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10 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Pode S. Exa. estar certo de que eu hei de faiar com o meu collega da Fazenda; e acrescentarei que a minha opinião concorda com a do Digno Par.

Tenho dito.

O Sr. João Arroyo : - Sr. Presidente: pedi a palavra, não para me referir nesta altura da sessão á questão dos adeantamentos nem ao dialogo do Sr. Ministro da Guerra com o Digno Par Sr. Alpoim.

Parece que o Sr. Conselheiro Sebastião Telles se agastou um pouco com aquelle Digno Par.

S. Exa. não comprehendeu as palavras do Sr. Alpoim ou fingiu não as comprehender.

Mas deixemos isso, que já passou. Pedi a palavra para tratar de outro assunto - o que foi versado entre o Digno Par Sr. Baracho e o Sr. Ministro da Guerra.

Sr. Presidente: no momento presente da sociedade portuguesa, em que das cadeiras do poder se grita todos 'os dias a necessidade de proceder-se á acalmação dos espiritos e dos temperamentos, que possa conduzir a uma vida de normalidade funcional, não posso deixar de tomar a palavra para abordar a parte em que o Sr. Ministro da Guerra, no seu discurso, se occupou da syndicancia sobre os acontecimentos de abril. A esse respeito tinha o Digno Par Sr. Baracho feito considerações" sensatas e verdadeiras.

Não censuro o Sr. Ministro da Guerra por S. Exa. ter procurado desculpar o general syndicante, visto ser essa a attitude propria de um Ministro em relação aos seus subordinados.

A syndicancia é da responsabilidade do Governo, e a escolha do syndicante devia ter sido da iniciativa do Sr. Ministro da Guerra.

Tambem nada tenho que replicar ás palavras do Sr. Ministro da Guerra relativamente á categoria do syndicante.

Porem, nada d'isso altera a verdade, justeza, ou justiça que possam haver ou deixar de haver nas considerações do Sr. Conselheiro Sebastião Telles. Quando vi que S. Exa. ia referir-se a uma syndicancia que entende com os acontecimentos que mais teem provocado, já não digo a attenção da curiosidade publica, mas o espanto da capital, imaginei que, embora com sacrificio, acabaria por collocar-se ao lado do Sr. Baracho.

Mas o Sr. Ministro da Guerra respondeu com muito mais calor do que aquelle que S. Exa. costuma pôr nas suas orações parlamentares.

Pediu que a acção da justiça recaísse implacavel sobre todos os culpados, quaesquer que fossem, e a sua voz elevou-se então indignada e nervosa.

Apoiado! Eu tambem quero a maxima imparcialidade. Apoiado! Mas é preciso ver se o caminho seguido é o mais proprio e conveniente para conseguirmos esse fim.

Não vou collocar o Sr. Ministro da Guerra em opposição com o que disse o Sr. Baracho. Vou confrontar as palavras de S. Exa. com o texto da syndicancia d'esse official general, que não tenho a honra de conhecer, mas a quem presto a homenagem a que tenham direito as suas qualidades pessoaes.

No momento, porem, em que se tratava de occorrencias que originaram 14 mortes e quasi 100 ferimentos, exigia-se uma syndicancia, não para julgar, mas para inquirir, e para isso é preciso imparcialidade, não partidarismo; espirito de independencia e não de proselytismo; um investigador dos factos e não um defensor dos syndicados; um apuramento do que se julgasse ser a verdade, e não uma cousa que pode considerar-se o estandarte de um partido, o programma de uma ideia, o desenvolvimento de uma theoria; não uma cousa que, por forma alguma, pode representar a determinação de um estado de espirito de imparcialidade e de justiça.

Sim, eu estou de acordo com o Sr. Ministro da Guerra na independencia que o julgamento deve ter, mas não estou de acordo com a existencia do partidarismo da syndicancia; estou de acordo em que se deve fazer justiça igual, mas não em que um official general procure provar que se tentava denegrir a integridade do exercito português, que ninguem atacou, é ainda, por cima, venha offender os legitimos direitos politicos dos cidadãos e até da imprensa.

Sr. Presidente: ninguem, desde os arraiaes mais conservadores até aos mais avançados, tem negado o elogio, o encómio, a apotheose devidos em geral ao exercito português.

Seria injustiça; mais ainda, seria ingratidão.

Mas vejamos, Sr. Presidenta, vejamos como se apresenta o syndicante.

Imagina V. Exa. que elle vem relatar ao Governo como os factos se passaram ?

Não, senhor.

O syndicante - caso unico em qualquer circunstancia! - prefacia o relatorio dos acontecimentos com uma longa exposição de caracter geral, theorico, sobre quê?

Sobre as glorias do exercito português, que ninguem discutiu, sobre o prestigio da forca armada portuguesa, que ninguem ainda poz em duvida.

Começa por estes termos:

Como militar que sou membro d'esse exercito glorioso que é hoje e será sempre mais seguro penhor de integridade da Patria, todo o meu empenho consistirá em predispor benevolamente o espirito de V. Exa.

Predispor?

Então o Sr. General Gouveia foi nomeado syndicante para predispor em favor de quê, ou de quem?

O Sr. General Gouveia foi nomeado syndicante para criar uma atmosphera de favor?

Predispor é dispor a favor.

Predispor!

Quem o encarregou de tal? Quem o encarregou de fazer o elogio, aliás escusado, do exercito português? Quem lhe deu a missão de procurar collocar aquelles que atacaram os abusos da força em õ de abril na posição de pretenderem denegrir o brilho do exercito ?

Pois então é justiça, é imparcialidade começar um syndicante por dizer que o seu primeiro empenho vae ser predispor benevolamente o espirito de S. Exa. e de todos aquelles que lançam gravissimas accusações contra determinada força do exercito?!

Então elle vinha illudir S. Exa.?

Então elle vinha procurar alterar a normalidade do espirito de S. Exa.? modificar, de alguma maneira, a disposição de espirito de todos aquelles que tivessem de julgar?

Se fez isto, então esse official provou que não tinha a serenidade precisa para inquirir imparcialmente.

Mas continua o syndicante:

"Tem-se falado muito na educação da policia; a educação do povo é que devia ser cuidada por outros processos que não os empregados pelos jornalistas e oradores avançados, que nas columnas das gazetas, ou na tribuna dos comicios, procuram adular as massas populares, lisonjeando-lhes os defeitos, explorando, como mercadores da politica, as invejas e despeitos, excitando ao odio e ás represálias, sem repararem, no ardor do seu empenho, que podem ser tambem victimas da irritação que provocam, como o mineiro inconsciente que, ao cavar mais fundo no bloco do minerio, não prevê o desmoronamento que o ameaça "

Sr. Presidente: eu não estou aqui como representante nem como procurador official da imprensa portuguesa, mas protesto energicamente, vehementemente, contra isto de lançar sobre uma nobre, instituição as mais injustas censuras, de attribuir-lhe intenções que ella não tem, de denegrir a reputação, a fama e a gloria do exercito português.

Protesto contra este facto, que não é de um imparcial, de um justo, de um tranquillo syndicante, mas simplesmente de um partidario, de um proselyto, de um apaixonado, que, antes de expor aquillo a que elle chama a verdade dos acontecimentos, quer predispor o animo de quem tiver de julgá-los.