238 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
das está a consciencia. Não quero com isto lançar censura áquelles que têem opiniões diversas, pois que seguem os dictames da sua consciencia tambem; mas o que quero é justificar a minha posição pouco aggressiva em frente do governo; fallam vozes mais auctorisadas, as dos amigos do governo, calo a minha.
Peço desculpa á camara por trazer este assumpto para a discussão, mas não podia deixar de fazer sensivel este facto notavel de vermos, por motivos de consciencia, afastarem-se estes ou áquelles amigos dedicados do governo, que são coherentes com o que têem tantas vezes repetido.
Á camara por certo está lembrada do celebre parecer sobre o orçamento de 1876, assignado pelos srs. Casal Ribeiro, Mártens Ferrão, Custodio Rebello de Carvalho, Carlos Bento, Augusto Xavier Palmeirim, Barros e Sá, e conde de Valbom, que diziam em 14 de março de 1876, em um tão notavel documento official, qual era o parecer da commissão de fazenda d'esta casa, que aqui tenho presente, o mesmo que lhe ouvimos agora pela bôca do sr. Carlos Bento, e esperamos ouvir dizer ao sr. Casal Ribeiro, como s. exa. já o fez annunciar mais de uma vez.
O que diz esse documento? Diz o seguinte.
(Leu.)
Sr. presidente, seria demasiadamente longo ler tudo quanto diz este documento. Todavia, não posso deixar de pedir licença á camara para ler mais algumas, ainda que poucas, palavras.
(Leu.)
Parece-me, portanto, que não basta fazer bons orçamentos; é necessario mostrar mais clara e francamente a verdade d'elles.
O governo, porém, afastou-se d'esta norma administrativa, pois durante dois annos nem sequer ao menos mostrou em palavras, nos seus relatorios, que seguia estas mesmas doutrinas. Esqueceu-se totalmente d'ellas, e veiu dizer ao parlamento que não podia fazer economias!
Tenho pena que o sr. Serpa, ministro da fazenda, não esteja presente, porque desejava responder á asserção que s. exa. avançou, de que não póde haver grandes economias sem grandes emprestimos. De sorte que é necessario estarmos a contrahir emprestimos para fazermos economias!
Ora isto, sr. presidente, está abaixo, muito abaixo do merito de s. exa., e d'ahi vem o podermos dizer que tal é a posição do sr. ministro, que força a sua intelligencia robusta, a ponto de avançar proposições d'estas, e faz-nos suppor que nada poderemos esperar deste governo, que é alcunhado de esbanjador pelo proprio ministro da fazenda, que já não acha economias a fazer senão nas percentagens dos emprestimos. A palavra esbanjador foi aqui trazida pelo sr. Serpa. Ninguem lha lembrou; lembrou-a s. exa., vindo buscar á opposição uma palavra que lhe tinha sido dirigida. Se lha não indicasse a consciencia, não a vinha cá buscar.
Desculpe-me, portanto, o sr. presidente do conselho, em empregar a mesma palavra do seu collega. Mas, nós de certo que não podemos ficar estaticos diante d'estes esbanjamentos e despezas extraordinarias, e do desprezo pelos conselhos dos homens que entendem dever mais a si proprios e ao paiz do que ao seu partido; dos homens de governo, como disse o sr. Carlos Bento, os quaes se têem afastado d'aquelles que desprezaram os seus conselhos.
A esta opposição que tem dirigido o debate chamo-lhe tutela ministerial, como aqui lhe chamei em 1876. E esta opposição que tem os meus fracos recursos á sua disposição, a fim de ver se póde tirar das mãos dos srs. ministros a tutela d'este paiz.
Vou, pois, procurar um meio de conciliação entre o goveno e sua antiga maioria.
(Interrupção de alguns dignos pares.)
