680 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 54
Este regulamento, além de estar em grande parte desactualizado e a prática ter demonstrado que grande número das disposições não correspondem às necessidades, tem sofrido parcialmente tantas e tão variadas alterações que, a menos que seja o caçador perito em leis e cuidadoso anotador da legislação, dificilmente poderá estar a par de tudo quanto actualmente regula o exercício da caça.
Se mais não houvesse, parece-nos que isto seria razão bastante para que o Governo pensasse em coligir, num só decreto regulamentar, tudo quanto está disperso em decretos vários que alteram o Decreto regulamentar n.º 23 461.
Sucede, porém, que não é apenas essa ordenação que nos parece indispensável, mas sim e que de que uma vez se estabeleçam normas regulamentares absolutamente harmónicas, quer com os interesses dos caçadores, quer com os direitos dos proprietários, quer ainda como apropriadas para manter num justo nível a defesa da caça como uniu riqueza pública, dar eficiência, aos serviços encarregados da sua administração, criando condições de vida indispensáveis à manutenção de uma fiscalização eficiente e impondo sanções que obriguem ao respeito devido pela defesa de todos os interesses.
Dentro deste ponto de vista, parece-nos que o Regulamento da Caça deve obedecer a uma redacção tão clara quanto possível, assim como também que os diversos assuntos nele regulamentados sejam tratados harmonicamente dento de capítulos próprios.
Dada a complexidade do problema, dos interesses particulares em jogo, da necessidade premente de proteger a caça como riqueza pública, e verificada a conveniência de atender aos usos e costumes tradicionais da nossa cinegética, e considerando que, dentro desses usos e costumes, a caça, entre nós, interessa pessoas não só de todas as categorias sociais, como também das mais variadas possibilidade financeiras, as quais se devem respeitar, considerar num trabalho desta natureza e procurar atender, dentro do possível, diligenciou-se estudar o assunto deste regulamento num conjunto e em toda a sua amplitude, única forma que pareceu certa para se encontrarem as soluções mais próprias e harmónicas com tais finalidades.
Deste critério de trabalho resultaram as conclusões a que chegamos e que esperamos sejam também superiormente apreciadas, no seu conjunto e à luz das realidades que apontamos em justificação do nosso parecer.
Pareceu-nos que um trabalho desta natureza não podia ser apresentado sem ser convenientemente articulado, dada a necessidade compreensível de em certos pontos se ter de fazer referências a assuntos versados anteriormente e ainda para nos seus lugares próprios enquadrar determinações de legislação dispersa.
Nestes termos, temos a honra de apresentar o seguinte projecto de sugestão ao Governo:
Da caça, processos de caçar e lugares em que pode ser exercida
Artigo 1.º Caçar é o acto de apreender animais bravios e, para os efeitos do presente decreto, abrange a acção de os esperar, procurar, perseguir, apanhar ou matar e todos os demais actos que, praticados em locais frequentados por caça, possam servir de meios à realização daqueles fins.
§ 1.º A caça, com ou sem arma de fogo, só pode ser exercida pelos seguintes processos:
a) De "salto": isoladamente, em linha ou em grupo;
b) A "espera": na passagem, na dormida, na bebida ou comida e com ou sem o "negaça", nos casos taxativamente permitidos neste diploma;
c) De "batida": com "esperas" ou "portas", nos casos taxativamente permitidos por este diploma;
d) A "corricão": a pé ou a cavalo, só com auxílio do cães, com ou sem pau, mas sem arma de fogo;
e) De barco;
f) De altanaria ou falcoaria.
§ 2.º Para os efeitos deste diploma entende-se por caçada de "salto" aquela que é praticada por um ou mais caçadores que se deslocam para procurar, perseguir, apanhar ou matar a caça que eles próprios levantam, com ou sem ajuda de cães; por caça de "batida", aquela que é praticada quando o caçador se coloca à espera para apanhar ou matar a caça que lhe é levantada por batedores; por caça à "espera", quando o caçador, emboscado ou não, aguarda na sua passagem a caça a abater; por caça a "corricão", a exercida, apenas com a ajuda de cães; por caça de barco, a que é praticada utilizando este meio de transporte fluvial ou marítimo, e por caça de altanaria ou falcoaria, aquela que é praticada utilizando, como meio de capturar os animais bravios, o falcão ou qualquer ave de presa para tal fim adestrada.
Art. 2.º Respeitadas as disposições do presente decreto quanto às condições de tempo e modo de caçar, o exercício da caça é livre:
1.º Nos terrenos não cultivados ou de pousio e não murados onde o acto cinegético não estiver interdito por lei;
2.º Nos terrenos arborizados não compreendidos no n.º 7.º do artigo 4.º;
3.º No mar e nas áreas das circunscrições marítimas, de acordo com os respectivos regulamentos atinentes a proteger o movimento comercial e de navegação ou a frequência, de banhistas.
§ 1.º Nos terrenos abertos plantados de olival ou outras árvores frutíferas de grande porte podem também os proprietários ou aqueles a quem pertença a colheita dos frutos obstar ao exercício da caça, no intervalo que medeia entre o começo da maturação dos frutos e a sua colheita, se da modalidade de caçar aí empregada resultar prejuízo manifesto para os respectivos frutos.
§ 2.º Considerara-se terrenos murados, para os efeitos deste decreto, os que forem contíguos numa área até 300 m de raio à volta de casa habitada, se estiverem delimitados por qualquer espécie de vedação de altura mínima de l m em toda a sua extensão, e ainda os que, não sendo contíguos a casa habitada, sejam vedados por muros ou redes de malha metálica, de altura mínima de 1,50 m.
Art. 3.º Observadas as disposições a que se refere o corpo do artigo 2.º, o exercício da caça é ainda assim restrito:
1.º Nos terrenos e inatas que constituem perímetros florestais do Estado, aos caçadores munidos de licença especial passada pelos respectivos serviços florestais, a qual será válida para a área de todos os perímetros florestais;
2.º Nos terrenos particulares onde o direito de caçar esteja legalmente reservado, aos seus proprietários ou aos que deles obtiverem autorização;
3.º Nos terrenos murados, nos quintais, hortas, pomares, parques e jardins anexos a casa permanentemente habitada, quando delimitados por qualquer vedação que os separe dos prédios circunvizinhos, aos caçadores, seus proprietários ou arrendatários e àqueles a quem derem autorização;
4.º Em torno das casas habitadas, escolas e estabelecimentos científicos, a uma distância nunca inferior a 150 m o caçador, não poderá servir-se do arma de fogo para caçar sem autorização dos seus proprietários, arrendatários ou dirigentes.