APPENDICE Á SESSÃO N.° 15 DE 5 DE JUNHO DE 1908 19
Neste momento não convem tratar de questões que agitem os espiritos.
Nesta occasião devemos de preferencia olhar para as nossas finanças e para o nosso dominio colonial.
Só os que lá estiveram, como eu, e que viram o atraso em que tudo se encontrava em tempos, é que podem dizer o que se tem feito e ainda o que se poderá fazer e quanto se tem progredido.
Chegou a desesperança a ponto de se falar na venda das colonias, sem se pensar que a manutenção d'ellas está ligada á nossa autonomia.
Não posso deixar de confessar que se tem feito muito, mas é preciso proceder com mais cautela, e evitar que os melhoramentos a effectuar venham a pesar duramente no orçamento da metropole, e embora as colonias tenham em geral aumentado exuberantemente os seus rendimentos, desequilibram-se essas vantagens fazendo pesar nos seus orçamentos verbas para exigencias de serviços que ás vezes podem tornar se onerosos, e que quasi sempre são desnecessarios.
Agora, Sr. Presidente, passo á reforma da policia, a que eu me tenho referido ha muitos annos em discursos feitos nesta. Camara e na outra, pedindo muitas vezes a sua substituição pelo elemento militar, poupando-se assim as verbas importantes que se despendem com ella e que hoje, mais do que nunca, estou convencido da necessidade de se empregarem nesse sentido todos os esforços e actividade, por isso que essa instituição está hoje muito mal vista pela opinião publica, emquanto que o exercito, não só pela sua disciplina, como pelos seus serviços no ultramar, de que se tem desempenhado sempre com justos louvores de todo o país, goza do maior conceito de todo o povo, ou antes de toda a nação.
Sobre este ponto nada mais direi. Resta-me tratar do Supremo Conselho de Defesa Nacional e da organização do exercito.
Levemente tocarei neste ponto e tão somente a elle alludo, porque o Sr. Presidente do Conselho, respondendo a um Digno Par e meu amigo, disse que a sua opinião era que esse aleijão, de signando assim o Supremo Conselho de Defesa Nacional, fosse removido.
Essas palavras, pronunciadas pelo Sr. Presidente do Conselho, doeram-me e penso que S. Exa. nessa sua frase foi suggestionado talvez pelo espirito do seu antigo chefe; comtudo faço-he a justiça de crer que essas palavras não podem de maneira alguma referir-se aos officiaes que constituem o Supremo Conselho de Defesa Nacional.
Eu fui opposto nesta Camara, e ainda hoje sou, á organização d'essa institui: cão, 'mas tenho obrigação de dizer tambem que algumas vantagens se tem conseguido com a sua criação, entre ellas a de conciliar opiniões adversas que tem havido entre aquelles que o compõem e foram Ministros da Guerra, e tem ainda a vantagem de fazer ver e observar de perto as opiniões escritas ou pronunciadas em publico por parte d'aquelles que tinham uma certa preponderancia dentro da classe militar convencendo-me que não errei, porque estou perfeitamente em harmonia com os principios que sempre preconizei, a respeito de organização do exercito os de Levai e Von Der Goltz.
É absolutamente indispensavel que o serviço obrigatorio seja uma verdade, que as remissões não existam e para se conseguir a obediencia a esse preceito é necessario fazer-se uma reorganização do exercito que nos leve a podermos de pronto conseguir a mobilização do nosso exercito, para assim podermos lutar em defesa do nosso país, e não uma organização rachitica, para poder dar-se comnosco o mesmo que se deu com o Japão, que conseguiu dominar uma nação collosso, como é a Russia, mobilizando as forças vivas da nação.
Se esses são os trabalhos que o Supremo Conselho de Defesa Nacional tem em vista, estou convencido que modificado o principio attentatorio da constituição politica que provém d'essa ditadura que todos reprovamos, modificado esse rincipio anti constitucional, em virtude do qual era imperativa a deliberação d'aquelle conselho o que nós. já temos conseguido harmonizar com a lei organica, o conselho poderá prestar serviços analogos aos das commissões que derogou.
Dito isto, e não querendo alongar por mais tempo as minhas considerações, desejo mais uma vez protestar contra todos os actos da ditadura, que gerou acontecimentos que podiam fazer perigar a nossa independencia, e levo esse meu protesto até o ponto de querer que todos os decretos publicados durante ella, contrarios á Constituição do Reino, sejam banidos por completo, da nossa legislação.
Desejo que o nosso codigo fundamental seja por tal forma respeitado, que possamos gozar de todas as regalias que os nossos maiores nos legaram naquelle perfeito diploma.
Sr. Presidente: protesto contra os factos que alarmaram o país e que nos deram consequencias tão funestas.
Faço este protesto como cidadão, como membro do Parlamento e ainda como militar, porque eu ligo esses acontecimentos á perda da nossa autonomia.
Penso assim porque entendo que o unico systema que pode servir ao nosso país é o da monarchia representativa, que representa a paz ea conciliação entre as ideias avançadas e reaccionarias.
Não posso deixar de estigmatizar o execrando attentado que se praticou no nosso país, á luz do dia. Crime hediondo e nefando!
Estou, habituado desde a minha mocidade, alanceada por diversos desgostos, a espectaculos verdadeiramente emocionantes: a ver morrer a meu lado, nos sertões de Africa, os meus companheiros de armas; a saber que os selvagens deceparam a golpes de machado a cabeça de um irmão meu, que depois esses negros espetaram no pau mais alto da aringa; a sentir perto o esvoaçar das azagaias; mas se taes factos me causaram sempre a maior das impressões de sentimento, não deixei nunca, por isso, de os encarar serenamente como acontecimentos de ordem natural e que servem sempre para aquilatar o valor do inimigo, embora elle seja o negro.
Para os factos, porem, que se deram no dia 1 de fevereiro, não encontro em mim igual serenidade para os encarar e causam-me um horror tamanho quanto é certo não saber explicar a razão por que no nosso país se desembestaram feras humanas sobre dois cidadãos inoffensivos que assassinaram na rua publica.
Estes tragicos acontecimentos enchem-me de assombro e alevantam a reprovação geral.
Peço ao Governo para que se empenhe, como de certo se tem empenhado, em que o respectivo processo criminal continue com toda a actividade no sentido de se descobrirem os criminosos cumplices.
Conceda-se amnistia aos que d'ella forem dignos, mas que a majestade da justiça se exerça desassombradamente.
Attenda o Governo ás questões de ordem publica, garantindo as liberdades a todos os cidadãos.
Torne o Codigo de Justiça Militar mais hodierno, e não descure o Governo as questões da força publica e não deixe por forma nenhuma que a organização militar não siga o caminho que deve seguir, para não acontecer como á Grecia, que perdeu a sua independencia por descurar a organização militar.
E á Persia que tinha grandes thesouros amontoados, o que não impedia que o ferro dos soldados romanos lhe despedaçasse, os escudos reluzentes e ao mesmo tempo as armas dos seus soldados. (Vozes: - Muito bem).