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10 DE ABRIL DE 1959 613

respectivos corpos administrativos). Polémica acesa, em que entraram as armas do sentimento (quando não do ressentimento daqueles que não viram a cidade capital do seu distrito tornada capital da província ...), as da história e da erudição e, finalmente, as da geografia humana e suas ciências auxiliares. O sentimentalismo repartiu-se pelos dois campos. A história s a erudição apoiaram sobretudo os partidários do distrito, na medida em que revelaram que a província não tem no País tradições por aí além no campo da administração geral. A geografia humana e as ciências suas auxiliares estiveram especialmente do lado dos defensores da província, evidenciando - dizia-se - que a divisão provincial oferece, muito melhor que a divisão em distritos, satisfação às exigências, aspirações- e necessidades das populações, dada a pretendida concordância dessa divisão com as condições fisiográficas, sociais e económicas do País, entrando em linha de conta com as afinidades naturais, a indicações antropogeográficas, os interesses da produção e da troca, as relações tradicionais, a facilidade das comunicações, o valor económico das regiões, o interesse geral, em suma. É justo mencionar-se aqui o nome de um grande paladino da divisão provincial, que argumentou no plano da geografia humana: o Prof. Doutor Aristides de Amorim Girão (cf. especialmente A Divisão Provincial Ao Novo Código Administrativo, Coimbra, 1937, e Segunda Resposta, Coimbra, 1938).
Esta apologia da província, assim tão formalmente apoiada em dados científicos, não desanimou os adversários, que passaram a argumentar sobretudo com dados da experiência administrativa, sem desprezar razões de ordem diferente. Não tardou mesmo que organizassem o seu contra-ataque à divisão provincial, reunindo-se os que eram Deputados no apoio a um projecto de lei do Sr. Deputado Querubim do Vale Guimarães, amplamente fundamentado, que se pode ler no Diário das Sessões da Assembleia Nacional n.º 155, de 16 de Dezembro de 1937. Aí se procura demonstrar que o organismo administrativo provincial não corresponde a qualquer tradição do nosso país; que, pelo contrário, o distrito tem uma tradição que vem praticamente desde o início do liberalismo, havendo originado uma a rede de ligações de interesses morais e materiais, políticos, económicos e sociais de toda a natureza, com que se não deve romper»; que há perigo grave de ruína para as capitais de distrito que não sejam capitais de província; que a província está tão pouco solidamente inscrita no território e na alma nacional que nem o constitucionalismo nem o Partido Republicano (que continha a divisão provincial como um dos seus propósitos) lograram êxito neste particular, tais as resistências naturais e justificadas que encontraram; que, por último a experiência a que se tinha sujeitado já o Código Administrativo, quanto à nova divisão territorial, mostrara a sua ineficiência.
Não teve este projecto bom acolhimento na Câmara Corporativa, onde o «provincialismo» de base científica encontrou no então Procurador Mendes Correia intérprete esforçado (cf. parecer sobre o projecto de lei n.º 192, suplemento ao Diário das Sessões da Assembleia Nacional n.º 185, de 13 de Abril de 1958). Aí se argumenta em favor da província, em primeiro lugar com a história, pretendendo que a província corresponde, na nossa divisão territorial, a uma tradição mais remota e espontânea que o distrito. Sustenta-se em seguida que o fracasso cias tentativas para instituir, durante o constitucionalismo e a República parlamentar, uma divisão provincial resultou do predomínio que um regime de influências eleitorais concedia aos interesses particularistas de pessoas ou localidades sobre os interesses gerais do País e das verdadeiras regiões.
Em terceiro lugar, aduz-se que a divisão provincial não causa nem transtornos nem dificuldades graves ou que, pelo menos, não encontrem compensação suficiente nas vantagens gerais da reforma realizada. As províncias - diz-se ainda - oferecem vantagens nacionais e regionais sobre os distritos, pelo facto de serem em ' menor número e de corresponderem mais aproximadamente do que os distritos a uma divisão natural antropogeográfica e económica do território. A divisão provincial vigente assenta, de um modo geral, numa base científica séria e num estudo sereno e objectivo do interesse nacional e das conveniências locais e regionais. E rematava-se acentuando que não bastava pouco mais de um ano para se poder dar como realizada uma experiência concludente em favor do distrito e contra a província como autarquia administrativa.
O projecto de Querubim Guimarães recebeu aplausos generalizados, sobretudo das câmaras municipais e inclusivamente de uma junta de província - a do Alto Alentejo. Entretanto, porém, não pôde ser discutido nesse final de legislatura. E, como na legislatura seguinte a Assembleia Nacional não detinha poderes constituintes, o projecto não pôde ser renovado e entrou assim no olvido, mantendo-se inalterada até hoje a divisão provincial.
O período de experiência que vai decorrido desde 1937, em que se deu efectivação, pela entrada em vigor do Código Administrativo, ao pensamento constitucional quanto à instauração da nova autarquia, não provou francamente a favor dela.
Não se nega que as províncias instituídas com a Constituição e o novo Código Administrativo correspondam às grandes unidades regionais do território português continental; noutras palavras, não se nega que se tenha dado assim consagração legal à província-região, entendendo por região uma unidade de território definida por características geofísicas, geoumanas e geoeconómicas diferenciadas.
Simplesmente, estas regiões não possuem hoje, ao contrário do que se imaginou, interesses comuns, no plano económico, cultural e de assistência, que possam explicar a sua personalização e a consequente atribuição de uma orgânica adequada à prossecução de tais interesses em bases autonômicas. A região, em suma, não tem de ter, necessariamente, uma expressão administrativa, embora seja de facto uma realidade.
Os interesses económicos regionais (hoc sensu) não têm praticamente relevância no plano da administração comum descentralizada - e a prova está em que as juntas de província nunca exerceram, ou só exerceram muito discretamente, as suas atribuições e competência legais em matéria de fomento e coordenação económica.
Sem dados seguros e completos sobre o seu activo no domínio das suas finalidades culturais, presumimos que a sua actuação em tal sector foi, no geral, também muito modesta: não há, portanto, parece, verdadeiros interesses provinciais comuns, no sector cultural, pelo menos que tenham de ser geridos no plano da administração local autárquica.
Quanto, finalmente, às atribuições de assistência, a legislação posterior ao Código Administrativo pôs os respectivos problemas em planos tão diferentes e deu-lhes soluções tão afastadas da competência das juntas de província (no que não deixou, certamente, de se ter em conta a, em geral, deficiente e ineficaz acção destes órgãos da administração provincial nesse domínio) que não pode hoje pretender-se que a acção assistencial tenha unia base regional expressa em entes autárquicos deste tipo. Assim como não tem sentido, no plano da administração comum, um regionalismo económico e cultural, também deixou de o ter, se já o tivera, um regionalismo assistencial. A acção assistencial em que