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29 DE MARÇO DE 1978

Com inegável realismo, verifica-se nio ser, infeliz- mente, viável dar completo seguimento a esta direc- triz, «[. . .] mas que “a integração constitucional, tradu- gida ou explicitada em todas e cada uma das normas do texto da lei fundamental, significa de per si e visa signi- ficar, realmente, a unidade nacional, a todas as luzes. Na medida em que nos aproximamos deste ideal, servimos e proclamamos a unidade política da Nação. O limite nesta direcção será constituído apenas pelas realidades insupri- míveis. Os textos constitucionais assimilacionistas igno- raraui no passado este limite e quiseram forçar estas realidades '».

6. A simples enunciação das grandes linhas da evolu- ção e da história da administração ultramarina melhor de- marcará o sentido e o valor das directrizes apontadas.

Foi perante as realidades decorrentes da expansio ultra- marina que, de forma pragmática —os esquemas teó- ricos surgiriam com o liberalismo —, se foi ocorrendo às necessidades, sob a influência, embcra, dos conceitos en- tão dominantes. Em relação à administração central, cedo os interesses

ultramarinos justificaram q criação de organismos espe- cializados, e é assim que surge a Casa da Guiné, depois Casa da Guiné e Mina e Casa da Alina e Trautos da Guinê, e posteriormente a Casa da Índia, ligada à primeira, pois que a superintendência de ambas pertencia 20 mesmo fun- cionário, e em :1630 a Casa da Índia, Mina e Guiné.

Só em 1580, porém, foi criado o Secretário da Índia, que em 1571 geria os «negócios e cousas da Repartição da Índia, Mina, Guiné, Brasil e Ilhas», significativa- mente designada em 1584 como «repartição da Índia, Brasil, Mina e Guiné».

Após a dominação filipina com o efémero «Conselho da Índia», D. João IV cria em 1643 o Conselho Ultramarino, que é extinto em 1833, quando o liberalismo vitorioso impôs a sua visão assimiladora integral.

No entanto, o Conselho Ultramarino, como antigo órgão do Governo, de cujas consultas eram os Secretários de Estado simples intermediários junto do soberano, transfor- mara-se, no período pombalino, em mero colaborador subalterno da orientação governativa. Em 1736 seria criada a «Secretaria, de Estado da Mari-

nha e Domínios Ultramarinos» *. Verifica-se, assim, que, neste período, cedo surgiu a

necessidade de um órgão metropolitano especializado para se ocupar dos assuntos ultramarinos e que, se num pri- meiro período não havia diferenciação quanto aos minis- tros, num outro passou a haver um secretário de Estado com competência especial para o ultramar.

Como, porém, era sempre o soberano quem despachava todos os assuntos, daí resultava equilibrada integração governamental e a harmonização de interesses e soluções.

Cada território tinha organização própria, adaptada às suas condições, mas em relação a todos eles verificava-se larguíssima desconcentração de poderes com contrapartida na força da soberania real que, aliás, além de fixar orien- tações, exercia efectiva fiscalização.

7. O Kberalismo, na sua visão assimiladora, veio & im- por, pela primeira vez, as suas preocupações uniformiza- doras com g Lei de 8 de Novembro de 1821, com a qual se estabeleceu que a Secretaria de Estado da Marinha não se ocupasse dos negócios ultramarinos, que passariam

8 Cf. sobre a matéria deste número, Marcelo Cnetano, O Con- selho Ultramarino, Lisboa, 1907, e Direito Público Colonial Por- tuguês, eegundo as lições coligidas por Mário Neves.

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a ser tratados pelas «mesmas repartições por onde se expe- dem os negócios de Portugal e Algarves».

A Lei de 3 de Novembro de 1823, reconhecendo os gra- ves inconveiientes de tal solução, revogou a Lei de 1821; porém, a partir de 1882, regressou-se à política assimila- cionista.

O sistema administrativo francês, que fona introduzido em Portugal, é aplicado ao ultramar, substituindo-se os govermadores por prefeitos — Decreto m.º 23 de 16 de Maio de 1892 —, extinguindo-se o Conselho Ultramarino — Decreto de 30 de Agosto de 1883— e distribuindo-se os negócios ultramarinos pelos diversos ministérios — De- creto de 28 de Julho de 1884.

E em conformidade com tal politica assimilacionista que passam a considerar-se os territórios ultramarinos como simples províncias do reino — províncias ultrama- tinas.

Por duas leis de 25 de Abril de 1835 restauram-se os cargos de governador, cria-se uma Secretaria de Estado do Ultramar (depois anexada à da Marinha pelo Decreto de 7 de Dezembro de 1836), e publica-se a primeira Carta Orgânica da Administração Ultramarina.

No entanto, o Código Administrativo de 1842, elabo- rado para a metrópole, foi logo mandado aplicar ao ultra- mar, sem adaptações. Em 1851 é restaurado o Conselho Ultramarino, trans-

formado em 1859 numa Junta Consultiva do Ultramar. Dentro da orientação assimiladora, foi aprovada pelo De- creto de 1 de Dezembro de 1869 — era Ministro Rebelo da Silva — uma nova carta orgânica ”.

8. A partir de 1890, com Amtónio Emnes, que fez escola, e Mouzinho de Albuquerque, o grande princípio que in- forma a administração ultramarina passa a ser o da des- centralização administrativa e da especialidade das leis. António Enes, no seu relatório de 7 de Setembro de

1893, apresentado ao Governo, depois de dizer que «em Moçambique é que se há-de governar Moçambique» e de afirmar que «os governadores-gerais mal podem mover-se dentro da lei, mas permitem-se-lhe, com absoluta irres- ponsabilidade, todos os saltos e eorrerias fora da legali- dade», conclui que «o exagero da centralização legal corri- gese por um outro exagero, o da descentralização de confiança».

«Em princípio», continua António Enes, «é o Ter- reiro do Paço quem govema todo o mundo português, mas como o Terreiro do Paço não pode mem com o mero expe- diente ide tanta glória, abdica, arbitráriamente no arbítrio das autoridades provinciais. Esta abdicação é inevitável, e, não podendo a legislação evitá-la, tem de regularizá-la.»

E finaliza: «Desejo, em suma, que a província possa ser governada, administrada na província, segundo nor- mas inflexíveis e estabelecidas e fiscalizadas pela metró- ole.»

e Por outro lado, adentro da província, entende não haver inconveniente na unidade provincial, desde que os distri- tos tenham mais autonomia, mais faculdades e recursos de vida própria.

9. Com a República é precisamente essa orientação descentralizadora e de especialidade das leis que se con- sagra no artigo 67.º da Constituição de 1911, onde se esta- belece que: «Na administração das províncias ultramarinas

* Cf. Marcelo Caetano, obras citadas e o relatório da pro- pcsta de lei de revisão da Lei n,º 2066, de 27 de Julho de 1963 (Lei Orgânica do Ultramar), in Nova Legislação Ultramarina, val. s1, pp. 23 e eegs.