9 DE ABRIL DE 1957 1177
Se as causas a pleitear são das vindas a juízo facultativamente, como é o caso das acções com processo comum, os descritos inconvenientes não diminuem; e atinge-se então, com grande frequência, a situação paradoxal de obrigar as partes que submetem ao tribunal a resolução de um caso concreto, cujo valor é fixo e na maioria dos casos diminuto, a despenderem em viagens, comedorias e perdas sucessivas de salários muito maior valor do que o do litígio. Se se ponderar que o descrito modo de processar é forçosamente empregado não em alguns casos mas na enorme maioria deles, ter-se-á ideia da gravidade do problema.
Em presença destas realidades, pode afirmar-se afoitamente que o princípio de haver em cada distrito administrativo um tribunal do trabalho é muito discutível.
Para atender a necessidade social que estes órgãos de justiça se destinam a preencher não há remédio fácil. Pondo de parte a solução teórica de constituir um tribunal do trabalho ao lado do tribunal comum em cada comarca, o que significaria uma duplicação de órgãos, sem apoio nas necessidades do movimento da quase totalidade delas, pode aventar-se como solução mais simples a entrega dos processos da competência dos tribunais do trabalho aos tribunais comuns.
Não seria de encarar, contudo, uma simples confusão de jurisdições. Em matéria da competência dos tribunais do trabalho os tribunais comuns poderiam ser considerados tribunais do trabalho para todos os efeitos de administração de justiça.
Deste princípio derivariam importantes consequências, como a de neles se aplicarem as leis processuais próprias daqueles tribunais - tal o seu código de processo, que torna o andamento dos autos mais rápido do que o dos processos nos tribunais comuns, e a sua tabela de custas, que alivia em enormes proporções os encargos dos litigantes.
Admitida tal regra fundamental, haveria tribunais do trabalho privativos sòmente em Lisboa, no Porto e em todas as mais cidades onde o movimento dos processos da área da respectiva comarca o justificasse.
Não pode opor-se a esta ideia a objecção de que os magistrados dos tribunais comuns não são susceptíveis de se adaptar ao desempenho da missão de julgadores em processos de tipo laboral. Na verdade, a formação jurídica é uma só, embora possa afinar-se em certas especializações; e tanto a lei actual (Estatuto dos Tribunais do Trabalho, artigo 44.º) como a proposta em estudo (base VIII) permitem o recrutamento dos juizes dos tribunais do trabalho entre os juizes e agentes do Ministério Público da magistratura judicial. Por outro lado, e como ficou dito, a natureza dos processos movimentados nos tribunais do trabalho é na quase totalidade idêntica à dos pendentes nos tribunais comuns (n.º 8); e dá-se até a particularidade de em tribunais de província a maior parte do movimento ser de processos de execução e de transgressão, em cujos trâmites quase só se aplicam regras de processo comum, civil ou penal.
Se esta sugestão viesse a ser aceite pôr-se-ia fim ao paradoxo de as partes terem de recorrer a tribunais distantes para poderem dirimir questões de natureza laboral, as mais das vezes de valor insignificante, quando têm na sede da sua comarca um órgão competente para, salvo pequeníssimas excepções, resolver toda a espécie de controvérsias, seja qual for o valor delas.
A solução aventada tem ainda o mérito da flexibilidade. Com efeito, se o aumento de movimento dos tribunais do trabalho é uma realidade com tendência a acentuar-se, como se mostra do relatório da proposta em estudo (n.º 5), é certo que também aí se anuncia a remodelação das comissões corporativas, medida cujo efeito no movimento dos tribunais do trabalho será sensível, quer por ir causar descongestionamento em relação à situação presente, quer por dever evitar, de futuro, a instauração de novos processos de pequeno valor, mas numerosos (n.º 10).
Noutro sentido, e uma vez feita a remodelação destas comissões, poderia criar-se uma espécie de comissões de conciliação e arbitragem para os meios rurais, que teriam por missão dirimir, ainda que com recurso para os tribunais do trabalho, os pequenos litígios que aí surgem nas relações laborais, poupando às partes os incómodos e despesas de deslocação a tribunais muitas vezes longínquos e ao mesmo tempo aliviando estes de muitos processos de escasso significado económico, mas que, tais como os outros, exigem tempo e serviço para serem decididos.
Notando o melindre deste problema e chamando para ele a atenção que merece, reconhece também a Câmara que, afastando a solução vigente, é grande a dificuldade de o resolver. E como, por sua parte, não tem mais elementos para propor outra solução concreta, entende que, pelo menos, deve o Governo ficar autorizado a criar mais de um tribunal em cada distrito quando as necessidades sociais o exigirem.
Aceite o discutido princípio, não há alterações a fazer aos n.ºs l e 2 da base; e, para dar expressão ao pensamento da Câmara, deve fazer-se no n.º 4 um pequeno acrescentamento. O n.º 3, que reduz grandemente a competência dos tribunais de Angra do Heroísmo e da Horta, está em correlação com o n.º 4 da base IV; mas, em função da análise feita a este numero, deve ser remodelado.
17. Indica a base IV qual a composição dos tribunais do trabalho, e a opor aos seus três primeiros números só há que a referência ao tribunal colectivo está deslocada no n.º l e deve incorporar-se na base V.
Quanto ao n.º 4, a Câmara considera inconveniente a acumulação, aí prevista, das funções de juiz com as de delegado do Instituto Nacional do Trabalho. O espírito de umas e outras é profundamente diverso e, em certos casos, pode mesmo ser antagónico.
Enquanto o delegado procede segundo ordens e instruções e actua impondo e sugerindo, servindo-se dos meios administrativos ao seu dispor, o juiz, dotado de independência, arbitra os conflitos que lhe são submetidos apenas segundo a lei e a sua consciência. A confusão de funções só pode admitir-se - e aí sem nenhum inconveniente - em relação à fase instrutória dos processos.
Como remédio para a situação especial dos dois tribunais, há a entrega das funções de julgamento nos processos neles pendentes ao juiz do tribunal de Ponta Delgada, que às respectivas áreas terá de deslocar-se para exercer as suas funções.
Sobre o disposto no n.º 5 não há objecções a fazer; como, porém, se trata de um ponto de pormenor, parece a Câmara que ele deve ser versado, não na lei, mas no diploma que vier a completá-la.
18. Na base V determina-se como deve ser constituído o tribunal colectivo (n.º 1) e prescreve-se que ele não funcione sem a presença de, pelo menos, um juiz privativo (n.º 2).
A primeira determinação parece de simples fórmula, mas, ligada como está à segunda, peca por excessivamente ampla. Na verdade, não se dizendo naquela quem serão os vogais do tribunal colectivo e exigindo-se para o funcionamento deste a presença de um juiz privativo apenas, ficará na lei a margem que permitirá completar o tribunal colectivo com vogais não magistrados; e isto reputa-o a Câmara impróprio e inconveniente. Impróprio, por colocar na mesma posição