou proceder a esse inquerito. Diz esse relatorio:
"Instituindo esta commissão não têem os abaixo assignados outro intuito que não seja é de instruir a nação sobre o verdadeiro estado da fazenda e da administração publica, e dispor dos subsidios necessarios para que se possam, com perfeito conhecimento do assumpto, apreciar as difficuldades, do presente, e afastar futuros e, acaso, imminentes, perigos.
"Dando logar na commissão aos representantes de todas as opiniões politicas, e a pessoas graves e imparciaes, alheias a contendas partidarias, foi intenção do governo afiançar á verdade a sua livre e genuina manifestação, e assegurar ao paiz que não é emprehendimento de calculada malevolencia o trabalho do que se trata, senão uma investigação seria, elevada, conscienciosa, indispensavel á exacta apreciação dos factos."
N'esta commissão assim nomeada figuravam cavalheiros illustradissimos, membros dos diversos partidos em que se subdivide a politica militante n'este paiz.
Bastará citar entre elles os nomes honrados do sr. Vicente Ferrer Neto de Paiva e do sr. conde de Castro, o do representante de uma familia de nobres tradições pela auctoridade de caracter, illustração e probidade, refiro-me ao sr. conde de Rio Maior; e tantos outros que não designarei para não alongar estas citações; mas que todos gosam da maior respeitabilidade, que de certo não sacrificariam acceitando a nomeação do governo, se suspeitassem sequer que o pensamento deste tinha alcance diverso do que tão claramente se encontra formulado no trecho do relatorio de que acabo de fazer a leitura á camara.
Procedeu-se assim ao inquerito, e aos seus resultados deu-se a necessaria e conveniente publicidade; não se comprehendendo sequer como hoje possa insinuar-se que taes resultados não existem. Da realidade da sua existencia darei por minha parte documento pedindo desde já licença para chamar a attenção da camara para algumas das conclusões dos relatorios diversos da commissão de inquerito.
Mas antes de o fazer, recordarei ainda uma vez que não houve só o inquerito ás secretarias, um d'esses inqueritos, e dos mais completos, é aquelle a que o governo regenerador mandou proceder em 1878, com relação ás obras da penitenciaria.
Prefereria, repito, não ter de me occupar d'estas questões; nem sequer uma palavra teria soltado a tal respeito se infelizmente o sr. Serpa me não tivesse chamado a este campo, fazendo allusões menos convenientes ao governo e aos seus amigos; e chegando a proferir, a proposito da penitenciaria, uma expressão desgraçada, a de assassinos, a de calunmias e cumplices de calumniadores!
Mas, sr. presidente, confesso-o a v. exa. e confesso-o á camara, quando ouvi s. exa. o digno par entrar n'um caminho por tantos titulos infeliz, julguei por momentos que não era o governo que elle queria atacar: pareceu-me que miraram a outro alvo as suas palavras, a v. exa. e aos seus collegas no ultimo ministerio a que v. exa. presidiu é que evidentemente ellas se referiam.
Foi essa situação que primeiro procurou averiguar a verdade dos factos com relação á penitenciaria.
Foi o digno presidente d'esta camara, como chefe do governo de então, que animado por aquelle espirito de justiça de rectidão e de muito zêlo pelo bem publico que sempre o distinguiram, (Apoiados.) quem primeiro levantou officialmente esta questão.
Pois, sr. presidente, por um facto cuja responsabilidade, que v. exa. não declina, cabe inteira ao gabinete a que v. exa. presidiu, é que nós somos accusados pela fórma que a camara toda presenciou, chegando a lançar-se-nos em rosto o termos feito uma victima!
Não insistirei eu n'este ponto. Repugna-me fazer qualquer outra referencia a uma allusão infeliz, que talvez possa ferir o proprio partido regenerador. Mas ácerca da chamada questão da penitenciaria, careço indispensavelmente de refutar asserções que s. exa. formulou, e das quaes julgou poder derivar conclusões que são absolutamente inexactas.
Disse o digno par, reportando-se ao relatorio da syndicancia realisada ás obras da penitenciaria pela commissão de distincios engenheiros nomeada para esse fim pelo governo regenerador, que a conclusão principal dos trabalhos d'essa commissão fôra, que e edificio da penitenciaria custara até ao dia 30 de abril de 1877 um preço ainda inferior áquelle por que a commissão avaliara as obras no mesmo edificio realisadas até esse dia.
É certo que esta conclusão se lê a paginas 5 do relatorio, asseverando-se ali:
1.° Que o valor calculado dos trabalhos executados até ao referido dia 30 de abril de 1877 é de 754:655$664 réis, menos 71:751$620 réis (valor dos materiaes em deposito), ou 382:934$044 réis;
2.° Que tendo sido a despeza realmente effectuada com as referidas obras, até ao dito dia, não incluindo o valor dos materiaes em deposito (71:751$620 reis) de 660:546$158 réis, se encontra ser esta despeza inferior em 22:396$886 réis á despeza calculada.
Mas não é só isto o que se lê n'aquelle documento; vire s. exa. a pagina, e n'esse relatorio que lhe não póde ser suspeito, verá que a penitenciaria de Louvain, por cujo modelo se construiu a nossa, não custou mais de 537$427 réis por cella; e, embora se acrescente que realisada a obra em 1877, pela maior carestia da mão de obra e do material, não teria custado menos de 892$12S réis por cella, é certo que se ainda assim, e na peior hypothese, multiplicassemos as 784 cellas da penitenciaria de Lisboa por 892$128 réis, o custo total d'aquelle edificio não deveria ir alem de 700:000$000 réis.
Mas, sr. presidente, os 700:000$000 réis que a commissão já previa que haviam de ser excedidos, estão hoje em 1.113:000$000 réis, e a penitenciaria que ainda não está concluida carece já de obras de reparação; cada uma das suas cellas não nos custa 537$000 réis, ou mesmo 892$000 réis como a de Louvain, mas custa-nos a enorme quantia de 1:400$O0O réis; ora isto é acceitavel, e estamos nós na situação de gastar mais do que a Belgica? E assevera-se-nos como consolação que houve maior luxo na construcção do edificio portuguez! Mas esse luxo foi um erro, e bem melhor fôra que o não houvesse!
E, sr. presidente, como não hão de levantar-se duvidas nos espiritos, se nós vemos que entre os orçamentos das obras e o custo das mesmas obras se dão constantemente differenças como as que se indicam no relatorio da commissão? Poderá haver maior erro de administração do que emprehender obras collossaes, illudindo primeiro a opinião com uma supposta moderação de custo, que os factos mais tarde se encarregam de desmentir pela fórma mais completa?
As obras do lazareto de Lisboa orçadas em 200:000$000 réis, custaram 829:000$000 réis; com as da nova alfan-