24 DE MAIO DE 1961 1387
jecto, base X) e dividem-se, quanto ao âmbito territorial, em nacionais, regionais ou locais (base VII).
As referidas actividades podem ser oficiais ou particulares, conforme a administração ou a manutenção esteja a cargo do Estado ou dos particulares (base VII).
O simples facto de receberem subsídios do Estado ou dos corpos administrativos não tira às instituições o carácter de particulares, e estas, quanto à natureza da sua constituição, podem revestir a forma de associações ou fundações (bases VIII e IX).
Ainda no que respeita as associações, «têm regime especial as Misericórdias, cuja tradicional essência católica e actividade multivalente devem ser mantidas sem prejuízo da actualização técnica e administrativa dos seus métodos de acção», ficando-lhes a «competir, na maior medida do possível, o primeiro lugar na actividade hospitalar e assistencial dos concelhos» (base IX).
Estas normas não se afastam das consignadas nas bases II, IV, V e XVII do Estatuto da Assistência Social, as quais reproduzem quase textualmente.
Entretanto, notam-se algumas diferenças:
Assim, no que respeita ao âmbito territorial, no Estatuto da Assistência Social só se distinguiram duas modalidades: local, se a esfera de actividade se limitava a determinada circunscrição ou agrupamento social; nacional, se abrangia todo o Pais.
O projecto, conservando a designação de nacionais para as actividades de saúde e assistência cuja acção se estende a todo o País e de locais para as que abrangem um só concelho, previu, ao lado delas, as actividades de saúde e assistência regionais, que englobam vários concelhos ou um ou mais distritos.
A existência de órgãos regionais justifica-se plenamente, tanto pelo facto de os problemas de saúde e assistência não serem, em regra, particulares a este ou àquele concelho, mas ainda porque só agrupando os concelhos ou distritos se pode, em alguns casos, assegurar mais eficazmente a coordenação dos serviços e a respectiva acção sanitária ou assistencial.
Não podendo cada concelho fazer face as suas necessidades nesta matéria, terá de ser abrangido, consoante os casos, por organismos ou actividades de carácter regional ou nacional, confirmando-se, deste modo, a orientação seguida na organização hospitalar, na assistência psiquiátrica e na luta contra a tuberculose. A experiência, própria e alheia, aconselha que se prossiga nessa orientação, devendo, porém, e quanto possível, fazer-se coincidir as áreas regionais para os diferentes sectores, e não estabelecendo áreas diferentes, conforme a actividade que deva abranger um ou mais concelhos.
F) Associações e fundações. As Misericórdias
8. No que respeita à natureza da sua constituição, o projecto, mantendo embora a divisão entre associações e fundações, absteve-se de as definir.
Entre as associações, o referido projecto distingue, como já o fizera o Estatuto da Assistência Social, as Misericórdias.
O espírito cristão e a universalidade da caridade, abrangendo a alma e o corpo, as obras de misericórdia, tanto espirituais como corporais, estão na essência da tradição das Misericórdias, fruto do ambiente religioso em que foram criadas.
A esse ambiente religioso, imbuído de caridade cristã, ficamos devendo as mais diversas instituições de carácter beneficente e profissional.
Destas ultimas escreveu Ricardo Jorge: «Cada arte, cada mister, à moda da Meia Idade, vivia fechada na sua bandeira e agremiada ainda em confrarias, sob a égide de um patrono santo; cada corporação de mesteres, vinculada pelo laço industrial e religioso, organizava-se bem cedo, outorgando-se regimentos ou estatutos e assegurando não só a solidariedade económica como o socorro mútuo e até a beneficência pública» (Origens e Desenvolvimento da População do Porto, p. 55).
Embora houvesse obrigações comuns quanto «à contribuição para o culto e veneração do padroeiro e à participação nas procissões públicas», a bandeira, como escreveu o Prof. Doutor Marcelo Caetano, «tinha sobretudo uma função de carácter cívico, como órgão de representação dos ofícios na vida política do Estado e na actividade administrativa local. Mas à margem dessa função cívica conservou carácter religioso».
Esse carácter religioso resulta nitidamente da leitura dos respectivos compromissos e do facto de as confrarias dos mesteres serem erectas em igrejas, capelas e mosteiros e sob a invocação do santo tomado como patrono da corporação.
Assim, no Porto, a Confraria de Santo António, dos tanoeiros, e a de S. José e de S. Brás, dos carpinteiros, foram erectas no Mosteiro de S. Francisco; a Confraria de Santo Elói, dos ourives, na Igreja de S. Nicolau; a Confraria de Santa Luzia, dos pedreiros, na Sé Catedral; a Confraria de Nossa Senhora de Agosto e de S. Bom Homem, na Capela de Nossa Senhora de Agosto (António Cruz, Os Mesteres do Porto, pp. XIX e XXIII).
Os compromissos das confrarias dos mesteres, ao lado das obrigações dos mestres, oficiais e aprendizes, de carácter profissional, consignavam disposições relativas ao concurso que uns e outros deviam dar para o culto, às missas a rezar pelos mestres da corporação que falecessem e ao socorro ou ajuda que devia ser-lhes prestada quando «doentes de moléstia grave».
Mas, não obstante o carácter multivalente destas confrarias, nenhuma delas desenvolveu, sob esse aspecto, actividade que se assemelhasse à das Misericórdias.
E o que resulta claramente do compromisso da Misericórdia de Lisboa, fundada pela rainha - D. Leonor, quando se encontrava investida nas funções de regente do Reino, e desde logo aberta às pessoas que «fossem de boa fama e sã consciência e honesta vida, tementes a Deus e guardadoras dos seus mandamentos», e pusessem o sobejo da sua fazenda ou do seu tempo ao serviço de todas as obras de misericórdia.
Assumindo a forma de confraria, «por ser essa a fórmula associativa corrente», independentemente da «sua natureza profissional, assistencial ou religiosa», como notou o Prof. Doutor Marcelo Caetano, imediatamente «teve a promovê-la e a incentivá-la o interesse da coroa, a qual, durante os anos seguintes, vai difundi-la pelo resto do País e enchê-la de privilégios destinados a facilitar o exercício da sua acção beneficente de modo a convertê-la no que hoje chamaríamos um serviço público». Na base dela continua aquele professor, «encontra-se uma verdadeira mobilização de caridade cristã». «Aos irmãos não se pede apenas uma quota, ou simples apoio nominal: exige-se que sejam eles próprios os agentes das obras de misericórdia, que pratiquem como virtudes individuais os fins sociais da confraria e que façam da actividade associativa (como hoje diríamos) um instrumento da sua própria edificação espiritual, um meio de salvação eterna». (Actas do IV congresso das Misericórdias, vol. III, p. 53).
De feição universalista quanto ao objectivo, a instituição espalhou-se como labareda de caridade por todo