1742 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 130
A tradição porém, nunca foi um elemento [...] constitui apenas um elemento estabilizador. E se a nação representa, de facto - como objectivamente sucede entre nós, após oito séculos de história - uma realidade colectiva profundamente arreigada na consciência dos portugueses, mal se compreende que dela descreia quem nela funda o pensamento político. Dificilmente se pode apontar com seriedade: o risco de Portugal se [...] na Europa, ou na Ibérica ou na Comunidade Atlântica pelo facto de se estabelecerem certos tipos de colaboração, com outros povos, quando nem nos países mais recentes e menos unitários (como, objectivamente, é o caso da Bélgica) a integração europeia, no escalão mais elevado, originou perigos de tomo para a realidade nacional. Se eles existem nesses países, já existiam antes do Mercado Comum. E a nação, traduzindo-se numa estrutura transtemporal, constitui, bem vistas as coisas, a força que traça os limites de qualquer associação ou integração: diz-nos quando não deve ir-se mais longe e, se porventura se teima em fazê-lo, faz fracassar a tentativa de ignorar o seu poder.
As províncias ultramarinas portuguesas são parcelas de um país real, por herança do passado, por vocação histórica, por vontade colectiva - consciente e livre - de permanecer assim. Associarem-se aos espaços com os quais tenham afinidades geográficas aumentar-lhes-á prosperidade possível, sem lhes diminuir a coesão: se tal acontecesse, seria em outros aspectos que deveríamos ir buscar os motivos de enfraquecimento da decisão da grei. Ou então, na prática, estaríamos descrentes de que «ser português» é ter uma atitude perante os problemas e não é simplesmente um facto...
Com oitocentos anos na Europa e vários séculos na África ou na Ásia. Portugal não deve sentir-se em causa, em que qualquer aspecto essencial por efeito de simples acordos visando melhorias na realização do bem comum. Pensar o contrário significa ter dúvidas sobre a solidez da nação e da sócio-cultura que lhe é peculiar, desde a diferenciação cultural, na pré-história, da orla atlântica da meseta relativamente ao resto do território ibérico. E esquecer as ligações dos tempos passados e dos actuais achar que qualquer coisa pode pôr em risco a nação, tão frágil afinal ela é. E para mais, de que se trata, em concreta? O tratado de Roma prevê três formas de ligação à CEE: pela adesão, um país europeu (pois só estes podem aderir) passa a fazer parte da Comunidade, com estatuto igual ao dos restantes membros; pela associação, fica em situação intermédia, variável conforme as circunstancias do caso: pelo acordo comercial, o entendimento restringe-se à troca de mercadorias e, em especial de produtos industrial. Embora com abertura quanto às outras (como veremos). Portugal e a CEE escolheram-se esta última modalidade, tal como, por exemplo, Israel, a Líbia, o Irão e a Argentina. Haverá ainda quem possa ver nela um risco para a integridade do País?
Pôr o problema em [...] de uma opção entre a Europa e o ultramar seria sempre um «equivoco susceptíveis de criar um falso dilema» como disse o Sr. Presidente do Conselho na alocução de 14 de Novembro último: nem se compreende a razão de aquela excluir este último, nem algo foi estabelecido ou solicitado nesse sentido em virtude das negociações com o Mercado Comum.
Os entendimentos com a Comunidade Económica Europeia ou com outra qualquer região organização ou integrada são vantajosas para o País como um todo, embora, em cada concreto, só alguma ou algumas das suas parcelas sejam beneficiadas. Angola dificilmente poderá desenvolver-se no melhor sentido se ignorar o Brasil e a América do Sul: e Moçambique está virado ao Oriente, com todas as consequências patentes a quem vista a província, sem que por esse facto o seu portuguesismo fique a ser menor. (Aliás e apesar dos riscos que também podem ter alguém pensou alguma vez em interromper os laços económicos e emigratórios que - com vantagem recíproca - ligam Moçambique à África do Sul? Em casos destes, ter em conta esses riscos é por si só suficiente para os anular)
E por último, negociar um entendimento com uma comunidade - repete-se - nem leva a desconhecer, nem impele a integração em linhas múltiplas atrás referida, inevitável em países como o nosso (ou como a Inglaterra), onde convergem e divergem as consequências de vários pólos de atracção política ou económica. Porém, as conciliações desta índole são linguagem comum em qualquer política de integração: e nem sempre se pode chegar, logo de início a um equilíbrio definitivo: a «Europa dos Nove» estava para ser «dos Dez»...
Todos os países têm dificuldades específicas de ajustamento aos movimentos supranacionais. O caso português não é início: apenas o vivemos mais directamente, como é natural. Contudo, bem será não esquecer a sabedoria do provérbio recomendado que se forme o comboio... na estação ou o mais perto possível dela. Depois, vai com velocidade demais.
7. E em termos puramente económicos convir-nos-á ligar a metrópole portuguesa ao Mercado Comum? - Vejamos rapidamente como a situação se podia equacionar em 1970, isto é, a data em que decidimos renovar o nosso pedido de ligação.
É sempre complicado escolher o critério para raciocinar num plano assim complexo: uma visão totalmente globalizada dos fenómenos económicos é dificilmente atingível, e nunca o pode ser por uma só via; e a óptica do desenvolvimento, aspecto essencial para um país como o nosso, está em condições semelhantes. Por isso, e pela vantagem de optar por um critério de fácil apreciação, proferiu-se - dada a natureza dos acordos - optar pelo exame das condições do País ao prisma das trocas comerciais e, mais directamente, da evolução factual ou previsível das nossas exportações, sem que se pense, como é óbvio, que este aspecto, por si só, seria bastante para nele se fundar uma decisão de tão grande [...].
Todavia, directa ou indirectamente a economia da metrópole depende em muito do nível das exportações.
Na verdade, a pequenez do mercado interno (menos de 25 por cento do da Suíça, mesmo incluindo as vendas para o ultramar) é um dado de facto confirmado pelo exemplo estrangeiro: com maior consumo próprio do que nós, a Suécia e a Dinamarca recebem dessa origem 20 por cento do produto nacional, contra 40 por cento da Bélgica ou nos Países Baixos. E a percentagem total portuguesa, em 1968, foi dado de 25,3 por cento abrangendo mercadorias e serviços, contra 21,9 por cento em 1958. É isto ainda mais patente quando se olha o aumento do desnível da balança comercial metropolitana: em 1969, o déficit foi superior a 12 milhões de contos (mais do dobro do que havia sido dez anos antes), apesar de, entretanto, as exportações terem aumentado por forma bastante sensível e satisfatória. Ora não será prudente contar indefinidamente com o turismo, as remessas dos emigrantes e as entradas de capitais. Uma grande necessidade do País é portanto exportar, até por não ser fácil manter um surto de industrialização apenas para substituir as importações: numa produção reduzida, o custo é sempre elevado.