8 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
entre os dois partidos, tem sido mais de- r graduação que de principios.
É possivel que isso aconteça em Portugal; o que é certo é que existem sempre graduações assaz determinadas entre os dois grandes partidos.
Accusam-nos hoje de nos acharmos unidos.
Pois bem!
Tambem na propria Inglaterra, e só no espaço de um seculo, os dois partidos, duas vezes suspenderam hostilidades e se colligaram. De uma das vezes conseguiram restaurar a monarchia, da outra restabelecer a liberdade.
Todos nós sabemos que os partidos teem tido erros e defeitos, mas é de justiça relembrar tambem alguns serviços que tem feito ao país, e, quanto a mim, não são pequenos.
Mas o Digno Par a quem me estou referindo não só condemnou os partidos, fez mais alguma cousa: entende que no meio da sua agonia é necessario baralhá-los.
Ah! Sr. Presidente, baralhar os partidos!? Francamente, na actual conjuntura, menos do que nunca, não é isso o que os partidos teem a fazer.
Eu entendo que os partidos teem, no momento actual, alguma cousa a fazer. Devem estar attentos para a situação presente e para as condições em que se encontra o país.
Não gosto de falar da minha pessoa e sobretuda citar-me a mim proprio, mas, ao ouvir esta increpação contra os partidos, lembrou-me que já uma vez, na Camara dos Senhores Deputados, ao abrir a discussão do projecto de resposta ao Discurso da Coroa, de que era relator o Digno Par que se me vae seguir, isto haverá doze annos, dizia eu. . .
O Sr. João Arroyo : - Creia que ha doze annos V. Exas. estavam fora da Camara. Deve haver engano.
O Orador: - Em 1894...
O Sr. João Arroyo: - Então ha quatorze annos.
O Orador: - De facto não foi ha doze annos, foi ha quatorze.
O tempo passa tão depressa!
Mas V. Exa. não se lembraria das minhas palavras, se eu as não recordasse.
O Sr. João Arroyo: - Eu fiz esta observação, porque ha 12 annos não podiam estar V. Exas. na Camara. Foi quando a Camara se reuniu na Academia Real das Sciencias e que approvou uma serie de medidas ditatoriaes, que V. Exas., os progressistas, haviam de deitar a terra e que depois conservaram no anno seguinte.
O Orador: - É verdade.
E abro um parenthesis para responder ao Digno Par.
Em 1896 eu não tinha a honra de pertencer á Camara dos Senhores Deputados.
Perdoe-me o Digno Par, mas a verdade é que essa Camara não legislou só; teve de ratificar e confirmar e até com modificações os decretos da chamada ditadura de então.
Deu o bill de indemnidade ao Governo, e depois alterou alguns dos decretos publicados.
Com estas palavras quero apenas defender-me de uma pequena observação. Não quero neste momento referir-me ao passado. (Apoiados).
Disse o Digno Par que o partido progressista protestou deitar abaixo todos os decretos ditatoriaes e que os conservou.
Ahi ha uma pequena lacuna que é preciso preencher. É com isso mostrarei ao Digno Par que estou ainda em perfeita coherencia com o que então se praticou.
Eu disse e repito que um Governo pode constitucionalmente revogar decretos, embora se lhes tenha querido attribuir força de lei quando houvessem sido publicados sem incervenção das Côrtes. Tenho-os como simples actos praticados contra a Constituição. Quando porem taes providencias já houverem sido confirmadas pelas Camaras, então não, porque, nessas circumstancias, são leis e ao executivo não compete revogar leis.
Quando nós entrámos para o Ministerio, em 1897, tinha-se dado esse caso. E logo no nosso primeiro acto publico tivemos o cuidado de declarar que não podiamos revogar immediatamente esses decretos, porque eram, leis que estavam sanccionadas pelas Camaras, mas que nos reservavamos para irmos ás Côrtes pedir a sua revogação. E o Digno Par ha de lembrar-se que muitos decretos, apesar de convertidos em leis, foram revogados. Lembrarei o Codigo Administrativo, a lei eleitoral, a circunscrição judicial e administrativa, e que nós caimos exactamente na occasião em que eu, em substituição do meu honrado chefe, o Sr. José Luciano de Castro, que então se achava doente, defendia a reforma Constitucional (Apoiados) que devia acabar com os chamados ditadores. E não acabarei este ponto sem accentuar que, se não considero a simples publicação de leis pelo executivo como actos ditatoriaes, não deixo de comprehender que haja ditaduras e ditadores.
Eis a nossa culpa!
Fechado este parenthesis, voltemos ao assunto de que me estava occupando.
Dizia eu na Camara dos Senhores Deputados:
"Eu sou d'aquelles, Sr. Presidente, que pensam que o .systema monarchico, hereditario e representativo, é ainda o regimen que nas circunstancias actuaes melhor satisfaz ás necessidades publicas internas e externas d'este país.
Ha nas instituições representativas nessa ponderada alliança de tudo quanto a tradição tem de mais defensavel em a democracia moderna, justa, sensata e illustrada, campo assaz largo para dar satisfação a todas as reclamações ; sem procurar correr aventuras arriscadas, cujo alcance ninguem poderia medir, e que serviriam talvez só para acrescentar a gravidade da hora presente.
Todos os portugueses de boa fé podem, pondo de parte aspirações mais seductoras do que praticas e positivas, concorrer com a sua cooperação, com o seu conselho, com a sua critica para o- bem da patria, que é de todos e a todos- exige nesta hora graves e ponderosos sacrificios.
E esses sacrificios não são só os de ordem material, são sobretudo os de ordem moral, que consistem na subordinação de vistas individuaes, de preconceitos de escolas, de ideias irrealizaveis, a alguma cousa mais alta que exige o concurso de todos nós, e que é o bem da patria.
Por mim pessoalmente o digo, bem alto e bem claro, ser-me-hia hora de verdadeira satisfação aquella em que os homens e os acontecimentos permittirem que o partido progressista, a que me honro de pertencer e que occupa a, extrema esquerda dentro das instituições, pudesse alargar as suas fileiras até comprehender aquelles que, como tem acontecido lá fora e está succe-dendo agora perto de nós, pondo de parte, ao menos na presente opportunidade, ideias irrealizaveis, quisessem ajudar-nos na obra nacional do resurgimento da patria portuguesa".
Um grande poeta oriundo de familia legitimista e que mais tarde passou para o extremo opposto, interrogado por um velho amigo de casa, aristocrata de antiga, raça, por que havia mudado, respondeu: J'ai grandi! Pois os partidos devem ter muito em conta que o país, em volta d'elles, tambem cresceu. Apparecem novas necessidades, de toda a ordem. Façam os partidos por se accommodar a ellas, amoldando-se ás novas circunstancias. É esse o seu dever, e, faço-lhes a justiça de o crer, é o seu desejo.
Surge na palavra do Digno Par novo capitulo de censura contra os partidos.