16 DE AGOSTO DE 1957 1315
pode descurar-se o seu carácter formativo, como meio específico de educação física, essencial à formação da juventude.
Nenhum destes aspectos do problema tem deixado de merecer ao Ministério da Educação Nacional, de há muitos anos a esta parte, a mais cuidada atenção e com eles se têm despendido volumosas verbas dos dinheiros públicos, nem sempre com o rendimento útil que desse dispêndio seria de esperar.
A prática da ginástica educativa encontra muito diminuto grau de simpatia entre os estudantes universitários. Há muitos anos já que os Centros Universitários da Mocidade Portuguesa, em Coimbra, Lisboa e Porto, sustentam - classes de ginástica, orientadas por técnicos competentes, de frequência absolutamente gratuita e aberta a todos os universitários. Algumas centenas de contos gastos nesta empresa têm resultado pouco menos que em pura perda, pois as referidas classes de ginástica são frequentadas por uma escassíssima minoria, que, por vezes, não chega 'a atingir sequer duas dezenas de estudantes. Os poucos que seguem esses cursos regularmente fazem-no, a maioria das vezes, por motivos de interesse pessoal: são alunos das Faculdades de Ciências, que pretendem candidatar-se às escolas militares e a quem a boa forma física interessa como condição de admissão a essas escolas. Frequentadores desinteressados poderão em cada ano contar-se pelas pontas dos dedos. Além da Mocidade Portuguesa, também a Direcção-Geral da Educação Física e Desportos se tem interessado pelo problema, e ainda no ano económico findo despendeu 28.800$ com os vencimentos de um professor de ginástica na Universidade de Coimbra (adstrito à Associação Académica respectiva) e quantia igual com um professor de ginástica na Universidade do Porto. Ignora-se se esta iniciativa colheu melhores resultados que a dos Centros Universitários.
Com frequência se ouvem protestos do grande público e dos próprios académicos contra o abandono a que a educação física se encontra votada nas escolas superiores e não raro se tem pretendido fazer disso verdadeira especulação política. Esquece-se que a esse respeito já bastante se fez, dentro de um regime de frequência facultativa das classes de ginástica: instituiu-se, por despacho ministerial, a obrigatoriedade de uma tarde livre no horário das escolas para os alunos poderem cuidar da sua educação física; contrataram-se professores competentes para ministrá-la; fez-se a necessária propaganda da iniciativa tomada; e os professores ficaram -quantas vezes !- em vão à espera de ver aparecer os que mais energicamente protestavam contra a falta de cursos adequados de educação física.
A menos que se queira ir para o sistema da ginástica obrigatória nas Universidades - solução que só poderia ser adoptada com particular cautela, a julgar pela quase nula simpatia que ela tem tido sob o signo do voluntariado-, não se vê maneira de resolverão problema muito melhor do que o tem sido até aqui.
Já mais fácil e talvez mais apropriada seria uma tentativa de gradual generalização da prática do desporto entre a juventude das escolas superiores. Essa forma de actividade física, como medida de particular alcance educativo, apareceria aí a completar as outras modalidades mais simples de educação física ministradas na escola primária e no liceu, como os jogos educativos, a ginástica, a iniciação desportiva e as formas desportivas elementares.
A formação física oferecer-se-ia, assim, à juventude em perfeito paralelismo com a formação intelectual, remetendo para o ensino superior a especialização, neste caso representada pelo desporto e tornada possível cela formação de base obtida nos graus inferiores do ensino.
E então, como preparação técnica e fisiológica indispensável à prática desportiva, já a ginástica teria um papel importante a desempenhar no ensino superior, sob a forma de ginástica desportiva.
O que esta representa no rendimento táctico e técnico dos vários desportos dá-lhe actualidade e interesse que a juventude sabe reconhecer e que desconhece ou não quer ver na simples ginástica educativa.
14. A contrastar com a indiferença do universitário pela prática da ginástica figura o seu interesse muito vivo pelo desporto de competição. Não vá daqui inferir-se, porém, que o estudante universitário português criou o hábito de praticar regradamente uma modalidade de desporto. A prática do atletismo e dos jogos de grupo interessa a uma pequena minoria - sem dúvida muito mais vultosa que a dos praticantes de ginástica, mas, apesar de tudo, pequena minoria; a grande massa limita-se a vibrar apaixonadamente com os torneios em que essa minoria participa.
Na medida em que este interesse teórico pelo desporto representa um sucedâneo de outras preocupações culturais, o facto é deveras para lamentar; mas, na medida em que representa apenas um derivativo de espírito, merecido recreio lúdico a preencher os intervalos de um sério e fecundo labor intelectual - e, graças a Deus, assim é num grande número de casos -, nada tem em si de censurável. E preferível que os estudantes encontrem nos espectáculos desportivos o seu divertimento favorito a irem buscar - derivativos na vida boémia e desregrada que os laudatores temporis actí com tanto saudosismo ainda costumam invocar. E, a ocuparem os seus ócios em - divertimentos lúdicos, preferível é que apoiem os seus grupos desportivos próprios a misturarem-se entre a massa anónima dos entusiastas dos grandes grupos desportivos profissionais.
Assim se explica que o Ministério da Educação Nacional sempre tenha olhado com igual carinho estes dois aspectos do problema desportivo universitário: o da participação efectiva dos estudantes nas práticas de desporto e o do espectáculo desportivo em si mesmo, como derivativo viril e sadio dos labores escolares. Trata-se, com efeito, de dois aspectos incindíveis, embora diferenciados, de um mesmo problema, que seria mal avisado pretender encarar por prismas diversos: nem a prática do desporto entusiasmará os estudantes se não for acompanhada da competição espectacular, nem o espectáculo desportivo terá para eles o valor lúdico que se pretende que tenha se não for acompanhado de ura mínimo de emoção que só a competição em equilíbrio de forças pode proporcionar.
15. Duas vias podem ser utilizadas - e há muito que efectivamente o são - no sentido de obter o melhor proveito educativo das práticas desportivas universitárias, no duplo aspecto acabado de indicar: o da participação dos grupos escolares em torneios e campeonatos de carácter regional ou nacional, em luta aberta com outros agrupamentos desportivos, e o da organização de torneios e campeonatos restritamente universitários, em que só participem, uns contra os outros, os agrupamentos desportivos das várias escolas superiores.
O primeiro sistema favorece o aspecto lúdico das práticas desportivas universitárias em detrimento do número dos seus efectivos participantes; o segundo sistema favorece este último aspecto em detrimento do primeiro. Pela participação dos grupos escolares em campeonatos regionais ou nacionais, ao lado dos melhores agrupamentos da respectiva modalidade de desporto, consegue-se, efectivamente, tirar todo o partido possível da faceta emotiva e espectacular que o encon-