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20 Diário da Câmara dos Deputados

Tem a palavra o Sr. Ministro das Colónias, que ficou com ela reservada na última sessão.

O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Sr. Presidente: as considerações que ontem produzi foram tendentes a demonstrar à Câmara que numa mesma individualidade existem duas funções: a função de Alto Comissário e a fundão de governador geral; que tanto uma entidade como outra têm competências diversas; que foi no exercício da competência de governador geral que se praticou um determinado número de actos que constituíram o objecto da interpelação do Sr. Cunha Leal; que êsses actos foram, uns, praticados em Lisboa longe da fiscalização do Alto Comissário, que, logo que deles teve conhecimento, os censurou e tomou imediatas providências para que se não repetissem, e, outros, praticados na colónia; que os actos praticados em Angola estavam devidamente justificados em face das cabais informações prestadas pelo Sr. Norton de Matos...

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Não apoiado!

O Orador: — O Sr. Cunha Leal afirmou que o Alto Comissário, no exercício da sua função, usou de meios tirânicos e despóticos. Esta expressão não pede ser absolutamente tomada à letra, porque aquilo que pode ser considerado de tirânico e despótico numa cidade civilizada e policiada, pode não sê-lo num meio onde a civilização não tenha atingido um certo grau de desenvolvimento...

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Os actos tirânicos e despóticos do Sr. Alto Comissário foram praticados contra brancos e não contra pretos!

O Orador: — Ninguém ignora que fora dos grandes centros populares mais urbanos há pequenas localidades onde as rivalidades vão até o ponto de criar ódio mortal contra determinada pessoa.

E se isto se passa num meio europeu, num meio colonial êsse ódio atinge a maior acuidade, porque, apesar de meios pequenos, são compostos de pessoas com

uma ilustração e educação fora do vulgar.

Nesses pequenos meios coloniais, talvez por influência do clima, a perversidade dos indivíduos é tal que as lutas são verdadeiramente terríveis. Há mesmo pessoas que, por prazer, se entretém a atacar sistematicamente a acção dos governadores gerais; e se êstes não usarem de processos um tanto ou quanto violentos ficam desprestigiados não só perante os europeus que lá se encontrem que seria o menos mas perante os indígenas. Um governador representa a autoridade constituída, soberana, representa o país, e seria insuportável que os indígenas pensassem que o representante da soberania da Nação pudesse ser desrespeitado...

O Sr. Brito Camacho: — Principalmente quando as incitações partem da Metrópole, o que é a regra!...

O Orador: — O que seria para desejar é que as violências nunca se exercessem e que todo o cidadão, sempre que se visse esbulhado nos seus direitos e por qualquer forma calcada a lei, reclamasse pelos meios legítimos.

A dupla personalidade de Alto Comissário e governador geral não pode ser examinada só pelo aspecto que resulta de actos secundários da sua administração, mas observando-se em conjunto toda a sua, obra.

É necessário que a Câmara repare no seguinte: durante muito tempo pessoas que vinham de Loanda faziam encomiásticos elogios à obra do Alto Comissário, não só de viva voz, mas em conferências e nos jornais.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu (em àparte): — Por isso lhes pagavam principes-camente.

O Orador: — Entre as pessoas que mais elogiaram essa obra há muitas que são insuspeitas, como o Sr. Hipólito Raposo, correligionário do Sr. Cancela de Abreu.

Já vêm V. Exas. que não há fumo sem fogo. Se a obra do Alto Comissário fôsse insignificante essas pessoas não vinham para a metrópole dizer que em Angola se estava fazendo alguma cousa.