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1046 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 95

Impõe-se admitir que o projecto é aprovado por aqueles, proprietários cujas reclamações foram atendidas e rejeitado pelos que não obtiveram satisfação para as suas.
Quanto aos que nada disseram è geralmente aceite a orientação de os considerar como favoráveis ao projecto de emparcelamento. Aplica-se aqui o velho aforismo: qui tacet assentit.
É certo que muitas vezes quem cala nem diz que sim nem diz que não. Mas, na hipótese em apreciação, é razoável concluir que consente quem se cala, pois o agricultor que, em face de um projecto de emparcelamento, pelo qual é directamente atingido, não reclama nem protesta, naturalmente o aceita, com maior ou menor entusiasmo, ou, pelo menos, não tem razões para o rejeitar. Pode pois, legitimamente, ser considerado, aderente (1).

40. Feitas as contas finais, apurou-se se o projecto foi ou não aprovado.
Mas qual a maioria de votantes necessária para haver aprovação?
Tem-se exigido em alguns países maiorias até dois terços dos proprietários interessados.
A tendência geral é, porém, para restringir tal maioria qualificada, admitindo-se que uma maioria numérica simples, que simultaneamente seja representativa da maioria do rendimento colectável ou de mais de metade da área dos prédios a emparcelar, é suficiente para determinar a realização do emparcelamento. E, na verdade, não só tal maioria se afigura satisfatória, como se impõe reconhecer que a sua existência pressupõe um interesse digno de prossecução, de que o Estado se não deve alhear.
E a este respeito não interessará fazer mais larga explanação, porquanto já no parecer da Câmara Corporativa emitido em 1952 se entendeu ser exagerada a maioria de dois terços exigida no Decreto n.º 5705, de 10 de Maio de 1919, como condição da realização do emparcelamento.
Aí ficou escrito: «a dupla maioria de dois terços do número dos proprietários e de dois terços da superfície dos prédios respectivos como condições da exequibilidade do emparcelamento é muito alta: dificulta grandemente a operação. Há que minorá-la, para que esta possa tornar-se realidade prática ...».
E, em plena conformidade com o pensamento informador destas palavras, consignou-se na base IX do articulado sugerido à Assembleia Nacional que «o projecto de recomposição elaborado pela Junta fica dependente de aprovação da maioria dos proprietários com a maioria de rendimento colectável».
Não tem a Câmara Corporativa razões para alterar o que então se considerou razoável.

41. Não obstante, porém, a expectativa que esteve na base do esforço considerável despendido na elaboração do projecto de emparcelamento, um conjunto de reacções imprevisíveis pode conduzir a maioria dos interessados, por razões julgadas improcedentes pelos organismos encarregados de apreciar as reclamações apresentadas, a rejeitar o projecto de emparcelamento.
Tendo em conta que o emparcelamento é planeado e executado em toda a Europa, tal com deve ser em Portugal, por razões de utilidade pública manifesta e que em nenhum país se justifica mais do que no nosso o recurso a processos expeditos, embora prudentes, de avançar na realização de uma obra que há muito se impõe, afigurou-se defensável a tuna parte da Câmara a concessão no Estado, quando reafirmada pela Administração a imperiosa necessidade económico-social da recomposição agrária, projectada, do poder de decretar o emparcelamento coercivo.
A decisão do Estado de impor o emparcelamento a uma maioria relutante em aceitá-lo poderia, na verdade, em certas hipóteses, apresentar-se como particularmente aconselhável.
Assim aconteceria, por exemplo, quando o estabelecimento de um indispensável sistema de irrigação ou drenagem em determinada zona só pudesse considerar-se economicamente viável após a realização de operações de emparcelamento susceptíveis de permitir um traçado de canais ou drenos tecnicamente racional; quando a maioria hostil ao emparcelamento fosse notoriamente escassa; quando a minoria favorável excedesse certos limites (fosse, por exemplo, superior a 25 por cento) e simultaneamente representasse a maior parte da área de terras afectadas pela operação ou do respectivo rendimento colectável; quando o pedido de emparcelamento tivesse sido inicialmente subscrito pela maioria legal dos proprietários interessados e estes, mais tarde, por razões julgadas improcedentes, acabassem por se pronunciar contra o projecto de emparcelamento, frustrando assim a formação da necessária maioria.

42. Apesar do mérito das razões expostas a Câmara Corporativa inclina-se no sentido de que não se afigura conveniente, por sérias razões de ordem político-social, impor o emparcelamento nos casos em que a maioria dos interessados o haja rejeitado.
Na verdade, se, apesar da promessa de melhoramentos fundiários e rurais a realizar, o esforço de propaganda e captação desenvolvido junto da população local se revelou, em última análise, improfícuo, isso significa que a hostilidade ao emparcelamento é tão viva que não poderá deixar de se considerar perigosa qualquer tentativa no sentido de impor a operação recusada.
De resto, é legítimo esperar que a modificação de algumas condições locais, conjugada com a evolução que inevitavelmente se processará no mundo circundante, acabará por determinar os proprietários de uma zona a aprovar amanhã, sem pressão dos Poderes Públicos, o projecto que agora rejeitaram, bastando para tanto que alguns exemplos felizes se lhes possam oferecer em abono do emparcelamento proposto.
A concessão ao Governo da faculdade de decretar o emparcelamento coercivo só seria admissível, de qualquer modo, em casos excepcionais, e pode considerar-se seguro que o Governo acabaria, em atenção a razões válidas, por não usar do seu poder de coacção, recorrendo antes a meios suasórios, com vista à modificação gradual do clima local desfavorável.
Assim, afigura-se inconveniente consagrar uma excepção de carácter um tanto odioso, susceptível só por si de envenenar a expectativa favorável com que naturalmente será recebida pelo País a legislação sobre emparcelamento.

43. Uma solução possível, partindo do princípio da inconveniência político-social de o Estado decretar o emparcelamento nas hipóteses em que a maioria dos interessados o rejeitasse, seria a de conceder à minoria vencida a faculdade de recorrer para o Governo do resultado da votação, com base em razões abonatórias da necessidade económico-social do emparcelamento.
Mas não só uma actuação desta natureza poderia determinar a eclosão de graves litígios entre grupos locais, susceptível de adulterar profundamente as relações de vizinhança e, de um modo geral, o clima social da respectiva comunidade rural, como poderia condu-

(1) Assim se entende na Holanda e na Suíça, pelo menos.