Não sei se cáe, mas ninguem deseja mais do que eu que elle cáia, porque desde o primeiro dia em que o governo sé organisou eu fui logo opposição, por isso mesmo que sabia que o principio fundamental da politica do sr. presidente do conselho era "que o povo póde e deve pagar mais", e s. exa., ainda ha poucos dias, teve a bondade de o repetir. E certo que s. exa. disse que as lições da historia, o tinham amostrado, e mostrou-se arrependido.
Perdoe-me s. exa. que lhe diga que não acreditei na sua penitencia, ainda mesmo quando alguns acreditavam no seu arrependimento, porque acima d'este está a sua vontade o estão os elementos que o cercam.
S. exa. com muito boas intenções pôde suppor que eu ia trilhar outro caminho; mas eu que tinha a experiencia dos factos não acreditei na sinceridade dos actos, posto que acreditasse na sinceridade da palavra.
Sr. presidente, quantas vezes nós confessâmos as nossas culpas, imploramos o perdão e promettemos a emenda? Quantas vezes nos tem isto acontecido? São mais poderosas as paixões e as Índoles do que a rasão e a vontade. Eu, sr. presidente, não acreditava na penitencia por causa das más companhias, o sr. presidente do conselho continuava a servir-se de todos os elementos politicos e a empregar todos os meios que empregava nas anteriores administrações.
Eu agora não sou opposição, sete annos me têem feito ver que por este caminho nada consigo para o paiz; demais, alterada constantemente a feição politica d'esta camara a favor do governo, que fazer? Vou tentar por um momento ser conciliador; quero ver, sem quebra da minha dignidade politica, se me chamo ministerial (Interrupção de varios dignos pares,); vou fazer um esforço em favor do meu paiz. Vou já apresentar uma moção, que me parece me colloca ao lado do sr. presidente do conselho, e que me ha de fazer considerar ministerial.
Sr. presidente, deploro bastante a ausencia do sr. Serpa, e tanto mais, quanto todos sabem da affeição intima que nos liga desde tenra infancia; apesar d'isso, não deixarei de dizer algumas palavras, que lhe constarão pelo Diario d'esta camara, visto que esta proposta mais se dirige a elle do que a outro qualquer ministro.
Sr. presidente, com bastante mágua o digo, não ha nada mais triste na vida do homem do que a desillusão ácerca, das qualidades das pessoas que nos honram com a sua amisade.
Quando o sr. Serpa subiu ao poder, felicitei-me e felicitei o paiz. Era o cavalheiro que, pela imprensa e por muito tempo nas cadeiras da opposição, tinha combatido a politica do sr. Fontes. Era o cavalheiro, cuja illustração, eu, que com elle lidava desde creança, não podia desconhecer. Era o cavalheiro, que, occupando uma das cadeiras do ministerio, por mais de uma vez mostrou ser grande auctoridade para governar.
Dizia-se e sabia-se que s. exa. tinha entrado violentamente para o ministerio, encarregando-se da pasta da fazenda, e que o sr. Fontes tinha saído d'ella sem violencia nenhuma, porque não podia arcar com as exigencias que todos os dias lhe faziam, para despezas extraordinarias.
Dizia se que sr. Fontes tinha ido procurar este auxiliar para lhe lembrar as taes lições da experiencia.
As palavras do sr. Serpa estavam em harmonia com esta opinião. Sei que s. exa. no seu relatorio mostrou querer acabar com a divida fluctuante e auctorisára-se em aconselhar a mais stricta e severa economia no governo do estado, não se compromettendo a apresentar um saldo positivo da receita sobre a despeza, como o sr. presidente do conselho tinha feito, mas procurando por meios mais praticos que theoricos o equilibrio da fazenda.
Opposição e governo não podiam deixar de lhe reconhecer a capacidade precisa para tão momentoso fim.
Eu, com as melhores disposições de amigo, acreditei que aquelle cavalheiro havia de realisar tudo quanto o sr. presidente do conselho tinha promettido, e que estava até nas suas idéas e nas suas aspirações. Mas, oh! sr. presidente, que desillusão! O sr. Carlos Bento já aqui mostrou em lin-