4 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
de entregar os seus generos por inferiores preços, aggravando a situação. Para V. Exa. avaliar bem o espirito de especulação, basta dizer-lhe que de uma proposta sei eu para 100 pipas de vinho da colheita proximo, a 180 réis cada 20 litros!!!
Desculpe me V. Exa. o incommodo e creia-me com particular consideração - De V. Exa., velho amigo e obgmo. = Barão de Alcaiazere. - Quinta de Alcaidaria Mor, 18 de agosto de 1908.
Quer dizer, o vinicultor está, como se costuma dizer, com a corda na garganta, precisa dinheiro, tem de vender vinho e como o commerciante sabe que elle precisa dinheiro, offerece a miseria de 180 réis por cada medida de 20 litros de vinho.
Se estivesse estabelecido o credito agricola com taxa inferior a 4 por cento, não acontecia isto, porque o individuo ia levantar pequenas quantias para, acudir á difficuldade de momento dando como garantia os seus productos.
Sr. Presidente: a questão precisa ser estudada com cuidado, porque é preciso conheceres dados do problema relativos á questão principal que nos occupa neste momento, que é o aumento dos direitos em Lourenço Marques.
Consta-me que o Governo já deu algumas providencias para remediar no todo ou em parte este inconveniente.
Ha casas exportadoras de vinhos para Lourenço Marques, e das mais importantes, que já receberam noticia dos seus correspondentes, dizendo-lhes que não enviassem mais vinho, emquanto não se resolvesse este assunto do aumento dos direitos.
Isto, Sr. Presidente, prova que a situação commercial dos nossos vinhos naquella colonia sul africana não é boa, sendo do toda a urgencia que se tomem providencias para que cesse tal estado de cousas.
As nossas provincias ultramarinas podiam servir de consumo a grande parte do nosso vinho, o que nos viria beneficiar na crise que atravessamos. Como nas minas do Transvaal se emprega grande numero de negros em trabalhos pesados e fatigantes, poder-se-hia ver se era possivel obter que dessem uma ração de vinho português aos nossos pretos.
Não sei se o Sr. Teixeira de Sousa está de acordo no que acabo de expor á Camara, nem sei mesmo se isto se poderia conseguir; mas distribuir vinho por cincoenta mil pretos, que é o que me dizem trabalham naquellas minas, já era importante, porque muito attenuaria a crise que nos assoberba.
Não me occuparei mais d'este assunto. Disse á Camara aquillo que entendia e tenho a certeza de que o Governo ha de tomar em consideração as minhas palavras.
Entendo que o Governo tem prestado um grande serviço nacional, administrando com grande economia e parcimonia, não offendendo as liberdades publicas e sabendo manter a ordem, o que tão indispensavel é para o bem estar de uma nação.
Sabem todos como este ultimo assunto é melindroso, e tanto que, quando se apresenta um Governo ao Parlamento, o partido que lhe é adverso declara que lhe fará opposição, excepto nas questões de ordem publica e nas internacionaes.
Tal é, Sr. Presidente, o conhecimento que todos teem da necessidade de se manter a ordem e estabelecer a tranquillidade publica.
Fora da ordem não pode ninguem viver, nem os amigos do Governo nem os que lhe são contrarios, quer se trate dos que applaudem ou combatem as instituições vigentes.
Eu quero que todos tenham liberdade, mas tambem quero que se respeitem as leis do país.
Antes de concluir, ainda quero dizer á Camara que na sessão de 7 de novembro de 1906, entre outras propostas que apresentei ao Parlamento, havia uma que tinha por fim estabelecer a régie da aguardente de vinho, e estou convencido de que esta providencia e outras que se lhe pudessem seguir resolveriam a crise vinicola, que tantos males está causando ao país.
Creio tambem que um illustre Deputado tenciona apresentar, nesta sessão ou em janeiro proximo, uma proposta nesse sentido, a qual deve trazer grandes beneficios.
Não me alongo em mais considerações e espero que o Governo ha de evitar que continue este estado de cousas em Lourenço Marques, concordando em que as difficuldades serão enormes se mantiverem a nova tributação lançada sobre os nossos vinhos.
Tenho dito.
O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Ferreira do Amaral): - Agradeço ao Digno Par Sr. Francisco José Machado as boas palavras com que honrou o Gverno.
Foi já expedido um telegramma para Lourenço Marques pedindo explicações sobre o assunto.
Para serenar os animos, devo dizer o que a este respeito o governador informou ha tempo.
(Leu).
O fim foi, pois, promover que tivesse maior venda o vinho com graduação inferior a 10 graus do que o de graduação superior.
Quanto ao vinho do Porto engarrafado, o imposto passou de 10 a 60 réis por garrafa.
(S. Exa. a não reviu).
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão sobre o projecto de lei que fixa a lista civil
O Sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia e fica inscrito para a primeira sessão o Digno Sr. Alpoim.
Tem a palavra o Digno Par Sr. Julio de Vilhena.
O Sr. Julio de Vilhena: - Antes de continuar a oração que hontem comecei a proferir, permitta-me V. Exa. que eu troque algumas explicações, que julgo necessarias, com o Sr. Ministro da Justiça.
Parece-me. Sr. Presidente, que o incidente que hontem occorreu, embora ligeiro, entre mim e o Sr. Ministro da Justiça, não ficou convenientemente liquidado.
Eu tinha dito que o projecto que se discute me fôra apresentado por S. Exa. nesta mesma Camara depois de approvado em Conselho de Ministros e que eu, passados poucos minutos, o restituirá a S. Exa.
Pareceu me ter ouvido da parte do Sr. Ministro da Justiça a declaração, não contestando a veracidade d'este facto, de que me não dera prazo para a restituição do projecto e que não se poderia considerar projecto antes de approvado em Conselho de Ministros. Foram estas as palavras que chegaram aos meus ouvidos, e se realmente fossem estas as palavras reproduzidas por alguns dos orgãos da imprensa, eu nada teria a acrescentar, porque acho absolutamente correcta e acceitavel, em harmonia com a verdade, a declaração do Sr. Ministro da Justiça. S. Exa. não contestou o facto que eu referi nesta Camara. S. Exa. não negou, nem podia negar, que eu só tivesse tido conhecimento do projecto por intermedio de S. Exa. e dentro d'esta casa, mas, Sr. Presidente, não é isto o que eu vejo referido em alguns jornaes.
Assim refere o Dia, e o mesmo repetem hoje alguns jornaes, que S. Exa. me respondera:
O que V. Exa. diz não é exacto. O projecto foi enviado a V. Exa. depois de ser approvado em Conselho de Ministros. Antes d'isso não era projecto do Governo. V. Exa. ficou com elle e ninguem lhe marcou prazo para o restituir.
Parecia que eu tinha faltado á verdade dos factos, parecia, se taes palavras fossem exactas, que o projecto me fôra enviado antes do dia em que eu disse que tivera conhecimento d'elle.
Eu sei que não foram estas as palavras de S. Exa., mas o que eu desejava era que o Sr. Ministro da Justiça, por uma declaração autentica, confirmasse as minhas palavras, se o que eu disse corresponde ou não á verdade